Victória Tupini Pereira
Técnica em Turismo com ênfase em Guia de Turismo pelo IFF-campus Itaperuna; Licencianda em História pela UFF-ESR. Foi bolsista IC/CNPq na Casa de Cultura Villa Maria/UENF com ênfase em acervo fonográfico. Bolsista na Unidade Experimental de Som e Imagem/UENF, onde é assistente de produção do documentário Manifesto do Samba por Jorge da Paz (UESI/GEPMU/UENF). Membro do Laboratório das Direitas e do Autoritarismo (LEDA) e do Laboratório da Imanência e Transcendência (LEIT) da UFF-ESR, vinculada ao projeto Museu Volante. Possui pesquisa na área de história da mídia, da indústria cultural e História Pública.
O curioso caso da radiodifusão campista
Victória Tupini Pereira
Para quem nasceu e cresceu no interior do estado do Rio de Janeiro, a relação com a circulação das informações sempre foi clara: se você não acompanha a programação estritamente local, a imagem que fica é que o estado do Rio de Janeiro se resume à cidade do Rio de Janeiro e área metropolitana. Se tornou costumeiro falar que mora no Rio de Janeiro e logo perguntarem “em que bairro?”. Boa parte disso se deve à uma sublocação do que chamamos de interior. Esse interior não necessariamente precisa estar longe do litoral. No dicionário, interior significa interno; que está na parte de dentro. Mas nas concepções produzidas por instituições oficiais e reproduzidas pelos setores midiáticos, localizados nas capitais, interior pode ser entendido o que não está nas grandes metrópoles, ou até o que não aparece com frequência nas notícias midiáticas.
Também somos levados a pensar que essa falta de relevância atribuída ao “interior” advém das atividades econômicas relacionadas à vida interiorana, geralmente associadas à vida rural, como “ritmo lento da vida”. Contudo, adentrando as pesquisas que circulam sobre mídia regional, podemos perceber que tratar o assunto com a palavra “falta” por vezes esvazia a relação centro-interior.
Com o objetivo de compreender um distanciamento distintivo entre Centro e Interior com base numa relação que pressupõe uma ótica de acesso aos conhecimentos e informações atualizadas, mergulhamos em pesquisas que por fim geraram esse artigo. Desde já apontamos que a abordagem da centralidade não está na falta, e sim no escasso diálogo científico sobre as memórias sociais advindas de um apagamento das pesquisas históricas sobre o que partem do interior, como se nos restasse somente a emoção e não a razão científica no tratamento das Memórias coletivas.
A inquietação
A pesquisa que abordamos aqui parte do acervo da Casa de Cultura Villa Maria, Centro Cultural da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF), a qual possui entre seus tantos arquivos, um vasto acervo fonográfico – discos de acetato, discos de vinil, fitas K-7, CDs e afins – que subsidiam pesquisas sobre a história da cidade de Campos dos Goytacazes/RJ. Nossa fonte principal foi o Fundo Amador Pinheiro da Silva. O fundo reúne cerca de 1835 discos de acetato catalogados de 78 rpm, sendo 1508 já digitalizados, que vão desde clássicos da música erudita europeia, como Chopin, Bach, Beethoven à discos genuinamente brasileiros – samba, choro – e latinos – maxixe, bolero, valsa -, descritos no catálogo com diferentes gêneros musicais, incluindo de compositores e cantores campistas.
