Alberto Torres: Um Intelectual Orgânico

Rodrigo Andrade Augusto

 

 

Rodrigo Andrade Augusto é graduando em História pela Universidade Federal Fluminense com interesse em História Contemporânea, História Social e História da Argentina

 

Alberto Torres: Um Intelectual Orgânico

Rodrigo Andrade Augusto

 

Resumo

O presente artigo teórico tem como objetivo analisar a relevância da intelectualidade exercida pelo político Alberto Torres, relacionando-a com a perspectiva do conceito de intelectual orgânico, desenvolvido por Antônio Gramsci. Tal perspectiva é relevante para se pensar a história do nosso país a partir de uma reflexão sobre um intelectual brasileiro que produziu conhecimentos e interpretações sobre a construção ideológica, social e política do Brasil. Mobilizadas a partir da categoria de Bloco Histórico, as discussões promovidas sobre o intelectual Alberto Torres são resultado da metodologia de análise documental em torno d a obra A Organização Nacional de Alberto Torres, bem como da análise bibliográfica de autores que dialogam com o tema proposto.
Palavras-Chave: Intelectual Orgânico; Alberto Torres; Bloco Histórico.

Abstract
This theoretical article aims to analyze the relevance of the intellectuality exercised by the politician Alberto Torres, relating it to the perspective of the concept of organic intellectual, developed by Antônio Gramsci. Such perspective is relevant to think about the history of our country from a reflection on a Brazilian intellectual who produced knowledge and interpretations about the ideological, social and political construction of Brazil. Mobilized from the category of Historic Block, the discussions promoted about the intellectual Alberto Torres are the result of the methodology of document analysis around “The National Organization”, by Alberto Torres, as well as the bibliographic analysis of authors who dialogue with the proposed theme.

Keywords: Organic Intellectual; Alberto Torres; Historic Block.

Introdução

À memória de minha bisavó materna,
D. MARIA JOAQUINA DA COSTA CORDEIRO,
tipo da energia, da virtude e da coragem da matrona brasileira, falecida aos noventa e cinco anos, após uma existência de contínuos trabalhos, só abandonados nos últimos dias da vida.
E à memória dos escravos mortos,
bem como aos ainda vivos de sua fazenda,
que me deram, no convívio íntimo da infância, lições de bondade e de pureza de costumes e exemplos de amor ao trabalho e de veneração,
dedico este apelo aos meus patrícios, em prol da reorganização da nossa vida política e social, sob inspiração das nossas tradições de honra e de bom senso, e com os progressos sólidos e humanos próprios da nossa índole.
Alberto Torres.

A dedicatória presente em seu livro A Organização Nacional demonstra o posicionamento de Alberto de Seixas Martins Torres (1865–1917) diante da realidade brasileira entre o fim do século XIX e o início do século XX. Alberto Torres atuou na política e defendeu os ideais republicanos e abolicionistas, tendo sido deputado da Assembleia Constituinte do Estado do Rio de Janeiro (1892), deputado federal, ministro da Justiça e Negócios Interiores, presidente do Estado do Rio de Janeiro e ministro do Supremo Tribunal Federal. Dedicou-se também à intelectualidade, produzindo artigos publicados em jornais como Diário de Notícias e Jornal do Comércio . Segundo seu admirador e seguidor Cândido Motta Filho:
Alberto Torres exerceu a política, discretamente, mediocremente. Foi presidente do Estado do Rio de Janeiro, foi parlamentar, ministro de Estado, conspirador da revolução republicana; mas, em todas as funções políticas em que esteve, não deixou um traço que o distinguisse da mediania dos políticos brasileiros. No governo do Estado escreveu magníficas mensagens; isto quer dizer que ele só se destacou na política, quando pode apresentar-se como pensador

Considerando a citação acima, este artigo tem como objetivo discutir a intelectualidade de Alberto Torres; nesse sentido, é relevante compreender suas ideologias e motivações políticas.
Filho do magistrado e político Manuel Martins Torres, formou-se em direito em 1885, atuando como advogado e jornalista no Rio de Janeiro. Apesar de ser republicano, Alberto Torres não poupou críticas a essa forma de governo, conforme aponta Edison Bariani (2005)
Assim como grande parte de sua geração, Alberto Torres – embora republicano – manifestava profunda decepção com a República, o modo como foi proclamada por meio de uma quartelada e como se constituiu, mantendo as vicissitudes do Império: ainda grassava o personalismo, o privatismo, o clientelismo e faltava racionalidade político-administrativa na condução dos negócios públicos. (Bariani, 2005, p. 2)

Desse modo, Alberto Torres buscou, nas palavras de Sirinelli (1996), inscrever “sua ação no tempo curto do debate cívico” através de suas contribuições e reflexões sobre os rumos da política brasileira. Seguindo a perspectiva do historiador Jean-François Sirinelli, Alberto Torres pode ser considerado um intelectual que teve como base uma noção sociocultural e de engajamento:
No primeiro caso, estão abrangidos tanto o jornalista como o escritor, o professor secundário como o erudito. […] Também podem ser reunidos em torno de uma segunda definição, mais estreita e baseada na noção de engajamento na vida da cidade como ator – mas segundo modalidades específicas, como por exemplo a assinatura de manifestos –, testemunha ou consciência. Uma tal acepção não é, no fundo, autônoma da anterior, já que são dois elementos de natureza sociocultural, sua notoriedade eventual ou sua “especialização” reconhecida pela sociedade em que ele vive – especialização esta que legitima e mesmo privilegia sua intervenção no debate da cidade – que o intelectual põe a serviço da causa que defende. (Sirinelli, 1996, p. 243)

A citação acima pode ser comprovada a partir de sua trajetória pessoal e profissional através do uso de sua posição política e social para defender o nacionalismo numa clara oposição ao imperialismo dos países colonizadores. Além disso, em sua concepção sobre a raça, Alberto Torres “afasta peremptoriamente qualquer possibilidade de desigualdade (e conseqüente hierarquização) biológica entre os seres humanos” (Bariani, 2005, p. 4). O intelectual afirmava que a ideia de uma superioridade racial “seria produto da invenção da ciência imperialista” (Bariani, 2005, p. 4). Sendo assim, apesar de associar a definição de intelectual conforme as ideias de Jean-François Sirinelli, neste artigo é defendida a hipótese de que Alberto Torres foi um intelectual orgânico, de acordo com Antônio Gramsci, pois ao mesmo tempo em que ocupava uma posição privilegiada na sociedade brasileira, o político e intelectual denunciava os problemas e inconsistências da formação da nação brasileira.
Em O Problema Nacional Brasileiro, Alberto Torres afirma que a questão central do país seria a falta de ordenamento adequado no sentido da condução dos seus reais problemas, o que demandaria urgentemente a organização nacional. Segundo ele, este seria à época um país sem história, sem sociedade, sem povo, sem raça, sem nacionalidade, sem caráter, sem economia nacional, sem cultura, sem opinião, sem direção mental, sem política nacional, enfim, sem organização. A definição é negativa, o país é definido pelo que lhe falta, não pelo possui. (Bariani, 2005, p. 4-5)

A respeito das elites políticas que fazia parte, Alberto Torres as definiu como “uma “classe artificial”, produto do divórcio entre sociedade e política, do alheamento da política (e seus executores) em relação à vida social e a seus problemas” (Bariani, 2005, p. 8). Tais críticas demonstram que, apesar de fazer parte de uma elite política, Torres rompeu com a tradição elitizada ao não compactuar com o pensamento hegemônico que as beneficiava, afinal:
Incomodava particularmente ao autor a inorganicidade da sociedade brasileira, a qual teria sido propiciada pela sua conformação de improviso, transplantação de instituições e excessos do liberalismo, situação esta que se expressaria na fragilidade do Estado, na ausência de sociedade e povo, de solidariedade, estruturação sócio-econômica e sentimento coletivo e patriótico, que viabilizariam a existência plena da Nação. (Bariani, 2005, p. 3)

Com base nos conceitos esmiuçados , utiliza-se, neste artigo, os conceitos de bloco histórico e a concepção de intelectual orgânico de Gramsci a fim de contextualizar a trajetória intelectual e profissional de Alberto Torres, assunto que será desenvolvido no item a seguir.

Alberto Torres sob a perspectiva de Gramsci

O marxista italiano Antônio Gramsci (1891–1937) desenvolveu um conceito central para analisar a práxis política que embasa seu pensamento: o conceito de bloco histórico, que pode ser definido como uma situação histórica concreta que se constitui a partir de uma relação dialética entre a estrutura social e a superestrutura ideológica e política. Conforme aponta Waldemar Filho (1977), “a vinculação orgânica entre esses dois elementos produz certos grupos sociais cuja função é operar, não no nível econômico, mas na superestrutura: os intelectuais.” (FILHO, 1977, p. 62). Ainda segundo o autor,
[…] é no quadro da análise do bloco histórico que Gramsci estuda como se quebra a hegemonia da classe dirigente, se constrói um novo sistema hegemônico e se cria um novo bloco histórico. É neste último aspecto que está mais ligada a ação política. As superestruturas do bloco histórico formam uma totalidade complexa em cujo seio o autor distingue duas esferas essenciais: a sociedade civil ou direção cultural e moral da sociedade, por uma parte, e a sociedade política ou aparato do Estado e suas relações recíprocas, por outra. O conceito de sociedade civil faz-se importante na medida em que define a direção intelectual e moral de um sistema social. (Filho, 1977, p. 62)

Nascido no ano de 1865, Alberto Torres vivenciou a crise do império, a abolição da escravidão e a Proclamação da República, fatos históricos que representaram uma mudança na estrutura social, econômica e, sobretudo, política na sociedade brasileira. Dessa forma, a estrutura histórica vigente durante a vida de Alberto Torres foi marcada pela intensa disputa das ideologias monarquistas, de um lado, e positivistas, do outro, dentre as quais Torres fazia parte do segundo grupo, ao lado dos “vencedores”. No entanto, a implementação da República representou apenas o início dos desafios de se criar uma nação de acordo com novos valores de ordem e progresso que deveriam ser difundidos através da superestrutura, ou seja, da ideologia dominante, elaborada em benefício das elites oligárquicas que ocupavam o poder.
O processo de construção institucional apregoado por Alberto Torres partia da constatação da ausência de formas duradouras na sociedade brasileira, daí também a possibilidade de sua moldagem. Se lamenta o desarranjo da estrutura, estimula-o a falta de uma tradição edificada, permitindo assim a terraplanagem para construção de instituições duráveis e funcionalmente adequadas ao progresso político e material. […] O Brasil como país colonizado, sociedade “improvisada”, teria transplantadas para seu ambiente instituições dos países dominantes, tais transposições seriam funestas, pois estariam em desconexão com a realidade e as necessidades do país. “Governos coloniais e colonizadores fazem invasões e conquistas: não fundam nações; são exploradores: não são sócios” (TORRES, 1982b: 42). (BARIANI, 2005, p. 5-6)

Alberto Torres defendia que somente o Estado enquanto um aparelho político-administrativo poderia promover a transformação e o progresso do país. Desse modo:
Surge então o Estado como criador, construtor da Nação, ao dar partida e coordenação à organização do país. Soberano em sua autoridade política – já que para Torres esta se criaria a si mesma, legitimar-se-ia pela sua própria investidura -, o tal Estado seria intérprete da soma das vontades dominantes, expressando assim a vontade geral extraída da mentalidade coletiva. Ainda assim, não desconsideraria – segundo o autor – os indivíduos: ao organizar a sociedade, o Estado daria condições a esta de produzir indivíduos “úteis” ao país, o que contribuiria para a viabilização das tarefas de organização. “Estado e sociedade hão de organizar-se, reciprocamente, por um processo mútuo de formação e de educação” (TORRES, 1982b: 37). Procurava reconciliar, desta forma, sociedade e política. (BARIANI, 2005, p. 8)

Ao ter consciência sobre os dilemas da sociedade brasileira e apresentar análises que possibilitariam a reflexão sobre a necessidade de uma “força organizada” compromissada com o interesse público e saberes racionais e práticos, Alberto Torres apropriou-se de seus conhecimentos como instrumento mobilizador em prol da sociedade brasileira. Contudo,
Alberto Torres desencantou-se da política como exercício. Passara rudes momentos na sua clausura do Palácio Rio Negro, em Petrópolis, sofrera indignações, traições, nada acordante com o seu cristalino pensamento político. Lavava a alma em artigos na imprensa, sempre doutrinários de seu pensamento sócio-político, agora mais deitado à especulação sociológica para uma compreensão melhor do caráter do povo brasileiro que se transfigura quando no exercício da política de resultados.

A partir da interpretação da citação acima, fica evidente a forte influência da intelectualidade na vida de Alberto Torres, podendo ser definido como um intelectual orgânico. Seguindo a categoria conceitual de Gramsci,
[…] consideraremos intelectual aquele indivíduo que desempenha a função social de categoria profissional dos intelectuais; ou seja, o indivíduo que participa de uma concepção do mundo, possui uma linha consciente de conduta moral e contribui assim para manter ou para modificar uma concepção do mundo, isto é, para promover novas maneiras de pensar. (Filho, 1977, p. 63)

Quanto à definição de intelectualidade orgânica, podemos classificá-la como intelectuais “dotados de características peculiares e especializações ligadas às necessidades da classe fundamental.” (FILHO, 1977, p. 63) Assim, ao ocupar cargos políticos e divulgar sua visão de mundo por meio de livros e artigos publicados, Alberto Torres buscou elaborar análises e interpretações que dessem conta de responder e legitimar suas ideologias por meio de sua experiência na vida política e pública. No entanto, Torres não deixou de fazer críticas à intelectualidade brasileira, afirmando que:
A inteligência brasileira, em sua grande maioria, estaria – para Torres (1982b: 91) – mergulhada nos males do intelectualismo, nas formas eruditas e ornamentais da cultura, que esgrimiria somente como armas de combate pessoal ou para manter-se no terreno das fórmulas vagas (e seguras) e das teorias abstratas. Desaparelhada para exercer um pensamento prático, descompromissada com a coisa pública e sem ambições para exercer influência mental e dirigir as condutas, a inteligência brasileira primaria pelo discursivismo, ineficácia, diletantismo, superficialidade, dialética, floreios de linguagem, uso de conceitos consagrados pela notoriedade ou prestígio da autoridade (TORRES, 1982b: 15); (BARIANI, 2005, p. 7)

Para Gramsci (1982), os intelectuais orgânicos no bloco histórico se opõem aos intelectuais do antigo bloco histórico, assim, Alberto Torres buscou promover uma ruptura com um pensamento hegemônico que permanecia desconectado com a realidade brasileira mesmo após a Proclamação da República. Portanto, é relevante considerar que as críticas promovidas por Alberto Torres sobre as elites políticas e a intelectualidade no Brasil foram construídas dentro de sua própria experiência enquanto alguém pertencente a um grupo social que, através da validação hegemônica, contribuiu para a criação e ação de novos meios de se pensar e projetar a nação republicana.
Ainda segundo Gramsci:
Cada grupo social, nascendo no terreno originário de uma função essencial no mundo da produção econômica, cria para si ao mesmo tempo, de um modo orgânico, uma ou mais camadas de intelectuais que lhe dão homogeneidade e consciência da própria função não apenas no campo econômico, mas também no social e no político. (Gramsci, 1982, p. 3)

Nesse sentido, as principais obras de Alberto Torres, a saber A organização nacional e O problema nacional, são exemplos de produtos do conhecimento que buscaram responder aos problemas de seu próprio tempo histórico, cuja estrutura e superestrutura foram forjados de acordo com os valores nacionalistas em busca de uma nova concepção de ordem e progresso para o Brasil.

