“O pertencimento e a identidade não possuem a solidez perpétua, mas sim a finitude de um mecanismo que exerce um poder de transformação contínua. As identidades estão em constante trânsito, provenientes de diversas fontes, quais sejam aquelas disponibilizadas por terceiros ou acessíveis através de nossa própria escolha”. (Zigmunt Bauman)
O que nos define? O que nos classifica, de fato? E, isto é realmente necessário? Quatro atrizes em cena, quatro mulheres em busca de um corpo, de um lugar e de um sentido. Como explicar o não pertencimento, o não estar presente, a não identificação com o lugar e a realidade?
“Daquilo de que os outros não sabem sobre mim, disso eu vivo”, assim começa a outra obra que serviu de referência ao projeto, o livro A Sociedade da Transparência do filósofo sul-coreano Byung-Chul Han. A frase é de Paul Handke. De acordo com o escritor, a obsessão com a transparência manifesta-se não quando se procura a confiança, mas quando esta desapareceu e a sociedade aposta na vigilância e no controle. Outra fonte de inspiração foi o filme Uma Vida Iluminada (2005), de Liev Schreiber, um road movie que mostra a trajetória de Jonathan, um judeu norte-americano colecionador de coisas que sai em busca da mulher que pode ter salvado seu avô dos nazistas, na Ucrânia.
O longa emociona pela delicadeza com que trata a busca do passado para entender o presente, a procura das origens da família para compreender a própria história, e a amizade possível entre pessoas de culturas diferentes. Fala sobre o Holocausto e é marcado pela alternância entre tensão e conciliação das diferenças, abertura e fechamento ao outro, exibindo as nuances dos vínculos formados a partir deste encontro.
“O ponto de vista do nosso olhar é estrangeiro, de estranhamento. Abordamos o sentimento de não pertencimento seja individual ou coletivo. Falamos sobre situações simples da vida, em que nos sentimos “estrangeiras”, em nosso próprio país, cidade, casa e até mesmo em nosso corpo”, conta a atriz e produtora do projeto Marcilene Moraes, criadora da Crisálida Companhia de Arte.
“Acho que é muito pertinente falar sobre esse assunto neste momento onde se vê o drama de milhares de imigrantes refugiados no mundo e os conflitos recentes por conta de intolerância de raças, religião, ideologias e gêneros em nosso país”, ressalta. A Companhia criada em 2012, tem como foco a linguagem contemporânea e visa agregar artistas/parceiros que contemplem o experimento e a pesquisa, pensando o hibridismo das artes.
Além de Marcilene, compõem o elenco: Cléo Cavalcantty, Edith de Camargo e Karla Fragoso. A direção e a dramaturgia é de Rafael Camargo que propõe uma encenação contida, resultado da pesquisa que desenvolve há mais de uma década sobre o teatro da inação. “As estrangeiras curiosamente perguntam, poeticamente questionam, humanamente percebem a dificuldade de ser e estar. De certa forma falamos sobre solidão”, adverte o diretor.
“São mulheres atemporais e seus não lugares em cena. As repetições de diálogos, a circularidade dos pensamentos, a investigação das estruturas corporais, desenham a forma e imprimem a consciência deste não lugar”, complementa.
FOTOS: Elenize Dezgeniski
Serviço:
Espetáculo ESTRANGEIRAS– Crisálida Companhia de Arte
Quando: 25 de abril a 26 de maio (quinta a domingo)
Que horas: de quinta a sábado, às 20h aos domingos, às 19h
Onde: Espaço Obragem (Alameda Júlia da Costa, 204 – São Francisco)
Duração: 50 minutos
Classificação: 16 anos
Quanto: R$ 20 / R$10 (meia entrada)
Capacidade máxima: 30 pessoas
Informações: 41 3077 0293
Ficha Técnica:
Elenco: Cléo Cavalcantty, Edith de Camargo, Karla Fragoso e Marcilene Moraes
Direção, cenário e dramaturgia: Rafael Camargo
Direção de Produção: Marcilene Moraes
Assistente de Produção: Ricardo Maleh
Figurino: Karla Fragoso
Adereço e ilustração: Katia Horn
Cenotécnico: Henrique Horn
Iluminação: Wagner Correa
Direção de movimento: Ayrton Rodrigues
Designer Gráfico: Alessandra Horn
Vídeo Mapping: Manolo Fraga
Realização: Crisálida Cia de Arte