O catálogo do Acervo Amador Pinheiro da Silva, foi nossa primeira fonte de pesquisa sobre a musicalidade que circulava no interior do estado do Rio de Janeiro, descrevendo os gêneros musicais praticamente de forma própria e não segue as atuais regras do sistema arquivista, o motivo é a datação do acervo, 1992. Nem todos os gêneros apresentados estão contidos no acervo em análise. Pela nossa contagem, a maioria esmagadora – aproximadamente 1400 discos – são de música erudita estrangeira (MEE). Dentre os distribuidores de discos MEE, aparece a empresa RCA Victor LTDA, que comentaremos adiante. Os gêneros musicais que mais chamaram a atenção foram: MEB – música erudita brasileira; MPB – música popular brasileira; MEFB – música étnica e folclórica brasileira; MEFE – música étnica e folclórica estrangeira; e MEFLA – música étnica e folclórica latino-americana. Vicente Rangel Jr., em seu livro Recortes da Memória Musical de Campos (1839- 1965) discorre em várias partes do livro a criação de novos gêneros musicais vindas e criadas a partir da mescla e tomada de referências da circularidade musical. Um exemplo disso é a Foxtrote, Fox-blue, presentes na categoria de música popular brasileira e latino-americana.
A partir desse tesouro da arte fonográfica, iniciamos a pesquisa sobre a criação dessa coleção: quem a construiu, por qual motivo, em que tempo, com que meios, para que. Amador Pinheiro da Silva, nome que batiza o fundo foi o seu proprietário. Este homem é descrito no livro Caju, de Oswaldo de Andrade, como morador da avenida XV de novembro, beira rio, em Campos dos Goytacazes, antigo alfaiate e amante de música. Amador junto à um grupo, foi fundador da Rádio Cultura de Campos, primeira emissora de rádio do estado do Rio de Janeiro, na década de 1930, quando a cidade do Rio de Janeiro ainda era capital do país. Para sanar as dúvidas sobre a ligação do acervo com a Rádio Cultura decidimos mergulhar a fundo na história da radiodifusão e seus impactos.
A questão é que, ainda na década de 1920 o rádio chega ao Brasil como um símbolo modernizador e civilizatório. Diferentemente da mídia impressa, o rádio tem o poder de adentrar na vida das pessoas com facilidade, afinal vivemos em um país onde o índice de analfabetismo ainda é grande nos dias de hoje com todas as políticas públicas construídas para isso, nas primeiras décadas do século passado, essas taxas eram ainda maiores. O rádio, portanto, chega como uma característica pessoal de informação. O historiador Eric Hobsbawm salienta que o rádio foi o primeiro veículo de informação a afetar individualmente.
Tabela I: Criação de emissoras de rádio (1923-1940)
Ano de Fundação | 1923 | 1924 | 1925 | 1926 | 1927 | 1928 | 1929 | 1930 | 1931 |
Número de Empresas |
2 |
5 |
3 |
2 |
2 |
2 |
– |
– |
1 |
Ano de Fundação | 1932 | 1933 | 1934 | 1935 | 1936 | 1937 | 1938 | 1939 | 1940 |
Número de Empresas |
– |
5 |
15 |
9 |
8 |
5 |
– |
6 |
10 |
Fonte: IBGE, Anuário estatístico do Brasil- 1941/1945, p.451.
Contudo, ainda era caro levar as emissoras ao ar. Segundo a historiadora Lia Calabre, em seu livro A Era do Rádio, onde disserta sobre os processos de chegada e consolidação da radiodifusão brasileira, inicialmente eram criadas as Sociedades de rádio, um grupo de animadores culturais se reuniam, na maioria das vezes nas suas próprias garagens, juntavam seus discos e iniciavam as sociedades, reuniam notícias, os gêneros musicais a gosto e iniciavam a caminhada econômica e técnica.
A queridinha do rádio: década de 1930 e a visão geral.
A era do rádio definitivamente simboliza novos tempos, em especial, tempos políticos e de interferência na realidade sócio-espacial. Os anos de 1930 trouxe consigo um marco estrutural para o Brasil. As palavras de Lia Calabre nos mostram que o rádio se expandiu em terras brasileiras totalmente afetado pela política do estado vigente. Com a derrubada da república oligárquica, o golpe de 1930 trouxera consigo um quadro visionário para a modernização. Focou-se nas indústrias, na organização sindical e na urbanização, rumo a modernização da sociedade. E pegando gancho com a necessidade de construção da memória nacional oficial, o rádio ganhava um papel fundamental para a consolidação do Estado Novo, e Getúlio Vargas – assim como Cárdenas no México e Perón na Argentina – não pouparia em utilizá-lo.