Referências bibliográficas

BARIANI, Edison. O ESTADO DEMIURGO: ALBERTO TORRES E A CONSTRUÇÃO NACIONAL. Resenha Temática • Cad. CRH 20 (49) • Abr 2007.
FILHO, Waldemar S. Pedreira Filho. Os intelectuais e a organização da cultura – Por Antonio Gramsci. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1968. 244 p. Resenha Bibliográfica • Rev. adm. empres. 17 (1) • Fev 1977
SIRINELLI, Jean-François. Os intelectuais. In: RÉMOND, René. Por uma história política: Rio de Janeiro: Ed. UFRJ/Ed. FGV, 1996.
TORRES, Alberto. A Organização Nacional. Fonte Digital – Digitalização da 3a. Edição. 2002 (ebook)

 

Memória da Ditadura

Hugo Gaspar Rezende Emerick

 

Hugo Gaspar Rezende Emerick

Graduação em Licenciatura em História pelo Instituto de Ciências da Sociedade e Desenvolvimento Regional no polo universitário da Universidade Federal Fluminense de Campos dos Goytacazes. Membro do Laboratório de Estudos das Direitas e do Autoritarismo (LEDA – UFF) e participante do projeto de extensão “Pré-vestibular social #Vemprocursinho”, pelo Instituto Latino-Americano para Ciência, Educação e Desenvolvimento. Possui interesse nos estudos referente a História Oral, Memória e Ditadura Empresarial-Militar brasileira. Tem como recorte principal de pesquisa Memória dos marginalizados no período ditatorial brasileiro.

 

Memória da Ditadura

Hugo Gaspar Rezende Emerick

 

       É possível iniciar uma análise sobre a construção das memórias da ditadura empresarial-militar, mais especificamente pelos governos da nova democracia formulada a partir de 1985. Também é importante discutir como descobertas recentes fizeram com que esta memória fosse revista, a luta pela hegemonia histórica do período e como nas políticas atuais a ditadura se faz tão presente e importante para entender determinados jogos da organização política e social.

No texto “A constituição das memórias sobre a repressão da ditadura: o projeto Brasil Nunca Mais e a abertura da vala de Perus”, a historiadora Janaína de Almeida Teles desenvolve uma análise sobre este processo histórico utilizando a publicação do projeto Brasil Nunca Mais de 1985 e a abertura da vala de Perus em 1990. O diálogo entre estas duas fontes teve como objetivo trazer reflexões sobre a formação da memória social brasileira referente à ditadura empresarial-militar, marcada por grandes silêncios e interdições do Estado. O processo de redemocratização brasileira sucedeu sem romper definitivamente com os baluartes da ditadura. Em função desta continuidade, que a efêmera democracia brasileira se predispusera a avaliar os vinte e um anos de um governo autoritário enfrentaria grandes dificuldades. Estas dificuldades eram impostas pelos resquícios que a democracia herdara dos seus governos antecessores.

Quase sessenta anos depois do golpe, o Brasil segue em uma disputa entre as novas e antigas gerações que se colocam à disposição de ler o passado ditatorial. As discussões em cima das análises sobre este passado se liga diretamente aos atores sociais que compõe a materialização destas memórias, caracterizada pela necessidade em afirmar a legitimidade dos seus processos individuais com o passado e a parcialidade do Estado ao compor quais atores irão dar voz no processo de construção das Histórias e Memórias Oficias[i] composição destas narrativas é a responsável por silenciar determinados grupos e/ao exaltar outros, reverberando pelo território nacional inverdades sobre o que de fato foi a ditadura.

A publicação do livro “Brasil Nunca Mais (doravante, BNM) em 1985 pode ser considerado o marco inicial na disputa de memória que o Brasil começaria a enfrentar após a redemocratização. Em suas páginas o livro expõe crimes cometidos pelo Estado através de registros encontrados nos arquivos da justiça militar. O exemplar se tornou artefato de domínio público. Assim, o BNM influenciou a construção de uma consciência coletiva referente aos crimes cometidos pelo Estado, se tornou objeto de formação nas escolas e universidades, denunciando os crimes que de certa forma se desdobram até os dias atuais. Além disso, o BNM registrou as condições das vítimas que contavam de forma detalhada suas agonias diante das torturas sofridas, registrando de forma muito clara a instrumentalização da tortura pelo regime[ii]. O impacto do livro pode ser compreendido ao expormos alguns relatos gráficos e chocantes, como os exemplos a seguir. O primeiro é o relato de José Milton Ferreira de Almeida, engenheiro de 31 anos que descreveu como era o “pau-de-arara”:

(…) que o pau-de-arara era uma estrutura metálica, desmontável, (…) que era constituído de dois triângulos de tubo galvanizado em que um dos vértices possuia duas meias-luas em que eram apoiados e que, por sua vez, era introduzida debaixo de seus joelhos e entre as suas mãos que eram amarradas e levadas até os joelhos; (…)[iii]

 

A jornalista de 20 anos Miriam de Almeida Leitão Netto, por sua vez, conta como insetos e animais eram usados nas torturas e interrogatórios:

(..) que as apesar de estar grávida na ocasião e disto ter ciência os seus torturadores (…) ficou vários dias sem qualquer alimentação (…);

(…) que as pessoas que procediam os interrogatórios, soltavam cães e cobras para cima da interrogada; (…)[iv]

 

O bancário de 28 anos Apio Costa Rosa relatou as torturas que sofreu pelas autoridades policiais:

(…) que em determinada oportunidade foi-lhe introduzido no ânus pelas autoridades policiais um objeto parecido com um limpador de garrafas; que em outra oportunidade essas mesmas autoridades determinaram que o interrogado permanecesse em pé sobre latas, posicão em que vez por outra recebia além de murros, queimaduras de cigarros; que a isto as autoridades davam o nome de Viet Nan; que o interrogado mostrou a este Conselho uma marca a altura do abdômem como tem sido lesão que fora produzida pelas autoridades policiais (gilete); (…) [v]

Em termos de vendagem, a seleção de trechos e denúncias como as destacadas acima foi muito bem sucedida o BNM por dois anos subsequentes de sua publicação vendeu mais de 300 mil cópias, sendo a obra mais vendida no Brasil durante este período, possuiu sua publicação até 2009 com 38 edições.[vi] O BNM foi responsável por fomentar no país outras iniciativas que visavam investigar e expor os crimes do governo militar.

A abertura de uma vala clandestina no Cemitério Dom Bosco, no bairro de Perus, em setembro de 1990 na cidade de São Paulo fomentada pela então prefeita Luiza Erundina (PT), conhecida como Vala de Perus, talvez seja o  marco mais importante para a historiografia brasileira entender a tamanha violação dos direitos humanos que o Estado cometeu, a iniciativa buscava restos mortais dos militares assassinados pelo Estado, nesta vala foram retirados 1.049 sacos com ossos humanos[vii]. A abertura da Vala foi marcada por grandes episódios, o horror que o Brasil vivenciou por 21 anos se fazia presente, a impunidade e o abuso de poder se materializa frente a sociedade, foram encontrados corpos completos, mas também foram encontrados pedaços isolados. Certamente a Vala de Perus serviu como validação para todos os relatos das vítimas que o Estado se empenhou para serem esquecidas.

A descoberta dos restos mortais repercutiu por todo o país, causando grande comoção nacional, sendo notícia das maiores emissoras de telecomunicação do Brasil[viii]. O governo da prefeita Erundina abriu uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Câmara Municipal de São Paulo, na pretensão de apurar os crimes que levaram tantos cidadãos brasileiros a este triste fim. A repercussão foi tão grande que desencadeou a abertura de outras valas clandestinas, como no Rio de Janeiro e Pernambuco[ix]. O Instituto Médico Legal (IML) de São Paulo e Rio de Janeiro teve seus arquivos revisados graças a pressão da CPI e dos familiares das vítimas, que pediram ao então presidente Fernando Collor a abertura dos arquivos do Departamento de Ordem Política e Social (DEOPS) em 1991, desencadeando na criação da Comissão de Direitos Humanos do Congresso Nacional e promulgação da Lei dos Mortos e Desaparecidos Políticos 9.140/1995[x].

A investigação comandada pela CPI fez uso dos documentos já produzidos até aquele momento para fazer com que os participantes tivessem noção do que eles estavam lidando de fato. Dentre os materiais utilizados, o BNM foi uma das peças chaves para revisitar o período da ditadura através das memórias coletadas na obra. Após um longo período de investigação, a CPI descobriu que o Cemitério Dom Bosco  passou a receber os corpos de presos político graças a um acordo feito entre o IML, DEOPS e Destacamento de Operações de Informação – Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI) de São Paulo. O DOI-CODI era especialista em criar versões falsas sobre os mortos por tortura. Assim, modificavam procedimentos do IML, forjando a causa raiz de seus falecimentos, atrelando as mortes nos calabolços por tortura a outras naturezas. Assim os falecidos nos porões do regime tinham como motivo da morte em seu laudo tiroteios, atropelamento acidentes, suicídios e diversas outras causas[xi].

A memória da ditadura iniciou um processo de investigação muito forte a partir destes acontecimentos. Também foi neste momento que o Estado começou a bloquear inúmeros processos de responsabilização. A descoberta da vala de Perus poderia ter mudado o rumo que a história brasileira se tivesse sido vista com a relevância que lhe cabia para memória nacional. Infelizmente os processos judiciais e extrajudiciais para recuperar de fato o que aconteceu com as vítimas encontradas nas valas foi limitada em sua sistematização e divulgação. As atitudes tomadas pelo Estado neste período reverberam na atualidade já que causaram uma deficiência na construção de debates sobre a herança que a ditadura empresarial-militar deixou para a memória sobre o regime ditatorial, marcando mais uma vez a impunidade aos criminosos contra o estado democrático.[xii]

O caso da vala de Perus e do BNM são apenas dois exemplos aqui escolhidos para levantar questionamentos sobre o que foi a ditadura brasileira e como a mesma se reverberou na memória coletiva, em especial no que diz respeito a direitos-humanos. Graças aos grupos sociais que enfrentaram o Estado e os aparatos militares, no ato corajoso de produzir estes materiais, os crimes não foram totalmente abafados, ecoam na memória coletiva do país, mesmo que de forma limitada. Na atualidade, estes materiais são objetos de pesquisa para os profissionais da memória que tomam para si o dever de fazer com que o Brasil mude suas políticas de impunidade e atraso na reconstituição real dos crimes da ditadura. Diferentemente dos países latino-americanos que também enfrentaram períodos de ditadura, mas que possuem compromissos com as memórias subterrâneas, o Brasil não soube aproveitar as oportunidades de mudar este nacional.[xiii]

Histórias e Memórias Oficiais estão fadadas a modificação, e  dependem em particular das forças políticas que ocupam os cargos chefes dos três poderes da democracia brasileira, principalmente do Poder Executivo.  Este peso se constrói porque este pode deter grande influência na ideologia do país, marcando constantes mutações na leitura do passado. Forte exemplo desta afirmação foi a cerimônia que a então presidenta Dilma Rousseff organizou em 16 de maio de 2012, para sancionar a Lei de Acesso à Informação (LAI) 12.527/2011, que em suas linhas gerais determina que todos os cidadãos têm direito à informação.

A Lei 12.528/2011 que criava a Comissão Nacional da Verdade (CNV), possuindo como objetivo central a investigação as violações dos direitos humanos entre os anos de 1946 e 1988. O evento teve caráter solene, e nele se encontravam todos os ex-presidentes do regime pós-1988 caracterizando o objetivo da presidenta em reavaliar as violações do passado brasileiro. Importante relembrar que a própria presidenta foi vítima destes crimes, e daí a tentativa de marcar seu governo como um grande divisor de águas ao que se refere a Memória e História da ditadura.[xiv]

A CNV apresentou um relatório após dois anos e sete meses; este relatório foi dividido em três volumes com mais de quatro mil páginas. O material foi entregue à presidenta Dilma Rousseff em dezembro de 2014. A partir desta pesquisa feita pelo Estado diversos trabalhos começaram a ser produzidos nos mais variados espaços, nos canais abertos de televisão, os telejornais dedicavam matérias completas a entrevistas com vítimas do regime, além de produzirem conteúdos fictícios sobre o período na pretensão de fazer com que o grande público possuísse conhecimentos básicos sobre a ditadura, entre eles a supersérie “Os Dias Eram Assim” da rede Globo estrelado em 17 de abril de 2017 foi a que mais se difundiu. Nas academias os estudiosos começaram a produzir trabalhos analisando , exaltando mas, também questionando a CNV, seus aparatos e indo a lugares que a mesma foi incapaz de alcançar. No campo jurídico muito foi revisto sobre leis e mecanismos para que o Brasil não corresse o risco de viver momentos como os de outrora. A Comissão Nacional da Verdade contribuiu para modificar a Memória e a História do Brasil.

Ao se difundir em todo território brasileiro a Comissão Nacional da Verdade se fez presente nos municípios (Comissão Municipal da Verdade) e os estados (Comissão Estadual da Verdade) que iniciaram seus levantamentos sobre os crimes aos direitos humanos independente dos estudos feito pelo Estado.  Esta movimentação ficou conhecida como “justiça de transição”, já que a CNV foi uma instituição criada no âmbito jurídico-politico. Seus desdobramentos foram tomando forma desde 1990, uma vez que nesse período muitos países (principalmente os latino-americanos) estavam enfrentando as heranças de governos autoritários. A  “justiça de transição”ocupou lugar relevância internacional no momento em que a Organização das Nações Unidas (ONU) iniciou a valorização de conceitos como: “direito de saber”, “direito de lembrar”, “direito à memória” e “direito à verdade”[xv].

