Desde sempre, os organismos vivos saem de lugares em que os alimentos tornam-se escassos, o clima inóspito, o espaço insuficiente, ou outras espécies mais fortes ou agressivas ameaçam sua sobrevivência; o instinto de autopreservação é fundamental para todos os seres e inclui esse impulso.
Nós humanos não somos exceção, e adicionamos a isso componentes culturais. Nosso continente, e mais especificamente nosso país, foi povoado essencialmente por imigrantes, mesmo os indígenas que aqui estavam quando chegaram os primeiros europeus não são autóctones, vieram da Ásia em milênios anteriores.
A questão migratória torna-se cada vez mais premente na área educacional, principalmente em cursos de Direito, sendo essencial a compreensão da necessidade de legislação mais flexível em seu trato.
Segundo o professor Dr. Javier de Lucas, da Universidade de Valencia (Espanha) e muitos outros pensadores da área, com ou sem crise estes movimentos continuarão, e as dificuldades de ordem econômica, cultural e ideológica não devem impedir que migrantes, e suas respectivas famílias, possam vir a constituir um fator de desenvolvimento aos países ou regiões que os recebem.
Mas esta é uma área conflagrada, onde profundos preconceitos e comportamentos discriminatórios impedem a distinção entre o estabelecimento efetivo de boas políticas migratórias, e a simples utilização do assunto como projeto eleitoreiro em épocas de belos discursos para angariar votos.
A discussão parece centrar-se no migrante qualificado, ou seja, aquele que exerce funções voltadas à ciência, tecnologia ou empreendimentos de grande porte, que na maior parte das vezes provem de parcelas mais esclarecidas da população de origem, recebe melhores salários e tem plena consciência de seus direitos.
Na outra ponta da questão temos aqueles que, muitas vezes refugiados de imensas catástrofes – pobreza extrema é uma delas -, contribuem no setor de limpeza, serviços pesados ou indesejados pela comunidade que os recebe, normalmente a contragosto e, no caso de estrangeiros, negando-lhes documentação.
Manter trabalhadores em situação de fragilidade, além de desumano, pode representar uma forma indevida de enriquecimento para os contratantes, e em função disso os códigos legislativos costumam, de forma velada e com a desculpa de preservar os empregos para os “nativos”, manter precária a situação destes imigrantes, criando um estatuto jurídico e político que os alija das normas e princípios comuns do Estado de Direito.
Essa prática tem, ainda, o agravante de diminuir as vagas de trabalho em setores nos quais atuam os estrangeiros ilegais, para os trabalhadores menos qualificados do país receptor, pois há empregadores que preferem aqueles sem documentação correta e, portanto, com menos prerrogativas.
Pensadoras feministas consideram a situação das mulheres nestas circunstâncias ainda mais aflitiva, pois expostas à violência sexual além da maior penúria, dado que comprovadamente mulheres enviam mais dinheiro que os homens às suas respectivas famílias, além de estarem disponíveis para os trabalhos mais humilhantes.
Como na maioria das populações de baixa renda, as imigrantes assumem ainda os cuidados domésticos, de crianças ou de doentes, dando às vezes importante suporte para o trabalho da população masculina, sem qualquer remuneração e em condição de invisibilidade perante as leis do país.
Não faria sentido em um mundo ideal falar em fronteiras ou tratar a imigração como um problema; como habitamos o mundo real precisamos respeitar os limites físicos estabelecidos pelos vários estados nacionais e tratar a questão dos deslocamentos populacionais, individuais ou coletivos, a partir desses limites e das legislações pertinentes. No entanto, a questão é se, efetivamente, essas legislações são adequadas.