Em 1932 o que acontecia entre as emissoras foi definida por Antônio Pedro Tota como uma guerra no ar entre emissoras cariocas e paulistas. O estado brasileiro não havia controle sobre o que e como as informações fornecidas circulavam. O movimento denominado Revolução Constitucionalista de 1932, ocorrido em diversos estados do Brasil, mas com enfoque historiográfico maior em São Paulo, que iam de oposição ao governo varguista, foi defendido convictamente pelas principais emissoras da época.
“o rádio previamente instalado, e já adaptado às condições urbanas de massa metropolizada, agora servia como instrumento político manipulado pelo oligarquia que o assumiu como veículo. O rádio foi o primeiro veículo de comunicação a tomar público o início do chamado Movimento Constitucionalista de São Paulo; na sequência, foram ocupadas as estações da Rádio Record e da Rádio Educadora Paulista guarnecidas por metralhadoras.” (TOTA, Antonio Pedro. 1990)
Mas apesar de se manter a gostos e costumes da elite, o rádio enfrentava o paradoxo do estereótipo: uma programação intelectual aos frequentadores marginais (CALABRE, 25). A comunicação pelo rádio se mostrou um criativo e inovador meio de propagação ideológica, pois sua afetação englobou e transformou culturas, a partir do momento em que era expressão prática, organizadora e organizada da sociedade e criou um novo tipo de linguagem informacional. Decretos de 1932, promovidos pelo governo provisório de Vargas, regulamentavam o funcionamento técnico e profissional do rádio e a liberação parcial de propagandas comerciais dos patrocinadores. Contudo, foi a partir de 1937, com a implantação do Estado Novo e seu esquema de censura ditatorial, que o rádio brasileiro se torna fundamental no diálogo governo-sociedade. A criação do Departamento de Imprensa e Propaganda, em 1939, foi o canalizador final para intromissão do Estado no setor cultural.
“criou-se uma política de valorização e elaboração de estratégias para o setor cultural que extrapolavam os níveis puramente políticos. Ao organizar e regulamentar o funcionamento das emissoras de rádio, o governo reservava para si uma fatia desse setor. Já na legislação de 1932 estava prevista a irradiação de um programa nacional que deveria ser retransmitido por todas as emissoras do país – a Hora Nacional.” (CALABRE, Lia, p. 20)
A criação da PRF-7:
Como apresentado acima, a embrionária Sociedade Rádio Cultura tomou corpo e chegou ao ar numa época de fixação da radiodifusão nas culturas brasileiras tanto em termos políticos, mas principalmente artístico. Colocamos culturas, no plural, pois nos propomos a compreender o aparecimento do rádio como veículo de informação tanto sob tutela hegemônica do Estado, quanto luta territorial, especialmente pelas expressões artísticas, sendo base para um novo tipo de sociedade.
“A cultura é definida como um “mundo”, uma “esfera”, um “campo”, uma “estrutura” de atividades realizadas por “camadas” de intelectuais, vale dizer por aquela “massa social que exerce funções organizativas” – para além do campo da cultura – também na “produção” e no “campo político-administrativo” (BARATTA, Giorgio. CULTURA, p. 172)
E sobre a luta hegemônica pelo rádio:
“À medida que o rádio ia se popularizando, passava a sofrer fortes críticas de uma parte da intelectualidade, que insistia em mantê-lo como veículo com fins educativos e divulgador da produção cultural erudita. Grande parte das críticas era dirigida à programação musical, em especial os sambas, marchas e canções, que passavam a dominar as emissoras populares.” (CALABRE, Lia. p 23)
Para concretizar o que até então foi debatido, partiremos da análise da construção de uma emissora de rádio específica e interiorana: a Rádio Cultura de Campos, de prefixo PRF-7.
