As pessoas me dizem que eu devo escrever coisas boas de se ouvir. Que devo escrever para inspirar, ou para ensinar como se deve levar, viver a vida.
Eu não acho. Não acho que os escritores sirvam para isso. A despeito do quanto o atual politicamente correto dite o tema. E antes deste politicamente correto que aí está, outros.
A escrita reflete o que a gente é. Para mim ela é tanto melhor quanto mais corresponda ao real, ainda que este real soe aos ouvidos assustador, melancólico, desprezível, ou arrebatador.
Não sei se sou minoria nesta hoje. Também não me importa isso.
Por isso hoje vou falar de solidão.
A solidão que todos tememos. Que todos evitamos, ou procuramos evitar, correndo de um lado para outro sem parar um instante. Vários barulhos ao mesmo tempo, a televisão, o celular, o microondas, os carros que passam, o cachorro, a britadeira, para não ouvir o silêncio.
A solidão que, como a vida, como os escritos e os escritores, não é ideal, mas real.
A solidão que acomete os solitários, mas também os que têm companhia.
A solidão que nos conecta com o interno (sabendo dela fazer uso), mas que em dias de fragilidade faz pensar que todos são felizes, exceto quem está só.
Sou uma solitária contraditória, do tipo de pessoa que precisa da solidão, mas também sofre com ela.
Autoconceitos da infância que não foram desfeitos e calcificam na personalidade como certezas (sem serem).
Tenho pena de quem não tem companhia. Principalmente dos que não podem se mover, porque a natureza é uma inigualável aplacadora de solidões, e andar na areia da praia, sentar de frente para um descampado, nadar em água salgada ou num rio de águas correntes, purifica o coração.
Mas também tenho pena de quem não pode ficar um minuto consigo, na paz do lar, entre afazeres rotineiros, sem grandes expectativas.
Por fim, tenho pena de todos. Porque esta senhora não preserva ninguém, é parte de ser humano, incompleto, cheio de dúvidas, de medos, de esperanças.
Meu terceiro livro (em preparação) está cheio de dor. Foi feito de lágrimas. Lágrimas d’alma. Não para serem julgadas, nem pra acabar com o dia das pessoas, com o pensamento positivo propagado como a trilha para a felicidade a ser religiosamente seguida , e que um mais breve pensamento derrotista pode desfazer. Escrevi-as apenas para, qual as inverdades da rejeição instalada em mim nos tenros anos, não se transformem em degraus para a doença ou o suicídio.
Entendam-me se escrevo sobre a dor de ser só, de sentir solidão, perceber o vazio. Não desejo o que escrevo a ninguém. Também não quero contaminar quem quer que seja com ideias negativas. Quero só que minhas palavras sirvam às emoções “desumanas” que ora ou outra nos assolam. E que quem, por acaso se sinta, ainda que por alguns instantes, no mesmo harém de revez, venha saber que não está sozinho, e que ele é passageiro, como tudo o mais que existe.
Vamos de poema?
“os ricos não são bons para os ricos
os pobres não são bons para os pobres
estamos com medo.
nosso sistema educacional nos diz que
podemos ser todos
grandes vencedores.
eles não nos contaram
a respeito das misérias
ou dos suicídios.
ou do terror de uma pessoa
sofrendo sozinha
num lugar qualquer
intocada
incomunicável
regando uma planta.
(…)”
(O estouro, de Charles Bukowski – O amor é um cão dos diabos)
Ouça esta canção e entenda com o coração o que não está dito.