Deve-se entender que a “justiça de transição” não é neutra e nem deve ser caracterizada como similar às lutas políticas ou sociais que enfrentavam o Estado para fazer com que a memória das vítimas não fossem esquecidas, que lutavam e lutam ainda para que os crimes fossem investigados e deixassem de sobre a sombra da impunidade. A luta dos familiares e amigos dos mortos e desaparecidos políticos não tiveram início no momento em que a CNV iniciou seus trabalhos, nem quando a ONU se atentou que todo cidadão deveria ter direito a verdade, muito menos quando o termo “justiça de transição” reverberou na sociedade brasileira. Esta luta começou há anos atrás em um enfrentamento direto com o Estado autoritário, quando não havia nenhuma força política capaz de proteger quem tentava buscar pelos seus desaparecidos.[xvi] A “justiça de transição” e a CNV foram instrumentos criados após o período autoritário para contribuir com o processo de dar visibilidade às vítimas, a construir mecanismos de valorização das memórias e ao desenvolvimento de uma reconciliação nacional com seu passado através da verdade.

A memória da ditadura empresarial-brasileira é marcada por lacunas que seguem esvaziadas e abafadas pelo Estado democrático. Ao selecionar a CNV como objeto de análise a partir desta perspectiva do esquecimento deve-se em primeiro lugar entender que a mesma foi criada por volta de três décadas após o fim definitivo do governo autoritário. O historiador Lucas Pedretti em seu texto “Silêncios que gritam: apontamentos sobre os limites da comissão nacional da verdade a partir do seu acervo” discute como o Brasil trilhou caminhos diferentes de países como a Argentina. Ou seja, não destacou a CNV da forma que esta ocupasse papel de importância na construção da memória hegemônica sobre este período, por não ter sido capaz de modificar o entendimento da grande massa sobre o que de fato foi a ditadura brasileira.

O Estado autoritário desde o início trabalhou para que a memória da ditadura fosse construída nos moldes que seus dirigentes queriam. Isto é: exaltavam de forma equivocada uma supremacia do Brasil neste período; produziram narrativas de que grandes feitos foram conquistados no período ditatorial, como por exemplo as construções faraônicas (Itaipu, Ponte Rio-Niterói entre outros exemplo). Assim, travou-se uma disputa entre a direita conservadora, que se descreveu como única capaz de manter a ordem no país diante das investidas da esquerda. Segundo os governantes autoritários, a esquerda desejava implementar um governo comunista, resgatando o fantasma que os Estados Unidos da América implementou em toda América Latina. sobre as falácias do que de fato era o comunismo através de torturas físicas, repressão, desaparecimento e morte dos militantes contra o regime.

Desta forma a memória que o historiador Marcos Napolitano em seu livro 1964 História do Regime Militar Brasileiro caracteriza como liberal foi responsável por difundir e introduzir inverdades na memória coletiva da país. Entre muitos mecanismos de manipulação da memória que o Estado desenvolveu, a relativização dos fatos históricos foi uma das formas através das quais o governo autoritário saiu deste período sem grandes penalidades. Dessa forma a elite brasileira condenou o regime, mas caracterizou o golpe como necessário para o Brasil, condenou os militares conhecidos como linha dura e absolveu os que participaram da transição à democracia, Geisel é levado ao status de herói nacional, enquanto Médici e Costa Silva ocupam lugar de vilões autoritários. Esta versão da memória também critica as ações da esquerda ativista mas compreende as ideologias que os levaram aos seus fins. Ou seja, esta memória consolida e reproduz diversas dicotomias equivocadas, que se desenvolveram para manipular e confundir a mente dos brasileiros. A memória liberal foi bem sucedida no que se dispuseram a fazer, apagando os traumas do regime e levantando uma ideologia fictícia dos fatos, que tem seu genesis na promulgação da Lei de Anistia[xvii].

Em 28 de Agosto de 1979, o então presidente João Figueiredo promulgou a Lei Nº 6.683 que em seu primeiro artigo delega:

É concedida anistia a todos quantos, no período compreendido entre 02 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979, cometeram crimes políticos ou conexo com estes, crimes eleitorais, aos que tiveram seus direitos políticos suspensos e aos servidores da Administração Direta e Indireta, de fundações vinculadas ao poder público, aos Servidores dos Poderes Legislativo e Judiciário, aos Militares e aos dirigentes e representantes sindicais, punidos com fundamento em Atos Institucionais e Complementares[xviii]

Ao promulgar esta lei em 1979, o Estado autoritário marcou o início de um longo período marcado pela impunidade diante dos crimes cometidos aos direitos humanos e à democracia pelas autoridades brasileiras no exercício do governo militar. Disfarçada de um perdão que o Estado daria aos anistiados e presos políticos, a lei mirava na surdina de seu desenvolvimento a absolvição dos crimes cometidos pelos militares e forças de ordem, que já estavam sofrendo com pressões dos familiares e das vítimas do regime. O projeto de anistia explanou no Brasil uma afirmativa de que só seria possível alcançar a democracia novamente se a ditadura e seus crimes fossem esquecidos, sem julgamentos, sem culpados e sem penalidades. A memória brasileira começava a caminhar rumo ao esquecimento e manipulação dos futuros governos e elites brasileiras.

Apesar destas dificuldades enfrentadas no desenrolar do processo de redemocratização, alguns governos da nova democracia se empenharam para fazer com que este passado fosse reavaliado. Governos como o de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e de Dilma Rousseff (PT) foram os que mais reuniram forças para tornar a ditadura um legado menos pesado. Ou seja, foram estes governos os que trabalharam para possibilitar o enfrentamento contra as impunidades, possibilitando que muitos brasileiros vítimas e familiares dos que já morreram conseguissem o mínimo de dignidade para viver suas vidas tão atormentadas pelo Estado.

A memória da ditadura vem sendo pautada em muitos momentos dos últimos anos. É possível pensar que a luta pela hegemonia histórica deste período mais uma vez ocupa lugar de destaque na sociedade brasileira. O governo de Jair Messias Bolsonaro (PL) infelizmente fez com que este período tão delicado da história fosse retratado de forma totalmente deturpada, utilizando de seu poder para exaltar torturadores condenados pela CNV, como Carlos Alberto Brilhante Ustra. Ustra foi um coronel do exército brasileiro, ex-chefe dos centros de tortura e assassinato de pessoas que se opunham à ditadura militar. Era tido como influência direta do governante que durante toda sua trajetória no cargo de chefe de estado utilizou preceitos autoritários e criminosos para comandar o país. Governos como o de Bolsonaro podem servir para que o Brasil entenda como este passado ainda não foi superado e muito deve ser feito para que a democracia brasileira caminhe em passos mais tranquilos sem medo do velho fantasma da ditadura.

Como muito bem sinalizou o poeta brasileiro Millôr Fernandes “o Brasil possui um longo passado pela frente”. Esta afirmação pode ser entendida na chave de que o Brasil ainda segue passando por situações de boicotes à democracia de forma descarada e como estes boicotes estão eivados dos problemas não resolvidos no passado. Para ilustrar esta afirmativa o golpe que a presidenta Dilma Rousseff sofreu em 2016, a prisão política do presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2018 e o atentado aos três poderes em 08 de janeiro de 2023 (no qual criminosos invadiram e depredaram os prédios do Executivo, Legislativo e Judiciário logo após a posse do presidente Lula pela terceira vez) são alguns dos inúmeros episódios que o Brasil enfrentou desde sua redemocratização. E esta redemocratização segue sob ataques constantes.

Quando este trabalho é escrito, o Brasil enfrenta este passado com seriedade e faz com que o país, principalmente os estudiosos sobre a memória da ditadura fiquem mais otimistas com o futuro. O hodierno ministro Direitos Humanos e Cidadania do terceiro mandato do governo Lula, Silvio Almeida vem se posicionando frente aos crimes cometidos na ditadura, na busca em entender onde o Estado brasileiro falhou e segue falhando, no desejo de reescrever esta memória tão flagelada pelos seus antecessores. O ministro acredita que disputar a memória da ditadura é peça fundamental para interromper a violência existente no Brasil. Assim, em 03 de março de 2023, véspera do quinquagésimo nono aniversário do golpe militar de 1964, na Comissão de Anistia Silvio de Almeida defendeu a necessidade de que a sociedade brasileira retornasse suas atenções à memória da ditadura, desprovidos da ideia que este revisitar histórico tem relação com revanchismos:

Uma nova fase desse país de restauração da memória, da verdade e da justiça tem, no dia de hoje, um marco nesta primeira sessão plenária emblemática. Alguns veem nessas iniciativas revanchismos ou mesmo tentativas de dividir a nação brasileira. Eu diria que é justamente o contrário! Nenhuma nação se ergueu ou se manteve coesa sem olhar para suas fraturas e repará-las[xix].

As memórias subterrâneas sempre lutaram para possuir seu espaço diante das disputas hegemônicas. No caso da ditadura empresarial-militar não seria diferente, famílias e vítimas do Estado em diversos momentos da História enfrentaram de forma solitária e muitas vezes suicidas os baluartes do governo autoritário, defendendo o legado dos seus, correndo risco de vida pelas repressões que os assolavam. Mas isso pouco importava já que as motivações pelo enfrentamento ultrapassaram qualquer temor. Políticas atuais incentivam que os familiares e vítimas deste período busquem seus direitos através dos requerimentos de anistia, direito adquirido através da Lei Nº 10.559, de 13 de Novembro de 2002, que em seu primeiro artigo diz:

Art. 1o  O Regime do Anistiado Político compreende os seguintes direitos:

I – declaração da condição de anistiado político;

II – reparação econômica, de caráter indenizatório, em prestação única ou em prestação mensal, permanente e continuada, asseguradas a readmissão ou a promoção na inatividade, nas condições estabelecidas no caput e nos §§ 1o e 5o do art. 8o do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias;

III – contagem, para todos os efeitos, do tempo em que o anistiado político esteve compelido ao afastamento de suas atividades profissionais, em virtude de punição ou de fundada ameaça de punição, por motivo exclusivamente político, vedada a exigência de recolhimento de quaisquer contribuições previdenciárias;

IV – conclusão do curso, em escola pública, ou, na falta, com prioridade para bolsa de estudo, a partir do período letivo interrompido, para o punido na condição de estudante, em escola pública, ou registro do respectivo diploma para os que concluíram curso em instituições de ensino no exterior, mesmo que este não tenha correspondente no Brasil, exigindo-se para isso o diploma ou certificado de conclusão do curso em instituição de reconhecido prestígio internacional; e

V – reintegração dos servidores públicos civis e dos empregados públicos punidos, por interrupção de atividade profissional em decorrência de decisão dos trabalhadores, por adesão à greve em serviço público e em atividades essenciais de interesse da segurança nacional por motivo político.

Parágrafo único.  Aqueles que foram afastados em processos administrativos, instalados com base na legislação de exceção, sem direito ao contraditório e à própria defesa, e impedidos de conhecer os motivos e fundamentos da decisão, serão reintegrados em seus cargos[xx].

 

A busca pelos direitos que o Estado Democrático oferece deve ser reivindicada por todos que lhe cabem. Através de organizações compostas por familiares que possuíram seus entes queridos ceifados, vítimas e defensores da memória e verdade, devem se fortalecer para que o governo brasileiro pague por todos os crimes cometidos. Assim, é possível estabelecer um confronto contínuo diante dos silenciamentos da História Oficial, para que a verdade extravase dos arquivos nacionais e ocupem palco em praças públicas da república; é possível que o povo saiba sobre seu passado e não aceite mais ser trajado de trouxa pelos governantes; é possível que o brasileiro saiba que sua magnitude social espelha o vasto território que este país continental possui e assim, poder defender seu local na democracia.

Cabe aos profissionais da memória lutar por um país no qual suas feridas sirvam de exemplo para os tempos futuros, delineando caminhos que já foram percorridos e que não devem mais ser sequer cogitados. E assim, estender os pecados da nação em museus, teatros e praças para que todos saibam quem são os que nos antecedem, sem o saudosismo hipócrita e mentiroso através dos quais são exaltados verdadeiros criminosos da história brasileira. A  memória deve ser arquétipo de liberdade entre os cidadãos, e através da mesma, as instituições de ensino poderão reverberar a história real deste povo tão silenciado.

O Estado democratico brasileiro, unido com as estruturas acadêmicas e os profissionais de memória devem se unir em um esforço incansável para fazer com que as vítimas da ditadura possuam espaço entre as páginas dos livros de história. Além dos direitos à memória e à verdade, o Estado deve financiar como previsto em lei de forma material às vítimas e seus familiares que tiveram suas vidas destruídas pelo autoritarismo, já que muitas as vítimas dificilmente conseguem voltar a suas vidas de forma normal. Muitos sofrem pelo resto da vida sequelas psicológicas e/ou físicas das diversas torturar que passaram.

O Estado necessita guardar e proteger os direitos conquistados a partir da Constituição de 1988, bloqueando qualquer desenvolvimento golpista de elites sociais e políticas que veneram governos autoritários. Além do governo possuir o dever dessa proteção, os cidadãos brasileiros devem estar atentos para lutar contra as mazelas que podem abalar os alicerces da democracia e principalmente os historiadores e os profissionais de memória do Brasil devem zelar e travar como compromisso máximo, a instrução de períodos que outrora assolaram a União. São trabalhos como este que podem contribuir para que a História Real se difunda entre os estudiosos que lhe acessem, para que assim seja possível reverberar as memórias de um povo silenciado pelos arcabouços do autoritarismo.