Localizada no norte do estado do Rio de Janeiro, na região fronteiriça com o Espírito Santo e Minas Gerais, Campos dos Goytacazes sofrera intensas mutações no campo político e econômico do quadro nacional. Pesquisas históricas indicam a importância da cidade durante o período colonial e imperial brasileiro, devido a sua localização geográfica e a economia fluvial pelo rio Paraíba do Sul. Por outro lado, circulam informações de que foi a última cidade do país a se desprender do sistema escravocrata. Entretanto, por se localizar em região interiorana, a relação da cidade com o Brasil e com a historiografia é paradoxal. Por isso a tentativa de perceber o rádio como fenômeno a partir dela. Campos dos Goytacazes nos parece estar entre o que seria uma cidade foco – como o Rio de Janeiro – e os interiores; região tomada por usinas de cana de açúcar. Seu contexto social não se desliga da estrutura do país: famílias hegemônicas, onde os sobrenomes são primordiais até os dias de hoje e, em contrapartida a maioria da população demarcada pela desigualdade econômica e racial.
Por isso nossa proposta é compreender as atuações políticas, regionais, técnicas, artísticas, e sociais da era do rádio a partir do contexto e exemplificada pela Rádio Cultura. Mas também por entender a demanda no campo histórico da cidade. Muito se sabe sobre a influência mercadológica na Rádio Nacional ou da Rádio Mayrik Veiga, afinal, esses são produtos de um centro, mas pouco se discute sobre o processo de interiorização da radiodifusão.
Acompanhando os agitos políticos e técnicos do momento, a Rádio Cultura de Campos se fixou rapidamente na cena cultural campista e regional. Inaugurada em novembro de 1934, sob prefixo PRF-7, a primeira rádio fluminense foi um dos boom culturais da vez. Com sede na rua Conselheiro Octaviano e posteriormente na Av. Pelinca, a rádio contou com o patrocínio da empresa Byngton e CIA, representada pelo radialista Mário Ferraz Sampaio e diretor-geral da PRF-7. Sampaio disserta em seu livro História do Rádio e da Televisão no Brasil e no Mundo, que a primeira intenção era fazer um trabalho de campo em Campos dos Goytacazes e em Vitória/ES para possíveis instalações de transmissores. Campos foi escolhida pois já havia um animado grupo com a chamada Sociedade Rádio Cultura de Campos, orientada por Amador Pinheiro da Silva e seus discos de acetato. Surgiu a todo vapor. No ano seguinte a rádio já contava com a programação ao vivo: uma Orquestra de Salão própria, radionovelas, narração de corridas de cavalos, futebol, concursos musicais e de calouros e um broadcast variado: choro, samba-canção, tango, bolero, valsa, maxixe, entre outros. Com isso influenciador artístico, mas também comercial.
Estudando o jornal O Monitor Campista (1934- 1938) encontramos as programações diárias da Rádio Cultura e observamos que havia um padrão: das 11 às 12 horas programas de discos fornecidos por empresas locais e nacionais – Casa Beda, Campos RCA Victor Ltda, Alfaiataria Forzana, Café Londres e Drogaria Sobral -; a parte da tarde era destinada a programação de radionovelas, narração de esportes, palestras, entre outros; das 19 às 20 horas músicas do broadcast próprio; das 20 às 21 horas a Orquestra da Rádio Cultura se apresentava; das 21 às 22 horas programas gentil e de calouros; das 21 às 22 horas noticiário programa da Rede Verde-Amarela e fazia conexão de transmissão ao vivo com as rádios de São Paulo (a PRB-3 e PRB-6). Na revista Planície, com edições semanais que informavam os entretenimentos campistas, observamos a relação de mercado ao qual encontramos a rádio, onde se faz as propagandas também se vende os produtos ou seja, vende-se um estilo de vida, pois como afirma o radiomaker e pesquisador canadense R. Murray Schafer o rádio se tornou o relógio da civilização ocidental. Uma das principais diferenças entre o rádio e a mídia impressa foi, que além de estar presente na rotina das pessoas, alterou a rotina das mesmas. A ambientalização das salas de estar foi direcionada ao aparelho e, nas horas de descanso era o rádio a melhor companhia.
