Amizade…

Ela sabia que ele era bom. Intuíra desde o início, quando ele chegou com seu carro velho, com suas malas desgastadas e apossou-se da casa em frente à dela. Por coincidência, ela estava limpando o quintal, arrancando as ervas daninhas que insistiam em crescer por entre os tufos de grama. Antes de entrar na casa, ele viera até ela e com uma voz musical, a saudara: – Boa tarde! E ele sorriu pela primeira vez. Ela viu seu sorriso perfeito e os dentes brancos, alinhados e bonitos apareceram. O sorriso era lindo e imediatamente ela se sentiu atraída por ele. Era um homem bonito, não havia dúvida. Os cabelos castanhos brilhavam ao sol e os olhos eram enormes, límpidos, quase verdes.  Não era alto nem musculoso, mas era uma homem muito atraente. Havia algo nele que remetia a um tempo muito antigo, quando os homens saíam para caçar e voltavam suados, com um animal abatido sobre os ombros, trazendo o alimento para os que esperavam com fome.

 

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– Boa tarde – ela respondeu, entre desconfiada e feliz, porque não é sempre que um homem bonito e sorridente vem até você, do nada e lhe cumprimenta.

Ele então disse que havia alugado a casa em frente e perguntou se a vizinhança era calma, se o bairro era violento e muitas outras coisas que se pergunta quando se chega a um lugar novo. Ela sentiu prazer na companhia dele e naquela rápida conversa viu que ele era um homem bom. Ao mesmo tempo, tristemente constatou que não poderia haver amor entre eles, porque haviam selado, quase que imediatamente e sem nada falarem, um pacto de amizade. Era como se fossem conhecidos há muito tempo e um sentimento familiar apossou-se dela, um sentimento de profunda amizade.

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Ela era uma mulher solitária. Ele percebeu isso imediatamente, assim que a vira, arrancando o mato da grama. Era uma moça magra e delicada, os cabelos curtos, tão curtos que se não fosse pela roupa, ele juraria que ela era um rapaz. Ela respondera timidamente ao seu cumprimento e quando levantara os olhos para ele, num relance, ele viu a imensa solidão que havia neles. Ela respondeu a todas as perguntas que ele havia feito,  foi gentil e solícita, mas tinha dentro de si um quê de tristeza e amargura. Sim, ela era uma mulher muito solitária. Era educada e agradável, mas distante. É bonita – pensou ele, olhando-a disfarçadamente. Havia algo nela que lembrava as mulheres de uma era passada, mulheres guerreiras e corajosas, que poderiam até matar para defender seus filhos. Ele se sentiu atraído por ela, pela sua feminilidade quase escondida, apenas sugerida pela boca bem desenhada e pelos longos cílios. Um sentimento de tristeza tomou conta dele quase sem querer pois sentiu que nada poderia acontecer entre eles, a não ser uma profunda amizade. É que percebera que de imediato, selaram um pacto de amizade. Não, não poderia haver amor entre eles. Um sentimento estranho e conhecido tomou conta dele, um sentimento de amizade. Talvez porque entre certas pessoas, não pode haver amor. Apenas amizade.

 

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*Imagens retiradas da Internet, sem fins lucrativos.

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Vanisse Simone Alves Corrêa é Doutora em Educação pela UFPR e professora adjunta da UNESPAR - EMBAP no curso de Licenciatura em Artes Visuais.

One Comment

  1. Afonso Guerra-Baião disse:

    Lindo texto, escrito com fina sensibilidade, deixando em aberto os motivos da opção do personagem pela amizade ao invés do amor. Parabéns!

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