Notas:

[i] TELES, Janaína de Almeida. A constituição das memórias sobre a repressão da ditadura:o projeto Brasil Nunca Mais e a abertura da vala de Perus. p. 264

[ii]TELES, Janaína de Almeida. A constituição das memórias sobre a repressão da ditadura:o projeto Brasil Nunca Mais e a abertura da vala de Perus. p. 265

[iii] ARQUIDIOCESE DE SÃO PAULO – “Brasil: Nunca Mais”. Petrópolis, Vozes, 1985.p. 34

[iv] ARQUIDIOCESE DE SÃO PAULO – “Brasil: Nunca Mais”. Petrópolis, Vozes, 1985.p. 39

[v] ARQUIDIOCESE DE SÃO PAULO – “Brasil: Nunca Mais”. Petrópolis, Vozes, 1985.p. 40

[vi] TELES, Janaína de Almeida. A constituição das memórias sobre a repressão da ditadura:o projeto Brasil Nunca Mais e a abertura da vala de Perus. p. 265

[vii] https://memoriasdaditadura.org.br/vala-de-perus-uma-biografia/

[viii]https://blogs.oglobo.globo.com/blog-do-acervo/post/vala-de-perus-descoberta-do-cemiterio-clandestino-onde-foram-enterradas-vitimas-da-ditadura.html

[ix] TELES, Janaína de Almeida. A constituição das memórias sobre a repressão da ditadura:o projeto Brasil Nunca Mais e a abertura da vala de Perus. p. 265

[x] TELES, Janaína de Almeida. A constituição das memórias sobre a repressão da ditadura:o projeto Brasil Nunca Mais e a abertura da vala de Perus. p. 265

[xi] TELES, Janaína de Almeida. A constituição das memórias sobre a repressão da ditadura:o projeto Brasil Nunca Mais e a abertura da vala de Perus. p. 282 e 283

[xii] TELES, Janaína de Almeida. A constituição das memórias sobre a repressão da ditadura:o projeto Brasil Nunca Mais e a abertura da vala de Perus. p. 266

[xiii] TELES, Janaína de Almeida. A constituição das memórias sobre a repressão da ditadura:o projeto Brasil Nunca Mais e a abertura da vala de Perus. p. 293 e 294

[xiv] PEDRETTI , Lucas. SILÊNCIOS QUE GRITAM: APONTAMENTOS SOBRE OS LIMITES DA COMISSÃO NACIONAL DA VERDADE A PARTIR DO SEU ACERVO. Revista do Arquivo. São Paulo. p.62.

[xv] PEDRETTI , Lucas. SILÊNCIOS QUE GRITAM: APONTAMENTOS SOBRE OS LIMITES DA COMISSÃO NACIONAL DA VERDADE A PARTIR DO SEU ACERVO. Revista do Arquivo. São Paulo. p.64.

[xvi] PEDRETTI , Lucas. SILÊNCIOS QUE GRITAM: APONTAMENTOS SOBRE OS LIMITES DA COMISSÃO NACIONAL DA VERDADE A PARTIR DO SEU ACERVO. Revista do Arquivo. São Paulo.

Referências Bibliográficas:

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Brasília, DF: Presidente da República, [1979]. Disponível em:https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6683.htm#:~:text=1%C2%BA%20%C3%89% 20concedida%20anistia%20a,de%20funda%C3%A7%C3%B5es%20vinculadas%20ao%20p oder

ARQUIDIOCESE DE SÃO PAULO – “Brasil: Nunca Mais”. Petrópolis, Vozes, 1985 Câmara distribui Relatório da Comissão da Verdade às escolas. 24, mar. 2017. Disponível em:https://macae.rj.gov.br/noticias/leitura/noticia/camara-distribui-relatorio-da-comissao-da- verdade-as-escolas . Acesso em: 20, abr. e 2023.

CARVALHO, Meynardo Rocha de. Relatório da comissão da verdade de Macaé – Macaé; RJ: Câmara Municipal de Macaé, 2016.

DREIFUSS, René Armand. 1981. 1964: a conquista do estado. Petrópolis, Vozes. FERREIRA, Marieta. Amado, Janaína. 2006. Usos e abusos da história oral. FGV.

FILHO, William Helal. Vala de Perus: O cemitério clandestino onde a ditadura militar escondeu as ossadas de vítimas da repressão. O Globo, 04 set. 2020. Disponível em: https://blogs.oglobo.globo.com/blog-do-acervo/post/vala-de-perus-descoberta-do-cemiterio-c landestino-onde-foram-enterradas-vitimas-da-ditadura.html Acesso em: 20, mar. e 2023.

LE GOFF, Jacques.2021. História e Memória.Campinas. Unicamp.

NAPOLITANO, Marcos. 2021. 1964: História do Regime Militar Brasileiro. São Paulo, Contexto.

NORA, Pierre. 1993. Entre memória e história; a Problemática dos lugares.

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[xvii] NAPOLITANO, Marcos. 2021. 1964: História do Regime Militar Brasileiro. São Paulo, Contexto. p. 319

[xviii]https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6683.htm#:~:text=1%C2%BA%20%C3%89%20concedida%20anistia%20a,de%20funda%C3%A7%C3%B5es%20vinculadas%20ao%20poder

[xix]https://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2023-03/comissao-de-anistia-pede-recuperacao-da-memoria-contra-ditadura

[xx] http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/l10559.htm

 

 

 

Graduação em Licenciatura em História pelo Instituto de Ciências da Sociedade e Desenvolvimento Regional no polo universitário da Universidade Federal Fluminense de Campos dos Goytacazes. Membro do Laboratório de Estudos das Direitas e do Autoritarismo (LEDA – UFF) e participante do projeto de extensão “Pré-vestibular social #Vemprocursinho”, pelo Instituto Latino-Americano para Ciência, Educação e Desenvolvimento. Possui interesse nos estudos referente a História Oral, Memória e Ditadura Empresarial-Militar brasileira. Tem como recorte principal de pesquisa Memória dos marginalizados no período ditatorial brasileiro.

A eleição de Armando de Salles à Presidência da República (1936-1937): apontamentos iniciais para pesquisa em História

 

George Leonardo Seabra Coelho

 

George Leonardo Seabra Coelho

A eleição de Armando de Salles à Presidência da República (1936-1937): apontamentos iniciais para pesquisa em História

 

George Leonardo Seabra Coelho

 

Introdução

O dia 3 de janeiro de 1938 seria a primeira eleição presidencial desde 1930. Mesmo que a eleição não tenha ocorrido em consequência do autogolpe impetrado por Getúlio Vargas em 10 de novembro de 1937, torna-se necessário realizar um estudo histórico sobre essa campanha eleitoral. Entendemos que a referida campanha oferece um indicador do espírito público, da opinião pública e de seus movimentos, René Rémond (1996) considera esse momento como parte integrante de uma eleição, ou melhor, ela é o seu primeiro ato. Apesar da não realização da eleição, examinaremos a campanha eleitoral empreendida pelo Movimento Bandeira em prol da candidatura de Armando de Salles Oliveira.

Ao se lançarem na arena política na década de 1930, os adeptos do Movimento Bandeira se ancoravam em quatro pilares: incorporar a atualidade sem quebrar as tradições; valorizar a cultura brasileira; negar os estrangeirismos; e, por fim, defender a arte com cunho político. Ao apropriarem-se do “mito bandeirante” como símbolo político, os bandeiristas[1] construíram uma relação peculiar entre o tempo (passado e presente) e o espaço (região paulista), bem como, uma associação sui generis entre a tradição e o moderno. Para os bandeiristas, somente com a união entre a tradição – o passado paulista – e o moderno – modernismo e industrialização – seria possível solucionar os dilemas políticos da década de 1930. A revista S. Paulo e o jornal Anhanguera[2] são excelentes documentos para acompanhar a pré-campanha à Presidência da República de Armando de Salles.

Sem mais delongas, convidamos o leitor conhecer um pouco dessa experiência eleitoral sob a perspectiva dos bandeiristas, a qual se divide entre a exaltação da figura de Armando de Salles e a oposição a Plínio Salgado, José Américo e Getúlio Vargas.

A publicização do governo de Armando de Salles através da revista S. Paulo

A revista S. Paulo foi lançada em 31 de dezembro de 1935 e circulou apenas no ano de 1936 sob a direção de Cassiano Ricardo, Menotti del Picchia e Levém Vanpre[3]. Ao longo das dez edições, os redatores exaltaram as construções urbanas, a ampliação dos serviços de energia elétrica, água e esgoto. As iniciativas de melhoria na Saúde e Segurança Pública também receberam grande destaque. Os atos de Armando de Salles no campo educacional, especialmente na reestruturação do Ensino Primário, Secundário, Profissional e Superior, foram amplamente noticiados. O campo econômico foi bastante abordado, particularmente o desenvolvimento na agricultura, pecuária e indústria, como também as reformas nos portos, nas linhas ferroviárias, no transporte aéreo e na construção de rodovias. Os redatores enalteceram o “plano de reorganização administrativa” empreendido por Armando de Salles[4].

No discurso publicitário, os redatores proclamam que o governo de Amando de Salles foi um “período ativo, criador e fecundo” por obra de seu “espírito novo” e, especialmente pela sua “capacidade [extraordinária] de administrador[5]”. Para estes apoiadores, o

 

governo paulista se multiplic[ou] em realizações cotidianas por todos os setores que integram o seu formidável programa de trabalho. Sente-se que há um sentido nitidamente bandeirante nas suas iniciativas largas e inaugurais. Porque correspondem, todas, ao grande destino histórico de S. Paulo, dentro do Brasil[6].

 

Os redatores referiam-se a essas iniciativas como parte de um formidável impulso “que liga[ra]m admiravelmente o presente com a tradição[7]”, criando um novo bandeirismo. A gestão de Armando de Salles é um “governo bandeirante” que trabalha “pela grandeza do Brasil[8]”. Essa foi uma estratégia utilizada repetidas vezes pelos redatores para consolidar a pré-campanha eleitoral de Armando de Salles, quer dizer, associar as realizações no presente como parte de uma tradição que remontava ao período das Bandeiras paulistas. Na recuperação do mito bandeirante, os redatores glorificaram a figura de Fernão Dias Paes Leme como uma personalidade que realizou “o sonho paulista de fazer um grande Brasil […] disciplinado e orgânico[9]”.

Em meados da década de 1930, os redatores reforçaram a necessidade de retomar os exemplos dos Bandeirantes para combater as ideologias forasteiras e, no presente essas qualidades haviam se materializado na figura de Armando de Salles. O governador paulista foi apontado como um novo chefe, ou melhor, um novo Bandeirante que guiaria todos brasileiros nesta nova arrancada rumo ao progresso. Esta associação do governador paulista ao bandeirante ficou explícita no quarto número da revista S. Paulo. Vejamos:

 

Figura 1 – Fernão Paes Lemes e Armando de Salles

Fonte – Revista S. Paulo, São Paulo, abril de 1936.

No lado direito, vemos a fotografia do busto da escultura de Fernão Dias Paes Leme ilustrando a capa do quarto número do periódico. Já, no lado direito, encontramos uma fotografia do busto de Armando de Salles na página oposta à capa. Essa estratégia foi propositalmente pensada para que o leitor, ao folhear as páginas da revista, construísse simbolicamente a analogia entre o Bandeirante e o Governador de São Paulo, em outras palavras, a analogia entre o passado e o presente e, ainda, uma continuidade para o futuro.

Além da associação direta entre as duas imagens, algumas questões – agora de ordem técnica – merecem ser levantadas. Ambas as fotografias compartilham da mesma técnica; o contra-plungé. O recorte e o ângulo utilizado pelo fotógrafo – nas duas imagens – provocaram uma leve inclinação de baixo para cima, recurso este que procurou transmitir a sensação de engrandecimento das figuras. Outra questão técnica refere-se à iluminação; ambas as imagens possuem um sombreado na face. Esse jogo de luz realçou a inclinação do olhar para baixo. Podemos dizer que este recurso pretendeu transmitir uma sensação específica; de que estes sujeitos são pensativo-contemplativos-reflexivos, isto é, personagens que transmitem sabedoria, em outras palavras, qualidades intrínsecas ao chefe.

Para os bandeiristas, o lema – que deve ser seguido– é “organização em torno da autoridade[10]”. Esse lema, segundo os redatores, tornava-se necessário, “principalmente no momento em que certas forças corrosivas contagiam o mundo, abalando os alicerces da sociedade e da família, da pátria e da religião[11]”. Estas forças corrosivas que abalam a sociedade são as ideologias tidas por estrangeiras, isto é, o Comunismo, o Fascismo e a Democracia Liberal.

Ao final do ano de 1936, o político paulista antecipou-se ao debate sucessório à Presidência da República e se apresentou como o principal candidato de oposição na eleição marcada para 1938. Apesar do fim da circulação da revista S. Paulo, Cassiano Ricardo e Menotti del Picchia continuaram colaborando com a candidatura de Armando de Salles através do jornal Anhanguera.

 

O jornal Anhanguera: os bandeiristas se lançam na campanha eleitoral em favor de Armando de Salles

O Partido Constitucionalista (PC) lançou a candidatura de Armando de Salles para Presidente da República em maio de 1937. Na expectativa de se eleger em 3 de janeiro de 1938, Armando de Salles dirigiu um manifesto à Nação convocando seus partidários a realizar um Congresso Extraordinário e, assim, ratificar sua escolha como candidato. O PC foi peça fundamental para o alicerçamento do projeto político armandista, projeto este que ganhou força com a criação da União Democrática Brasileira (UDB) em junho de 1937. O teor dos pronunciamentos de Armando de Salles era fortemente marcado pelo enfoque na necessidade de organizar politicamente o país. Para Carolina S. Sousa (2013), o político insistia na ideia de que o cerne do problema brasileiro não estava na organização das classes e, sim na falta de um partido nacional.

Durante a campanha eleitoral, os editores do jornal Anhanguera declararam que o Movimento Bandeira era uma organização que “não se filia[va] a partidos” e, não por isso, se apresentava menos preocupado com a conjuntura da época. Seus adeptos postulavam que não poderiam “ficar indiferentes[s] a uma luta cívica das proporções e da transcendência da próxima batalha eleitoral que se travar[ia] em torno da sucessão presidencial[12]”.

Nesta conjuntura, o Movimento Bandeira apoiou incondicionalmente a candidatura de Armando de Salles. Este apoio se dava, não somente para pôr o projeto bandeirista em ação, mas para a retomada do papel de destaque dos paulistas no campo político nacional. Com base neste horizonte de expectativa, os bandeiristas defendiam “uma propaganda política que […] [tivesse] o mesmo estilo límpido da atualidade[13]”. Para esses publicistas, o “candidato que procurar prometer, sem dizer as razões da promessa ou que, seguindo o velho estilo, tentar explorar fibras sentimentais, fracassará irremediavelmente[14]”.

Diante essa prerrogativa que reforçava a personalidade do candidato paulista, os bandeiristas ressaltavam a “vantagem imensa da candidatura Armando de Salles[15]”, pois este político representava “uma orientação construtiva[16]” que atestou “um trabalho criador[17]” durante sua gestão no governo paulista, as quais foram entusiasmadamente publicizadas na revista S.Paulo em 1936. Após realçar as credenciais de Armando de Salles, os bandeiristas salientam que:

Enfrentando candidatos […] messiânicos e caricaturais que só compreendem o interesse público pela literatura, leva o ilustre candidato nacional uma indiscutível vantagem sobre seus concorrentes. Armando de Salles Oliveira, como homem moderno […] E é por isso que vencerá como um candidato do Brasil moderno[18].

Neste fragmento, percebemos como os bandeiristas se posicionavam frente os outros candidatos, especialmente Plínio Salgado – posto como messiânico – e José Américo – apontado como caricatural.