“Nesse sentido, o trabalho de Gooldfeder, da Universidade de São Paulo, em cuja análise sociológica dos programas de auditório, de repertórios e das produções humorísticas como elemento de transgressão e de reiteração de valores, e, ainda, mediante a análise da produção radiofônica como atividade formadora de opinião pública, permitiu identificar alguns aspectos contraditórios no processo de manipulação simbólica e reações psicossociais além das previstas pelos seus produtores. ” (NASCIMENTO, Marcio, p. 50)
No noticiário escrito pelo antigo radialista da PRF-7 Andral Tavares, do jornal Folha da Manhã de 21 de agosto de 2004, descreve sobre o dia da inauguração da emissora. As pessoas se aglomeravam na frente do prédio, ansiosos para a escuta nos transmissores instalados na rua. Também foram instalados alto-falantes nos bares, cafés e restaurantes no centro da cidade e era grande a euforia para mostrar ao restante do Brasil “sobre a cultura, as artes e a e as potencialidades da região” (Folha da Manhã, Campos, 21 de agosto de 2004).
Duas estabelecidas conversas chamaram a atenção para a vivência cotidiana com a rádio: dois homens, de classe social distintas, nos relataram suas experiências com a PRF-7. O primeiro, morador de área nobre da cidade acompanhava a programação convicto, utilizava dos rádio-jornais para informar-se e das músicas para se divertir, alegando-nos convivência com os artistas. Já o segundo entrevistado, sambista e morador de uma comunidade localizada no centro da cidade, relembra com mais entusiasmo das narrações de futebol e dos sambas que lá foram lançados, afirmando influência de personalidades da rádio na sua formação quanto músico, porém complementa falando que não era na Rádio Cultura que os novos músicos tinham voz, apresentavam-se nas emissoras de bairro.
Outra conversa com uma radialista que trabalhou para alguns programas da rádio fora importante para compreensão da rotina da PRF-7. Ela nos relatou a importância dos programas infantis nos auditórios para aproximação da emissora com seus ouvintes. As crianças acompanhavam a gravação do programa Gurizada enquanto sorteavam prêmios e realizavam gincanas.
“Cada um dos núcleos radiofônicos se subdividiam em outros setores. No jornalístico, por exemplo, encontravam-se repórteres, redatores e locutores que atuavam nos setores esportivos, de notícias, feminino, de serviços, de crônicas etc. Nas grandes emissoras, o núcleo musical era composto por orquestras internas, diversos maestros e conjuntos regionais, que executavam músicas populares. A música sempre foi um elemento fundamental dentro da programação de uma emissora de rádio, e eram esses profissionais que criavam os arranjos para os programas dos mais variados estilos. Os músicos também acompanhavam os cantores exclusivos da rádio e os convidados. Ou seja, a estrutura interna de uma emissora de rádio era complexa, com todos os setores funcionando de maneira interligada” (CALABRE, Lia. p. 33)
Interior: metrópole cultural
Para engrossar o caldo sobre o debate traçado inicialmente, apresentamos aqui a criação pioneira de uma emissora de radiodifusão, contudo não podemos cair nas diferenças dos tempos históricos. Os anos 1930 foi decisivo para o conceito de regionalismo. Lembramos aqui do clássico vídeo de Getúlio Vargas queimando as bandeiras estaduais, afim de simbolizar uma igualdade regional, embora nunca existente, dos Brasis. O estudo sobre essa mídia atinge vários gatilhos. Nos aprofundando mais no interior do estado, nas cidades ainda menores ou nas roças, ouvimos de longe o som do rádio, mesmo com o aparecimento tecnológico da televisão. Isso parte de todo processo histórico dessa mídia narrado aqui. A política de comunicação de massas encontra no rádio um campo aberto.