Os bandeiristas acreditavam que a campanha se travaria no trabalho da conquista direta do eleitor. Como tática para alcançar o eleitorado, o jornal Anhanguera noticiou a instalação da Cruzada Paulista de Alistamento Eleitoral. Esta iniciativa ganhou força ao perceberem que o estado de São Paulo era o maior colégio eleitoral e, por esta razão, quanto “maior for esse eleitorado, mais importante será o papel político que S. Paulo desempenhará na União[19]”.

Além de ressaltarem a importância do eleitor paulista, várias reportagens destacavam como a candidatura armandista repercutia em todas as camadas sociais, nos meios militares e em diversos estados, especialmente em São Paulo, Bahia, Espírito Santo, Rio Grande do Sul, Pará e Minas Gerais. As manchetes evidenciavam que a candidatura do político paulista era nacional.

O jornal transcreveu os discursos de instalação da UDB em favor da candidatura de Armando de Salles, noticiava sobre as articulações do PC e informava a instalação da Frente Nacional Democrática. Para os bandeiristas, somente essas agremiações poderiam salvar a democracia brasileira contra o ímpeto autoritário dos Integralistas e de Getúlio Vargas.

Outra estratégia bandeirista no jornal Anhanguera era a desqualificação dos candidatos opositores. Em diversas oportunidades, os bandeiristas debocharam dos comícios de José Américo. Diversas chamadas ironizavam os cancelamentos ou a baixíssima presença dos eleitores em seus comícios como, por exemplo, em São Cristovão no Rio de Janeiro, o qual foi adiado. A chamada ironizou que o “candidato do governo fala[va] às estrelas[20]”, pois a candidatura de José Américo “é considerada um caso perdido[21]”.

Em outra reportagem, os redatores resgataram o discurso de José Américo na convenção de 25 de maio de 1937 realizada em Belo horizonte. Para os bandeiristas, o candidato da situação “causou uma certa decepção, mesmo entre seus correligionários e admiradores[22]”, pois José Américo falou “demasiadamente de sua pessoa, justamente numa campanha política, que deve ser impessoal[23]”. De acordo com a crítica, José Américo se apresentava como o “homem do povo”, “apóstolo do bem comum” e “humilde”, mas com o iniciar da campanha apresentou-se como um “político teórico dos velhos tempos, sequioso de falar de si mesmo, de suas virtudes intimas, de suas emoções[24]”. José Américo é posto como o “candidato de oportunidade, para manejo de certos estrategistas da politicagem”, mas “não [seria] o candidato que atenderia as expectativas nacionais[25]”.

Em um dos editoriais, os bandeiristas comentaram sobre a felicidade que alguns intelectuais sentiram ao saberem que José Américo seria candidato à presidência. Para os bandeiristas:

De fato, o Sr. José Américo é um artista, um intelectual […] Mas, o Sr. José Américo foi escolhido foi pro isso? Iria para a presidência da República o autor da “Bagaceira” ou o revolucionário autêntico, o político paraibano, a vestal dos dinheiros públicos, o inimigo do capital estrangeiro, o ex-ministro do Sr. Getúlio Vargas? […] Muito embora seja o candidato do Catete um excelente escritor, não é um nome índice da literatura patrícia […] Nós intelectuais estamos, por certo, animadíssimo. Porém, com outro nome. Estamos, com o Sr. Armando de Salles Oliveira, porque, além de homem de pensamento, jornalista, sociólogo e um dos oradores mais modernos do país, é um candidato que tudo vem fazendo pela cultura, pela formação da nova mentalidade brasileira[26].

A partir da leitura deste fragmento, vemos claramente a posição dos bandeiristas sobre a figura de José Américo. O candidato da situação, segundo esses publicistas, não era digno de ser Presidente, uma vez que apesar de ter sido um crítico dos desmandos da velha política, este se submeteu totalmente aos interesses Varguistas.

Ao lado de José Américo, os bandeiristas também miraram em Plínio Salgado. Apesar de serem escritores pertencentes ao mesmo grupo literário na década de 1920, Cassiano Ricardo e Menotti del Picchia não mediram esforços para desconstruir a figura de Plínio Salgado, assim como dos Integralistas. Diversas notícias apontavam para as violentas passeatas Integralistas, as quais sempre ganhavam notoriedade pelos mortos e feridos. Segundo os bandeiristas, esses comícios e passeatas eram “uma triste sequência de conflitos e incidentes. Afrontam a lei, desfilando armados e uniformizados […] lançando por toda a parte o germe da luta e da desordem[27]”.

Como de costume, essas críticas geralmente eram acompanhadas por charges como, por exemplo, a imagem abaixo que satirizou um Integralista após uma passeata.

Figura 2 – Passeatas Integralistas

Fonte – Anhanguera, 22 de julho de 1937, p.1

Para os bandeiristas, Plínio Salgado era um “apóstolo da violência, que fala em nome de Deus[28]”. Diversas reportagens denunciavam que os integralistas agrediam e matavam seus opositores, em outras palavras, o ímpeto violento dos integralistas parece fazer parte de um plano […] visando criar uma situação de insegurança geral. Os integralistas estariam a serviço de forças políticas interessadas na perturbação da ordem afim de prejudicar a campanha eleitoral […] Não podendo viver num ambiente de liberdade e não podendo medir suas forças eleitoralmente, os nazistas nacionais fazem o jogo de forças políticas bem conhecidas como interessadas na suspensão das garantias constitucionais[29].

Além de um grupo violento, os bandeiristas acusam o partido de ter uma ideologia desnacionalizadora; os integralistas eram os “nazistas nacionais”. Segundo os bandeiristas, a prova disso é que os adeptos do sigma “tem seus ninhos mais fornidos, onde o Brasil não conseguiu assimilar o estrangeiro e os filhos de estrangeiros aqui nascidos: na ‘Alemanha Antártida’ […] entre as populações germânicas ou teuto-brasileiras do sul[30]”.

Como forma de desqualificar a candidatura do líder integralista, os bandeiristas denunciavam a infiltração nazista. Além de questionar o símbolo, os gestos, a uniformização dos indivíduos, as passeatas, o uso do conceito de democracia, a técnica da violência, os redatores bandeiristas afirmavam que não há nenhuma diferença entre nazismo e integralismo­.

Outra meio de desmoralizar a campanha Integralista era a acusação de fornecimento de munições militares aos “camisas-verdes”. Os bandeiristas acusavam o presidente Getúlio Vargas de conluiar-se com os camisas-verdes, ou seja, com “um partido que atenta[va] contra a Constituição, promovendo passeatas fascistas, provocando mortandade, e, ainda por cima, servindo-se de armas confiadas ao Exército para a manutenção da Constituição e defesa da Pátria… Que dizer a isto?[31]”. Para os bandeiristas, o acúmulo de armas servia para que os “núcleos sigmoides” tentassem “uma próxima investida para a conquista do poder[32]”. Como visto, além de denunciar que os Integralistas postulavam uma ideologia desnacionalizante e estavam se armando, os bandeiristas denunciavam as manifestações de simpatia de Getúlio Vargas ao “chefe dos fascistas nacionais[33]”.

As reportagens afirmavam que o presidente enxergava “com simpatias a candidatura do chefe verde[34]”. Essa confirmação foi feita após a chegada do eminente “prócere verde” em Fortaleza. De acordo com os redatores do jornal Anhanguera, essas aproximações na boca do povo, ganharam múltiplos sentidos. Dizem uns que o Sr. Vargas quer agradar os “camisas verdes”, para uma possível convulsão do Brasil […] Há quem diga, por exemplo, que o Sr. Getúlio – dentro das suas normas de “cozinhar em água fria” – percebendo que a candidatura nascida da convenção já está desmoralizada, vê no Sr. Plínio Salgado a última possibilidade de pôr no Catete um fantoche que ele poderia manobrar ao seu bel-prazer[35].

Na campanha em prol da eleição de Armando de Salles, outro principal alvo dos bandeiristas foi Getúlio Vargas. Os bandeiristas insinuavam que Getúlio Vargas intencionava interferir no pleito presidencial. Em várias manchetes vemos: “o Sr. Getúlio Vargas pretende criar razões que justifiquem a sua já ostensiva intervenção no pleito presidencial” (02/08/1937); “O Sr. Getúlio Vargas está intervindo abertamente na campanha presidencial” (03/08/1937). No editorial intitulado “Duas mentalidades”, os redatores criticaram o presidencialismo liberal, dizendo que o representante da Nação “fica tão focalizado pela opinião” que os “atos e suas ideias se refratam no clima político ambiente, moldando-o a sua imagem e semelhança[36]”. Diante desse pressuposto, isto é, os perigos da Democracia Liberal, os bandeiristas expressaram seus pontos de vistas a respeito de Getúlio Vargas.

Para os redatores anhangueras, houve quem julgasse Vargas um “mestre em jogar xadrez político” ou dotado de um “camaleonismo ideológico com que coloriu sua política[37]”. Outros descreviam que seus nervos eram “compostos não de células sensíveis, mas de uma estranha matéria plástica, fria como as roscas de uma serpente[38]”. Alguns cogitavam que as “suas contraditórias deslocações” criaram a “genialidade do homem de visão flumínea, que se desloca” para se colocar “sempre ao lado da vitória[39]”. Frente às várias tentativas de compreender Vargas, os bandeiristas entendiam Getúlio Vargas como “um assombro e um mistério[40]”. No entanto, anunciavam que “o honrado chefe de governo, não tem alma de monstro, nem nervos de borracha, nem a ferocidade álgida dos ofídios. É apenas uma rolha. Uma rolha que flutua a mercê dos acontecimentos[41]”. De modo geral, os bandeiristas apontavam que somente uma “preocupação obcessiona[va] seu espírito: manter-se no poder[42]”.

No que se refere a campanha política da sucessão presidencial no segundo semestre de 1937, Boris Fausto (2000) considera que faltava um pretexto para Getúlio Vargas reacender o clima golpista, pois estava ciente de que o poder escaparia de suas mãos. O Plano Cohen forjou uma suposta insurreição comunista. Esse plano passou para as mãos da alta cúpula do Exército e, em 30 de setembro de 1937, foi divulgado em programas oficiais pelo rádio e jornais. Em fins de outubro, o deputado Negrão de Lima percorreu os estados do Norte e do Nordeste para garantir o apoio dos governadores ao golpe planejado por Vargas. Somente no início de novembro de 1937 a oposição ao golpe se mobilizou. Armando de Salles lançou um manifesto aos chefes militares apelando para que impedissem a execução do golpe. De acordo com o autor, esse ato serviu apenas para apressar o golpe sob a alegação de que clima de desordem estava chegando ao extremismo. Em plena campanha presidencial, Getúlio Vargas faz uma proclamação – “O prefácio do Estado Novo” – em 10 de novembro de 1937 que mudaria o curso dos acontecimentos.

Decretado o golpe, a campanha presidencial empreendida pelos “novos bandeirantes” em prol da candidatura de Armando de Salles foi interrompida, da mesma maneira que as atividades do Movimento Bandeira. Na noite de 10 de novembro, Armando de Salles foi detido em sua residência, nela permanecendo até o dia 20 do mesmo mês. Dela foi levado diretamente para a Mina de Morro Velho, onde teve residência forçada. Em maio de 1938 foi transferido para o Rio de Janeiro, lá permanecendo poucos dias, regressando para São Paulo. Em fins de outubro recebeu intimação indicando que deveria embarcar – na qualidade de exilado político –para o estrangeiro. Segundo Souza (2013), no exílio, o ex-candidato passou pela França, Nova York e, por fim, Buenos Aires. Doente, Armando de Salles teve permissão de Getúlio Vargas para regressar ao Brasil; desembarcando em São Paulo no dia 7 de abril de 1945, falecendo no dia 17 de maio do mesmo ano.

Considerações finais

No campo das disputas políticas de meados da década de 1930, os “novos bandeirantes” se colocavam como quarta via frente à proximidade da sucessão presidencial marcada para 1938. A nosso ver, a atuação dos bandeiristas na revista S. Paulo e no jornal Anhanguera representaram parte da campanha em prol da candidatura de Armando de Salles à Presidência da República.

Como observamos ao longo deste estudo, o Movimento Bandeira sustentava o apoio de Armando de Salles com o intuito de assentar a vitória do projeto político e econômico paulista. A defesa de um único programa ideológico para o Brasil e a importância da propaganda na campanha eleitoral eram as principais preocupações dos intelectuais reunidos em torno do grupo. Por meio da leitura da revista S. Paulo e do jornal Anhanguera, podemos concordar com Luca (2008), pois não foram obras solitárias, mas empreendimentos que reuniram “um conjunto de indivíduos, o que os torna projetos coletivos, por agregarem pessoas em torno de ideias, crenças e valores que se pretende[u] difundir a partir da palavra escrita[43]”. Como forma de demonstrar que estes periódicos não eram projetos individuais, vemos como a publicidade bandeirista apropriou-se de outros noticiários, de imagens, de charges, de enunciados literários e do “mito bandeirante” para sustentar simbolicamente a campanha eleitoral de Armando de Salles.

Apresentamos, também, as formas como os bandeiristas empreenderam a propaganda eleitoral em beneficio de Armando de Salles. Em meio à campanha de sucessão presidencial, a oposição a José Américo se resumiu à falta de projeto do candidato e à intervenção de Getúlio Vargas no processo eleitoral. Também era noticiada a repercussão da campanha presidencial em outros estados, os comícios pacíficos do candidato bandeirante em contraposição à violência das manifestações integralistas. Já o ataque ao Integralismo adquiriu a categoria de combate à cópia de modelos europeus e aos “ismos” políticos.

Neste estudo, traçamos parte do contorno da divisão geográfica das eleições, uma vez que essa propaganda eleitoral imaginava que a captação de votantes paulistas garantiria a eleição do candidato paulista. Por outro lado, traçamos o comportamento político deste grupo, o qual apontava Armando de Salles e seu projeto político como uma proposta que abarcaria toda a Nação. Apesar de a eleição não ter ocorrido devido ao golpe de 10 de novembro de 1937, fomos capazes de perceber – a partir da visão dos bandeiristas – as formas de convencimento da opinião pública e exposição das correntes ideológicas – sob a ótica bandeirista – que estavam em jogo no processo eleitoral.

Acreditamos que, frente à dificuldade de criar partidos nacionais, à falta de um conteúdo ideológico que arregimentasse a sociedade nesses partidos, à tendência autoritária, à oposição de grandes organizações vistas como inimigas da nacionalidade – AIB e Comunismo – e ao descrédito com a Democracia Liberal, os bandeiristas tentaram resolver esse problema ao desenvolver um ideário que pregava uma organização cultural de caráter nacional. Em vez de indicar a formação de um partido com base nacional, o Movimento Bandeira propôs o resgate do passado regional para sugerir uma organização cultural de caráter nacional no presente, daí a validade do conceito de “regionalismo totalizante”, isto é, um conjunto de enunciados regionais que pretendem abarca toda a Nação[44]. Como visto ao longo da exposição, os “novos bandeirantes” se colocavam fora e acima dos partidos, uma vez que os partidos existentes não representavam os interesses brasileiros, mas, todavia, abraçaram a candidatura de Armando de Salles à Presidência, pois contavam que esta personalidade poderia colocar seus ideais em prática. No entanto, todo este horizonte de perspectiva foi parcialmente frustrado com a decretação do Estado Novo em 10 de novembro de 1937.

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Notas:

[1] Chamaremos os adeptos do Movimenta Bandeira de bandeiristas ou “novos bandeirantes”.

[2] Este jornal circulou entre junho e setembro. O jornal Anhanguera foi dirigido por Cassiano Ricardo, Menotti del Picchia e Candido Motta Filho. Tinha como redator principal Osmar Pimentel, Guilherme Figueiredo era o crítico literário e Belmonte como ilustrador e, a partir do sexto número, Didio Valiengo assume a função de diretor gerente. Este periódico propagava as ações do grupo, as listas e comentários de seus colaboradores, a crítica contra a atuação política de Getúlio Vargas, a oposição ao Comunismo, ao Integralismo e à Democracia Liberal e, principalmente, a defesa da candidatura de Armando de Salles à Presidência.

[3] A periodicidade foi mensal até o oitavo número, passando a ser bimestral nos dois últimos. O periódico foi impresso pela Grafficars, com fotografias de Theodor Pressing e Benedito Junqueira Duarte (Vamp). Essa publicação também contava com a produção gráfica de Lívio Abramo, tendo como redatores Osmar Pimentel e Francisco de Castro Neves. Com a missão de divulgar o estado paulista internacionalmente, a partir do segundo número encontramos textos em inglês escritos por J. T. W. Sadler.

[4] BANDEIRAS PAULISTAS. S. Paulo, São Paulo, fevereiro de 1936, p. 3.

[5] A DIREÇÃO. S. Paulo, São Paulo, julho de 1936, p. 1.

[6] BANDEIRAS PAULISTAS. S. Paulo, São Paulo, fevereiro de 1936, p. 3.

[7] Idem.

[8] A DIREÇÃO. S. Paulo, São Paulo, janeiro de 1936, p. 1.

[9] A DIREÇÃO. S. Paulo, São Paulo, abril de 1936d, p. 1.

[10] BANDEIRAS PAULISTAS. S. Paulo, fevereiro de 1936, p. 3.

[11] Idem

[12] DUAS MENTALIDADES. Anhanguera, São Paulo, 30 de junho de 1937, p. 1.

[13] UM DANDIDATO PARA O BRASIL. Anhanguera, São Paulo, 29 de junho de 1837, p. 2.

[14] Idem

[15] UM DANDIDATO PARA O BRASIL. Anhanguera, S.Paulo, 29 de junho de 1837, p. 2.

[16] Idem

[17] Idem

[18] Idem

[19] A “CRUZADA PAULISTA DE ALISTAMENTO ELEITORAL” OBJETIVA TRANSFORMAR S. PAULO NA MAIOR FORÇA ELEITORAL DA UNIÃO. Anhanguera, São Paulo, 17 de julho de 1937, p. 1.

[20] O CANDIDATO DO GOVERNO FALA ÀS ESTRELAS. Anhanguera, São Paulo, 6 de julho, 1937, p. 8.

[21] Idem

[22] A CANDURA DO SR. JOSÉ AMÉRICO. Anhanguera, São Paulo, 1 de julho de 1937, p. 5.

[23] Idem

[24] Idem

[25] Idem

[26] O CANDIDATO DOS INTELECTUAIS. Anhanguera, São Paulo, 7 de julho de 1937, p. 1-5.

[27] Idem

[28] TEREMOS UM NOVO CANUDOS? Anhanguera, São Paulo, 17 de julho de 1937, p.1.

[29] ASSASSINADO PELOS INTEGRALISTAS UM POBRE OPERÁRIO. Anhanguera, São Paulo, 2 de agosto de 1937, p. 8.

[30] MOVIMENTO DESNACIONALIZADOR. Anhanguera, São Paulo, 13 de julho de 1937, p.1.

[31] OS INTEGRALISTAS CONTINUAM ARMANDO CONFLITOS. Anhanguera, São Paulo, 2 de julho de 1937,  p. 8.

[32] ARMAMENTO NAS SEDES DOS NÚVLEOS INTEGRALISTAS! Anhanguera, São Paulo, 5 de junho de 1937, p. 1.

[33] O CANDIDATO DO GOVERNO FALA ÀS ESTRELAS. Anhanguera, São Paulo, 6 de julho, 1937, p. 8.

[34] TROCANDO O SR. JOSÉ AMÉRICO PELO SR. PLÍNIO SALGADO, Anhanguera, 21 de julho de 1937, p. 1.

[35] Idem

[36] DUAS MENTALIDADES. Anhanguera, São Paulo, 30 de junho de 1937, p. 1.

[37] A AUTONOMIA DO RIO GRANDE. Anhanguera, São Paulo, 1 de julho de 1937, p. 1.

[38] Idem

[39] Idem

[40] Idem

[41] Idem

[42] Idem

[43] LUCA, Tania Regina de. História dos, nos e por meio dos periódicos 2ª ed. In: PINSKY, Carla Bassanezi. (Org.). Fontes Históricas. 2ª ed. São Paulo: Contexto, 2008, v. 1, p. 140.

[44] COELHO, George Leonardo Seabra. O bandeirante que caminha no tempo: apropriações do poema “Martim Cererê” e o pensamento político de Cassiano Ricardo. 2015. 346 f. Tese (Doutorado em História) – Universidade Federal de Goiás, Goiânia, 2015.

 

Neoextrativismo e a realização de Grandes Investimentos na Região Geográfica Imediata da Campos dos Goytacazes

Guilherme Vasconcelos Pereira

 

 

Bacharel em Ciências Econômicas e Mestre em Desenvolvimento Regional, Ambiente e Políticas Públicas, pela Universidade Federal Fluminense, doutorando em Sociologia Política – Universidade Estadual do Norte Fluminense – Darcy Ribeiro, membro do Laboratório de Estudos das Direitas e dos Autoritarismos e do Laboratório de Estudos da Imanência e da Transcendência da UFF/Campos dos Goytacazes, Rio de Janeiro.

Email: g_ vasconcelospereira@pq.uenf.br

 

Neoextrativismo e a realização de Grandes Investimentos na Região Geográfica Imediata da Campos dos Goytacazes

INTRODUÇÃO

A Região Geográfica Imediata de Campos dos Goytacazes, localizada ao norte do estado do Rio de Janeiro,  é fruto do mais recente modelo de divisão regional do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) realizado em 2017. Essa região é historicamente marcada pela centralidade econômica e política do município de Campos dos Goytacazes e  das atividades que envolvem a extração de recursos naturais, desde a produção sucroalcooleira até a exploração e produção de petróleo e gás.

O presente trabalho visa discutir os efeitos das atividades de extração de recursos naturais na Região, à luz do conceito de neoextrativismo.  Com isso, a presente discussão aborda a forma de inserção dos locais na atual dinâmica do capitalismo ao mercado mundial, enfatizando conceitos pertinentes ao neoextrativismo, desenvolvimento econômico e o papel do Estado nesse processo. Para o caso da Região em questão isso significa se debruçar sobre a realização dos Grandes Investimentos e os seus efeitos econômicos, sociais e políticos nos lugares onde se inserem.

 

 

1 – NEOEXTRATIVISMO NA AMÉRICA LATINA

O  conceito de neoextrativismo é especialmente debatido na América Latina, por meio de uma perspectiva crítica das estratégias de desenvolvimento adotadas na região.  Nele considera-se o histórico recente das atividades de extração de recursos naturais e as estratégias de inserção externa da região durante as primeiras décadas do século XXI.  Tal debate aponta para a relação entre essas atividades e a perspectiva de desenvolvimento adotadas pelos governos chamados de progressistas dos países latino americanos.

Svampa (2019) argumenta que o extrativismo é uma característica marcante da região. A autora afirma que pensar a relação das atividades de extração de recursos naturais na América Latina não é uma necessidade recente, mas remonta ao período de colonização dos países europeus no continente. A extração de recursos naturais  e envio ao mercado internacional faz parte da história de formação dos próprios países que integram a América Latina.

Nesse sentido, Svampa (2019), Gudynas (2012), Gago e Mezzandra (2017), Arboleda (2020), são alguns dos autores que discutem em seus trabalhos as mudanças das características dessas atividades, sobretudo nas primeiras décadas do século XXI. Para Gudynas (2012), o conceito de extrativismo na América Latina deve ser pensado considerando a extração de recursos da natureza, incluindo a agricultura, pecuária extensiva e não somente a extração de recursos minerais e naturais.

Assim o conceito de neoextrativismo apresenta tanto continuidade quanto  rupturas com o conceito clássico de extrativismo. Apresenta continuidade, pois a história econômica da região é marcada pela exploração dos recursos naturais, associados às oportunidades de crescimento econômico e papel do Estado para alcançar o desenvolvimento. Por outro lado, rupturas, pois a atual dinâmica de reprodução e acumulação do capital promove uma série de pressões ao território e à exploração de recursos naturais, resultando em uma diversidade de conflitos econômicos, sociais e políticos.

Nesse caso, a ruptura com o conceito clássico envolve a possibilidade de pensar o extrativismo em diferentes escalas. De acordo com Svampa (2019) o conceito de neoextrativismo é multiescalar e pluridimensional. Ele permite realizar a análise dos efeitos da extração de recursos naturais e o  papel dos países no modelo de divisão internacional do trabalho considerando os efeitos dessa inserção na dinâmica de reprodução do capital internacionalmente. Também permite compreender os efeitos produzidos tanto nos locais onde ocorre a extração quanto onde os recursos são emitidos para o exterior.

O conceito tem sido explorada por diversos autores, como Svampa (2020), Gudynas(2012), Arboleda(2018), em uma tentativa de atualizar o conjunto de relações e dinâmicas que envolvem a extração de recursos naturais, especialmente nos países onde a divisão internacional do trabalho os insere na dinâmica de trocas globais como produtores de commodities. Para Ribeiro (2020), o neoextrativismo é um conceito que envolve não só a extração de recursos naturais, mas permite também analisar a dinâmica de circulação e comercialização dos produtos primários, a participação do Estado influenciado pelo fenômeno da financeirização e por fim as mudanças nos espaços urbanos em prol das atividades extrativas.

Assim, o extrativismo atualmente envolve três circuitos  contraditórios, porém integrados:  a extração propriamente dita envolvendo a territorialidade e o processo de produção de matérias primas; o circuito mercantil que inclui toda a infraestrutura logística para a circulação das matérias primas e, por último, o circuito monetário que envolve os agentes financeiros e instituições promotoras dos empreendimentos. Segundo Arboleda (2020), a dinâmica da indústria extrativa e o crescente uso da tecnologia nas atividades de extração impõe a necessidade de redução dos custos de transporte fazendo com que o extrativismo tenha que ser pensado para além das atividades de extração propriamente ditas.

Ainda segundo Arboleda,  não se trata de subordinação da produção industrial ao sistema financeiro, mas de argumentar que  as estratégias de investimento sustentadas pela financeirização alavancam a expansão de operações materiais nos locais de extração. A expansão do conceito de extrativismo envolve a discussão sobre a expansão logística nos países latino-americanos, Arboleda (2018) aponta que a indústria portuária e movimentação de cargas tem evoluído tecnologicamente para suprir as demandas de circulação de mercadorias. Essa discussão logística e de infraestrutura está associada à ideia de Desenvolvimento da América Latina;  esse ponto é essencial para compreender  os mecanismos utilizados para realização das mudanças em prol das atividades extrativas.

Partindo desses pressupostos destacam-se duas diferentes perspectivas que podem ser adotadas para interpretar o neoextrativismo; a primeira delas é a perspectiva que avalia a participação do Estado-nação,  onde os governos estão presente no processo de acumulação, representado por suas empresas em uma atuação reprodutora da lógica do mercado, mas que visa converter parte dos recursos obtidos pela extração dos recursos naturais para a população. Já a segunda parte dos efeitos locais onde os investimentos em infraestrutura destinada à exportação de commodities são realizados, alterando a dinâmica dos territórios e promovendo deslocamentos, por vezes forçados, da população.

O desenvolvimento em relação ao neoextrativismo cumpre a lógica de transformação da dinâmica de reprodução do capitalismo. Quando o Desenvolvimento surgiu como uma estratégia, após a Segunda Guerra, se direcionava a um conjunto de medidas sob responsabilidade do estado nacional. Mas, à medida que a participação do Estado foi se modificando, a responsabilidade sobre o conjunto de ações para a promoção do Desenvolvimento também  se deslocou, até se tornar um assunto para os poderes locais. Passa a caber ao Estado nacional, então, garantir a internacionalização da sua economia como feito no Brasil.

2  –  DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO: NOVAS E VELHAS FORMAS DE SUA REALIZAÇÃO

Especialmente no Brasil nas primeiras décadas do século XXI desponta uma nova visão sobre o desenvolvimento econômico. Intelectuais como Luiz Carlos Bresser-Pereira passam a produzir escritos com significativa importância na condução das estratégias de desenvolvimento no país. De acordo com Sampaio Jr (2012), esse período é marcado pela substituição do “velho desenvolvimentismo” para o “novo desenvolvimento”, alterando a forma de condução do Estado para a sua realização.

Prado (2020) aponta que o desenvolvimentismo é sempre marcado por três eixos, projeto, processo e estratégia. Nesse sentido, enquanto o “velho desenvolvimento” discute o aumento do bem-estar por meio de mudanças estruturais, conciliando capitalismo, democracia e soberania nacional, o “novo desenvolvimentismo” visa reforçar estratégias de inserção internacional e condições para a estabilização da economia que sustentem políticas sociais. De acordo com Sampaio Jr (2012),

Os novos desenvolvimentistas são entusiastas do capital internacional, do agronegócio e dos negócios extrativistas. Defendem a estabilidade da ordem. Não alimentam nenhuma pretensão de que seja possível e mesmo desejável mudanças qualitativas no curso da história. São entusiastas do status quo. Na sua visão de mundo, desenvolvimento e fim da história caminham de mãos dadas. (SAMPAIO JR, 2012, p.685)

O novo contexto coloca as atividades extrativas em evidência. Embora, como já apresentado nesse trabalho, a visão clássica do extrativismo tenha produzido extensa literatura econômica, política e social criticando os efeitos dessas atividades e sua limitada contribuição para o desenvolvimento do país, os chamados governos progressistas intensificam o papel do extrativismo como atividade promotora de crescimento.

Para Gudynas (2012) dessa relação nasce o “neoextrativismo progressista”, consolidando a perspectiva de que estratégias de crescimento geram o desenvolvimento. A estratégia dos governos progressistas em toda América Latina foi compensar as desigualdades sociais e econômicas aproveitando os recursos oriundos da comercialização dos produtos primários, ou seja, o desenvolvimento foi pautado por Grandes Investimentos (GI’s)  ligados ao neoextrativismo.

A estratégia de neoextrativismo progressista tornou-se a principal referência de desenvolvimento. Para Svampa esse movimento é comparável com outra estratégia difundida para a América Latina durante os anos 1990, para ela no século XXI se formou um novo consenso,  o “consenso das Commodities”. Nesse sentido, o consenso passa a orientar as ações de empresas estatais, que por conta da sua participação no mercado de ações tem suas diretrizes alteradas e estruturadas a partir do setor financeiro.

Os interesses dos acionistas pressionaram a maneira como Estado realiza a gestão das mesmas, as empresas passam a atuar cada vez mais como empresas privadas. Nessa lógica de atuação estatal,  no Brasil também foram realizados diversos incentivos via BNDES a entes privados ligados ao setor extrativo.

A partir da segunda metade da década de 2000, diversos Grandes  Investimentos3 vão aportar no País, particularmente em infraestrutura. Esses  investimentos são viabilizados, em sua maior parte, por recursos federais,  isoladamente ou em parcerias com o capital privado, uma vez que se inscrevem  na estratégia de inserção do País na economia internacional. Cabe lembrar que  o Brasil se tornou um dos maiores exportadores mundiais de produtos minerais  e agroindustriais, acentuando, ainda mais, o processo de reprimarização da economia.(ALMEIDA e CRUZ, 2021, p.12)

Segundo Filgueiras (2010), o Estado adotou uma política de reforçar o capital financeiro e fortalecer grupos econômicos nacionais por intermédio do BNDES que, entre outras coisas, financiou novos empreendimentos. O consenso da Commodities reforça a forma de atuação do Estado e a hegemonia do neoliberalismo enquanto doutrina econômica. Nesse sentido, tais investimentos pressionaram a dinâmica social em todos os lugares onde se instalaram, flexibilizando controles ambientais e aumentando os conflitos pela terra (SVAMPA, 2019).

Nessa fase  altera-se significativamente a forma de implantação e objetivos dos GI’s. Atualmente, os empreendimentos estão inseridos em dois contextos: os interesses do capital internacional e do setor privado, fincados na lógica de reprodução das mercadorias ao nível global; o segundo, a instalação desses empreendimentos, que passa por um processo de competição entre regiões que enxergam neles sua redenção. Contudo, a realização desses grandes projetos especializados tecnicamente possui diversas ressalvas, como a capacidade de absorção desses empreendimentos no local e o enxerto tecnológico.

O extenso debate sobre a formação de enclaves e a pouca relação do extrativismo com outras atividades econômicas capazes de produzir outra realidade ganha diferentes dimensões. Entre essas dimensões entram os conflitos, ao haver um desprezo com o conjunto de relações humanas, ambientais e produtivas afetadas pelos empreendimentos.  Em geral, os GI’s consolidam o processo de apropriação de recursos naturais e humanos onde se inserem, nesses espaços prevalece a lógica estritamente econômica orientada por relações exógenas ao lugar escolhido para abrigar o empreendimento. É comum como resultado da predominância da ação exógena ao lugar  a produção de enclaves, visto que as determinações do tal empreendimento não são expressões das forças econômicas, políticas e sociais do lugar (VAINER e ARAÚJO, 1992).

Dorre (2015) afirma que o Estado é indispensável para a geração do modo de produção capitalista. Isso se deve não só ao fato do próprio Estado garantir a formação do mercado, mas também que isso se realize sob condições desiguais de poder. Já para Brandão (2010), o modo de produção capitalista sempre combinou formas de violência direta e indireta, levando a mercantilização até as últimas fronteiras possíveis,

Tais métodos baseiam-se na dominação e no predomínio da força bruta, cometendo atrocidades legitimadas pelo monopólio da violência presente no próprio aparelho estatal. A usura, a predação, a utilização de artimanhas ilícitas, a apropriação e a expropriação, as manobras especulativas etc. são seus instrumentos ordinários e não excepcionais. O tomar domínio de bens públicos, assenhorar-se e apoderar-se de propriedades e patrimônios públicos e privados em nome do progresso geral da sociedade são práticas regulares em toda a história do capitalismo. (BRANDÃO, 2010, P.45)

De acordo com Fontes (2010), a expropriação é um dos mecanismos de uso permanente do sistema capitalista. Na atual fase de expansão do capitalismo ela assume a aparência de “reatualização do roubo”  quando, na verdade, é a continuidade da chamada acumulação primitiva. Nesse sentido, para que a acumulação não seja interrompida, emerge uma nova forma de despossessão através da espoliação de bens e direitos em situações já capitalistas. Muito embora o processo de espoliação sirva para a expansão dessa forma de socialização, ao mesmo tempo, impõe significativas perdas sociais.

A onda de privatização que acometeu o mundo significou uma forma de expropriação. Harvey (2012) aponta que muitas vezes tais processos se apoiavam na legitimidade do Estado para superar a vontade popular, como privatização da água e de outros recursos naturais. As novas formas de regulação serviram principalmente para retroceder nas conquistas de lutas por direitos trabalhistas e de acesso à terra, por exemplo, configurando também uma forma de espoliação. Em suma, nesse jogo as finanças se expandem para outras áreas de valorização, extraindo valor da sociedade e da sua cooperação (GAGO; MEZZANDRA, 2017).

No capitalismo contemporâneo cabe ao Estado, em essência, gerar novos ativos como terras, fontes de matéria-prima e trabalho. O processo desencadeado pelo Estado por meio das expropriações impõe uma lógica de vida social que suprime os meios de existência em detrimento da mercantilização dos elementos preponderantes à vida, dentre elas a venda da própria força de trabalho.  Portanto,  o desenvolvimento do capitalismo ao longo da história dependeu diretamente e continua a depender da atuação do Estado. Assim, as expropriações são parte fundamental para o avanço do capitalismo, pois elas se apresentam como uma saída para a concentração de capitais (HARVEY, 2012).

 

3 – A REGIÃO GEOGRÁFICA IMEDIATA DE CAMPOS E OS GRANDES INVESTIMENTOS

Com a descoberta do petróleo na Bacia de Campos nos anos 1970, a Região Geográfica Imediata de Campos dos Goytacazes começa a conviver com os Grandes Investimentos. Em dois momentos distintos a região se tornou foco do debate da instalação de empreendimentos relacionados à produção de commodities. No primeiro momento as atividades de produção, exploração de petróleo e gás que mesmo com a estrutura física localizada em alto mar rendeu aos municípios da região volumes extraordinários de recursos e investimentos; já o segundo com a instalação do Porto do Açu em São João da Barra.

A conformidade da Região com as atividades extrativas impõe a necessidade de pensar as relações já estabelecidas e os seus efeitos.  Para Almeida e Cruz (2021), o fim do ciclo regional da indústria sucroalcooleira, a introdução da atividade extrativa de petróleo e o Complexo Portuário e Logístico do Açu produzem impactos na estrutura social, econômica e política da região. Além disso, os empreendimentos condicionam as transformações territoriais, modificando a estrutura urbana e rural dos municípios.

Esses processos reacendem e impõem novas disputas no território. A literatura pertinente aos efeitos dessas atividades destaca como as estruturas econômicas, sociais e políticas da região tornam-se dependentes e submetidas aos interesses do mercado, esses por sua vez são determinados pela estrutura transnacionalizada das empresas que atuam no segmento de extração de recursos naturais. Piquet (2021) identifica essa situação desde a instalação do complexo de produção e exploração de petróleo e gás, a seguir,

Nesse mundo corporativo, o papel central é exercido pelas chamadas petroleiras (oil companies), que constituem um poderoso grupo de empresas transnacionais, tais como Shell, Petrobras e BP. Elas detêm o capital e a tecnologia e contratam serviços – como os de sísmica, de perfuração e outros – de empresas altamente especializadas, que, por sua vez, também eram em oligopólios internacionais, dado o nível de complexidade tecnológica exigido em suas operações.(PIQUET, 2021, p.14)

Para compreender essas relações construídas por agentes externos,  Piquet (2021), Almeida e Cruz (2021), Cruz (2020), destacam a produção dos chamados “enclaves” regionais.  A influência dessas atividades promove a integração produtiva à dinâmica econômica pré-existente no território. Uma das formas mais conhecidas de integração das atividades extrativas com a economia local é a distribuição de recursos compensatórios pela exploração dos recursos minerais como os Royalties e participações especiais entre os municípios onde a exploração marinha é confrontante com o território. De acordo com Almeida e Cruz (2021),

Em 1997, foi sancionada a Lei nº 9.478, denominada Lei do Petróleo  (BRASIL, 1997), que extinguiu o monopólio estatal da Petrobras na E&P de  petróleo e gás e, em contrapartida, dobrou o percentual dos royalties, parcela devida pelas empresas da produção por poço, e instituiu as Participações  Especiais, que constituem um adicional sobre a produção dos poços mais  rentáveis. Um pequeno número de municípios privilegiados passou a receber  valores extremamente elevados, situando-os entre os municípios de maior  orçamento per capita – em alguns casos, também em valores absolutos – do País  (ALMEIDA e CRUZ, 2021, p.15)

A Lei do Petróleo e o Decreto 2.705/98, Decreto da Participações Especiais, iniciam nova fase para a receita dos municípios confrontantes. Essa realidade levou os municípios beneficiados com esse volume de recursos a serem conhecido como “petrorentistas”, no caso de Região Imediata de Campos dos Goytacazes, destacam-se os municípios de Campos e são João da Barra como àqueles que recebem Royalties e participações especiais.

Nas primeiras décadas do século XXI, a alta no preço das commodities e a demanda chinesa por esse tipo de produto impulsionaram as atividades de extração. Além do estímulo ao aumento da produção, também entrou em pauta a necessidade de melhorias na infraestrutura logística regional para facilitar o escoamento da produção na região.

Nesse contexto surge o  “Porto do Açu” . O empreendimento desde a suas primeiras conversas para implantação em 2003  visava o apoio a atividades extrativas. Porém, somente em 2005 o projeto de construção do Porto ganha forma sob controle do empresário Eike Bastista e com apoio da Companhia de Desenvolvimento Industrial do Estado do Rio de Janeiro (CODIN) e posteriormente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que financiou aproximadamente R$ 520 milhões (PEREIRA, 2018; PESSANHA, 2017).

Nesta etapa o objetivo do porto seria o escoamento da produção de minério oriunda do estado de Minas Gerais, nesse caso o projeto incluía também a construção do mineroduto. (PEREIRA, 2018) O sistema chamado de  “Minas-Rio” integra a exploração do minério em Conceição de Mato Dentro-MG ao porto no município de  São João da Barra-RJ, no total o duto atravessa 32 municípios, com 525 km de extensão (COSTA, 2018). Assim o mineroduto em ligação com o porto, visava atender a demanda à época para o escoamento da produção de minério para o mercado mundial.

O cenário favorável tanto do ponto de vista interno quanto externo, produziu a valorização do projeto inicial. Esse contexto atraiu investidores estrangeiros e em 2007, o grupo Anglo-American em um negócio estimado em R$ 6 bilhões adquiriu o mineroduto e   possibilitou a expansão do projeto inicial (MORAES, 2017).  Logo o Porto se tornaria um novo empreendimento, o Complexo Portuário e Logístico do Açu (CLIPA).

Nessa nova etapa o CLIPA, assumiu a característica estruturais típicas dos portos mais modernos na atual dinâmica de circulação de mercadorias ao nível mundial. Trata-se da tipologia Maritime Industrial Development Areas (MIDAS), essa configuração mais moderna apresenta além do porto que possibilita a atracação dos navios mais modernos, exige também  a demanda de uma retro área que comporte o estoque de cargas e indústrias. Para São João da Barra a mudança resultou na criação do Distrito Industrial de São João da Barra.

Com a ampliação do empreendimento aumenta-se a demanda por uso dos solos. Assim, o processo de desapropriação das áreas do 5º Distrito do Município de São João da Barra é intensificado. Em levantamento realizado por Assad (2019) consta que no período que compreende os anos 2003 a 2016, houve 29 Atos legais, com  Decretos e Leis que dispunham sobre as terras ligadas ao projeto. No total o CLIPA, a Reserva Ambiental administrada pelo empreendimento e a Vila Terra, local de reassentamento de alguns dos desapropriados, corresponde a 40% do município de São João da Barra.

Somente no 5º Distrito de São João da Barra onde se localiza o empreendimento 1.500 famílias foram desapropriadas em prol do CLIPA. Os moradores da região questionaram todo o processo de desapropriação em dois sentidos: o primeiro, denunciando os valores ou mesmo a falta de indenização pelas terras; o segundo, que reivindicava a devolução imediata das terras através do cancelamentos dos Decretos judicialmente. No processo de implantação do Porto coube então ao Estado o papel essencial, como possuidor do monopólio da violência e responsável por definir os limites da legalidade.

Cezário (2021), identifica que o  processo de implantação do porto em São João da Barra foi realizado utilizando mecanismos de violência econômica. Tal processo representa o aprofundamento social do capitalismo, ao mesmo tempo que apresenta uma importante contradição desse modo de produção.  Os agricultores atingidos pelas desapropriações perderam o seu meio de vida e reprodução social, nesse processo uma parte desses foi deslocada para o mercado de trabalho e muitas vezes em condições precárias (ALMEIDA e CRUZ, 2021).

O processo de desapropriações contribui para a reflexão em torno do valor de uso e valor da terra. A retirada dos agricultores afeta diretamente a forma de uso daquela terra, atualmente elas pertencem à empresa que controla o Porto do Açu, Prumo Logística Global, cobrando aluguel pelo seu uso e rendendo anualmente cerca de R$150 milhões (VILANI et.al, 2021).

O cenário atual da Região Geográfica Imediata de Campos dos Goytacazes exige a reflexão sobre os efeitos dos Grandes Investimentos nos locais onde são inseridos, sobretudo quando os empreendimentos têm por objetivo a efetivação de atividades de extração de recursos naturais. Essa realidade impõe uma série de desafios à região que muitas vezes estão atrelados a interesses que ultrapassam as fronteiras regionais.

 

CONCLUSÃO

A instalação dos GI’s e atuação dos empreendimentos  na Região Geográfica Imediata de Campos dos Goytacazes se apresenta como um movimento típico da dinâmica contemporânea de acumulação do capitalismo. Desde as  estratégias para a realização do empreendimento, envolvendo a espoliação da terra dos moradores locais a partir do próprio Estado, até as suas contradições, onde de um lado vê-se a expansão do capitalismo com um novo empreendimento e de outro a geração de perdas sociais.

Nesse sentido, o conceito de neoextrativismo contribui para expor a forma de atuação do Estado no início do século XXI, atuando como um facilitador para o mercado. Essa realidade  é típica da forma de realização de desenvolvimento econômico na América Latina, diretamente atrelado ao sucesso das atividades de extração de recursos naturais e reacendendo o debate sobre a produção de enclaves econômicos.  Portanto, a exploração e produção de petróleo na Bacia de Campos e o CLIPA são típicas atividades que compõem a discussão do neoextrativismo. Mesmo que a exploração de recursos naturais não ocorra no território, pois o petróleo é extraído no mar e o minério tem origem em Minas Gerais, a região ainda assim  tem nas rendas petrolíferas e nas atividades portuárias a dependência das atividades de extração.

A inserção dessas atividades provoca efeitos significativos nas estruturas econômicas, sociais e políticas da Região. Se de um lado os empreendimentos produzem um volume de receitas que beneficia os municípios, de outro promove uma série de desafios em torno dos conflitos desencadeados, como o deslocamento forçado, a mobilização do uso do solo, a transformação na estrutura urbana e de transporte local.

 

 

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Alberto Torres: Um intelectual

Jordy Portal Alves

Jordy Portal Alves, Graduando do curso de Bacharelado em História do Instituto de Ciências da Sociedade e  Desenvolvimento Regional da UFF/Campos dos Goytacazes.

E-mail: jordypa@idd.uff.br

 

Alberto Torres: Um intelectual

 

Jordy Portal Alves

 

Resumo:

A pesquisa sobre a ação social dos intelectuais ainda não está em alta nos meios acadêmicos, principalmente dos intelectuais brasileiros. Em vista do surgimento de novas formas de estudos sobre as influências do intelectual na sociedade, o objetivo do nosso trabalho é mostrar como é a ação dos intelectuais na organização de movimentos sociais. Nesse sentido apresentaremos Alberto Torres como um intelectual que influenciou intelectuais durante sua vida e principalmente após sua morte. Analisaremos a ação social dos intelectuais usando conceitos de dois autores: Sirinelli e Gramsci. Nesse sentido, no presente artigo trazemos algumas propostas para efetuar melhores análises da ação dos intelectuais numa sociedade.

 

Palavras-chave: Alberto Torres. A organização nacional. Intelectual. Sociabilidade. Bloco histórico   

 

Abstract

Research on the social action of intellectuals is still not on the rise in academic circles, especially among Brazilian intellectuals. In view of the emergence of new forms of studies on the influences of the intellectual in society, the objective of our work is to show how the action of intellectuals in the organization of social movements is. In this sense, we will present Alberto Torres as an intellectual who influenced intellectuals during his life and especially after his death. We will analyze the social action of intellectuals using concepts from two authors Sirineli and Gramsci. In this sense, in this article we bring some proposals to carry out better analyzes of the action of intellectuals in a society.

 

Keywords: Alberto Torres. The national organization. Intellectual. Sociability. historic block

Introdução

Não é possível analisar qualquer objeto fora de seu contexto. A análise do presente trabalho é a relação do personagem histórico Aberto Torres com seu tempo de vida e após sua morte. Faremos uma análise de como este autor influenciou o pensamento do início da república brasileira e, também, em gerações nacionalistas posteriores a sua morte. Para isso focaremos em sua obra A organização Nacional escrita como uma insatisfação com a constituição de 1891. Assim, começaremos nossa análise efetuando uma breve apresentação da biografia de Alberto Torres.

 

Biografia:

Alberto Seixas Martins Torres nasceu em 26 de novembro de 1865, em Porto de Caixas, município de São João de Itaboraí, Rio de Janeiro. De família da burguesia agrária, seu pai, Manuel Martins Torres, era um influente magistrado e juiz de direito, tendo militado na política fluminense.

Ele estudou em colégios cariocas e ingressou com menos de 15 anos na Faculdade de Medicina, e aos 17 anos matriculou-se, em 1882, na Faculdade de Direito de São Paulo. Na faculdade em São Paulo encontrou um ambiente muito influenciado por ideais abolicionistas e republicanos, que rapidamente o contagiou sua forma de perceber o mundo. Em 1885, após problemas durante a faculdade em São Paulo com o professor de Direito Criminal, transfere-se para a Faculdade de Direito do Recife, juntamente com outros estudantes.

Após a conclusão do curso em Recife, Alberto Torres retorna ao Rio de Janeiro onde se dedica principalmente ao jornalismo e à política, exercendo a advocacia eventualmente. No Rio de Janeiro, Alberto Torres ficou cada vez mais envolvido com a propaganda republicana e abolicionista, e se aproximou muito em 1888, ao grupo de Silva Jardim, que ele auxiliou a organizar o Partido Republicano Fluminense.

Assim, após a mudança no regime, Alberto Torres inicia sua carreira política, exercendo os cargos de constituinte e deputado estadual no Rio de Janeiro (1892 – 1893) e em seguida deputado federal (1894 – 1896), posto a qual renuncia após sua nomeação como Ministro da Justiça e Negócios Interiores, pelo presidente Prudente de Moraes. É eleito então Presidente do Estado do Rio de Janeiro (1897 – 1900).

A organização nacional:

Alberto Torres escreveu A organização nacional devido a desilusões com a constituição de 1891. Como observamos na dissertação de mestrado de Silvia Oliveira Campos de Pinho sobre o Alberto Torres, o texto A organização nacional foi um texto escrito devido a discordâncias com a constituição de 1891. O autor faz críticas à constituição principalmente na questão do regime vigente no Brasil ser importado de nações estrangeiras sem ter influência em questões concretas nacionais brasileiras. A partir dessa análise Alberto Torres conclui que a constituição seria impraticável devido a esse problema.

Sua crítica é principalmente baseada na tese de que não há uma harmonia da realidade brasileira com o texto da constituição. Como observamos no texto A organização nacional, as críticas vão desde o federalismo à educação. Vemos as seguintes conclusões durante o texto: o regime federativo não poderia deixar de existir, porém, a união deve ser soberana e os estados devem ser autônomos; os interesses nacionais devem prevalecer acima dos interesses locais; o país tem o dever de promover a educação aos brasileiros para que eles sejam racionais e críticos para criar uma república harmônica com a sociedade. Assim, o texto A organização nacional foi escrito em um momento histórico de desilusão com a recente república brasileira.

Alberto Torres escreve esse livro em um ambiente onde existia muita decepção com a república brasileira, ele não seria o único intelectual da época que elaborava críticas à constituição e mesmo aos governos republicanos da época. Assim, podemos concluir que todas as ideias do autor são filhas do seu tempo, da mesma forma que o próprio autor.

Alberto Torres, um intelectual:

Como tratar Alberto Torres como intelectual? Essa é a principal questão do presente trabalho. Como observamos na breve biografia e no breve resumo de uma das obras do autor, podemos então analisar suas ideias e sua história sem tirar o autor de seu contexto, ou como diria Gramsci sem tirá-lo do bloco histórico. Dessa forma o objetivo do trabalho é mostrar como Alberto Torres é um intelectual que influenciou muitos em vida e após sua morte através de suas ideias para modificar a sociedade que vive.

Para analisar Alberto Torres seguindo principalmente as ideias de Gramsci e Sirinelli, vamos primeiro definir os conceitos de Gramsci de bloco histórico, intelectual orgânico, hegemonia e sociedade civil, além disso, definiremos os conceitos de  itinerário, sociabilidade e gerações de Sirinelli.

Com os conceitos de Gramsci e Sirinelli é possível explicar as relações que Alberto Torres tinha com seu momento histórico e como ele influenciou intelectuais posteriores com suas ideias descritas em uma das suas obras “A organização nacional”. Antes de falar especificamente de Alberto Torres definiremos os conceitos de Gramsci e Sirinelli.

Para começar a falar dos conceitos de Gramsci é preciso definir o principal conceito que utilizaremos aqui, o intelectual orgânico, porém, é preciso realizar uma breve definição dos outros conceitos mencionados acima. O intelectual orgânico é aquele agente que surge na mudança de bloco histórico em busca de hegemonia na sociedade civil e na sociedade política. O bloco histórico em Gramsci é entendido como momento histórico em que aquele intelectual está, já o conceito de sociedade civil são as instituições criadas para divulgar as ideias da classe dominante, já a sociedade política são as instituições coercitivas.

Para Sirinelli o estudo dos intelectuais deve principalmente analisar sua ação por meio de três conceitos: o itinerário, a sociabilidade e as gerações. O conceito itinerário é para identificar as influências ideológicas do intelectual estudado. O segundo ponto que se deve ter a atenção é o conceito de sociabilidade que serve para mapear em qual grupo o intelectual está engajado, seguindo o exemplo do autor, em qual revista ele escreve a favor e qual ele escreve contra. O conceito de geração é para analisar como essas ideias são transmitidas às gerações do grupo que ele pertence e outros grupos, seja para romper ou continuar.

A partir disso podemos analisar a biografia e a obra de Alberto Torres, através dos conceitos de Gramsci e Sirinelli. Para começar precisamos retornar a biografia para dizer que Alberto Torres é de família burguesa agrária, militou pelo republicanismo e pela abolição. Isso já dá um início para entender de onde ele vem, outra questão inicial é saber suas influências ideológicas, como observamos na dissertação de Silvia Pinho, Alberto Torres foi influenciado pela geração de 1870 como podemos ver nesse trecho:

“Acreditamos que Alberto Torres foi bastante influenciado pela geração de 1870. O ideário da geração de Silvio Romero apresenta grandes semelhanças com aquele esposado por Torres, como em seu cientificismo, laicismo, evolucionismo, a presença de Haeckel, o seu engajamento político, sua busca de pensar a nação e sua ênfase na necessidade de ação.” (Pinho, 2007, pp 82)

Todo o pensamento de Alberto Torres foi influenciado por essa geração republicana que contribui para o crescente sentimento de mudança. Esse sentimento foi crescente no final da monarquia e começo da república, isso possibilitou o surgimento de diversos intelectuais apoiando a mudança de regime, como o próprio Alberto Torres. Como observamos, o conceito de Gramsci de intelectual orgânico é aquele agente de mudança que serve de apoio para a classe hegemônica. Apesar de não ocorrer a mudança de classe hegemônica no contexto da queda do império para início da república, Alberto Torres propõe mudanças importantes para seu contexto.

Nesse sentido, Alberto Torres é um intelectual orgânico na perspectiva de um agente de mudança que representa uma classe que busca ser hegemônica, porém como observamos na biografia do intelectual ele faz parte da mesma classe que possui hegemonia no final do império e início da república. Esse segundo ponto abre muitas questões sobre se ele realmente é um intelectual orgânico ou não. Como vemos em Gramsci ele não atribui o ser intelectual às grandes mudanças na superestrutura, ele tenta evidenciar como a sociedade civil serve como suporte para a hegemonia de uma classe dirigente. Nesse sentido, Alberto Torres é um intelectual orgânico que militou pelo republicanismo e abolicionismo durante a monarquia, e durante a república elaborou críticas ao governo republicano e à constituição de 1891, como vimos em sua obra “A organização nacional”.

O outro ponto importante aqui é o grupo intelectual que ele participava, a sociabilidade de Sirinelli. Como observamos na dissertação de Silvia Pinho, Alberto Torres se envolveu com o republicanismo e o movimento abolicionista, além disso, juntou-se ao grupo de Silva Jardim em 1888, ajudando a fundar o Partido Republicano Fluminense. Após a mudança de regime ele exerceu diversos cargos públicos, como deputado constituinte, deputado federal e deputado estadual.

A influência de Alberto Torres foi sentida principalmente após sua morte. Enquanto ele era vivo era importante, contudo após sua morte ele foi importantíssimo para as gerações de 1920 e 1930, principalmente por sua preocupação com a unidade nacional e nacionalismo. Tivemos admiradores de Alberto Torres representados nessas gerações como, Plínio Salgado, Oliveira Viana, Cândido Motta Filho, porém tivemos representantes contrários a Alberto Torres como Alceu Amoroso Lima.

Assim, podemos afirmar que Alberto Torres foi um intelectual orgânico que visou modificar sua realidade tanto escrevendo, na militância, quanto na ação direta nas instituições estabelecidas. Como vimos neste trabalho ele fazia parte da classe dirigente do final do império e início da república, porém, mesmo fazendo parte ele propôs mudanças importantes que iria contra os interesses de alguns da mesma classe que ele, isso fica claro na sua obra A organização nacional.

 

Considerações Finais

 

A partir de tudo que foi exposto aqui podemos dizer que Alberto Torres foi um intelectual que atuou em diversas frentes para divulgar suas ideias com a intenção de mudar a realidade. Através dos conceitos de Sirinelli e Gramsci vimos como foi sua relação com seu tempo e com outros atores enquanto estava vivo, e também, depois da sua morte. Nesse sentido podemos dizer que Alberto Torres foi criado por todo o meio que estava inserido, além disso, foi ativo contribuindo para algumas mudanças em vida e também contribuiu para mudanças depois de sua morte.

Referências

TORRES, Alberto. A organização nacional. Companhia Editora Nacional, 1982.

DE PINHO, Silvia Oliveira Campos. Alberto Torres: uma obra, várias leituras. 2007.

SIRINELLI, Jean-François. Os intelectuais. Por uma história política, v. 2, p. 231-269, 2003.

PEDREIRA FILHO, Waldemar S. Os intelectuais e a organização da cultura. 1977.

CARNEIRO. Márcia Regina da Silva Ramos. “Do sigma ao sigma – entre a anta, a águia, o leão e o galo –        a construção de memórias integralistas”. Tese apresentada ao Curso de Pós-Graduação em História da Universidade Federal Fluminense,Niterói: UFF, 2007.

GVCULT. Antonio Gramsci e o bloco histórico… – Veja mais em https://gvcult.blogosfera.uol.com.br/2020/08/18/antonio-gramsci. Disponível em: https://gvcult.blogosfera.uol.com.br/2020/08/18/antonio-gramsci. Acesso em: 30 jun. 2023