“Cultura de massa, isto é, produzida segundo as normas maciças da fabricação industrial. Propaganda pelas técnicas de difusão maciça (que um estranho neologismo anglo-latino, chama de mass-media); destinando-se a uma massa social, isto é, um aglomerado gigantesco de indivíduos compreendidos aquém e além das estruturas internas da sociedade (classes, família, etc). (MORIN. 1967, p. 16)
A cultura de massas abre espaço para a criação símbolos, mitos, imagens e por fim, uma homogeneidade, ligadas a formação da cultura nacional, uma re-criação de ideia do que é a nação. Entretanto, essa sociedade moderna baseia-se nos cruzamentos do complexo do que é cultura, de civilização e de história (MORIN, p. 23), sendo assim policultural ou multicultural, que se alimentam ou se chocam. Duas representações da cultura trabalhadas pelo autor é a alta cultura, que dentro das relações de poder apresenta-se como hegemônica, e a cultura de subprodutos, considerada “ópio do povo”. Ambas se chocam dentro do processo da criação, a primeira pautada numa criação autônoma e estética e a outra nas técnicas industriais, com a finalidade do consumo.
O rádio revolucionou os meios de comunicação a partir do momento em que milhares de pessoas recebiam a mesma notícia, mas cada um interpretava de sua forma, além de modificar a relação que a informação tinha com o tempo e criavam uma memória social sobre determinado fato ocorrido. Como complementa MacLuhan
“O rádio propiciou a primeira experiência maciça de implosão eletrônica, a reversão da direção e do sentido da civilização ocidental letrada diante da possibilidade de transformar a psique e a sociedade numa única câmara de eco; a dimensão ressonadora do rádio” (MACLUHAN, Marshall. 1979, p. 405).
Referências Bibliográficas
ADORNO, Theodor W.. Indústria cultural e sociedade. 8º ed. São Paulo: Paz e Terra, 2014.
Acervo Documental Sonoro/ Fonoteca da Casa de Cultura Villa Maria/CCVM da Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro. Acesso de abril de 2017 a março de 2018. Campos dos Goytacazes/RJ.
CALABRE, Lia. A Era do Rádio. 2.Ed. Rio de Janeiro. Jorge Zahar Ed., 2004.
HOBSBAWN, Eric. A era dos extremos: o breve século XX (1914-1991). São Paulo, Companhia das Letras, 1995.
Jornal O Monitor Campista. 1934-1938. Arquivo Municipal Waldir de Carvalho. Campos dos Goytacazes/RJ. 2017.
MACLUHAN, Marshall. Os meios de comunicação como extensão do homem. São Paulo: Cultrix, 1979, p. 405.
MARTÍN-BARBERO, Jesús. Dos meios as mediações: comunicação, cultura e hegemonia. Rio de Janeiro, UFRJ, 1997.
MORIN, Edgar. Cultura de massas no século XX: o espírito do tempo. Companhia Editora Forense. Tradução Maura Ribeiro Sardinha. Rio de Janeiro, 1967.
NASCIMENTO, Marcio. PRA-9 Rádio Mayrink Veiga: um lapso de memória na história do rádio brasileiro. Litteris: Rio de Janeiro. 2018.
RANGEL JR., Vicente Marins. 1992. Recortes da Memória Musical de Campos (1839-1965). Itaperuna: Damará.
TOTA, Antonio Pedro. A Locomotiva no ar: rádio e modernidade. São Paulo: 1924-1934. São Paulo: Secretaria do Estado e Cultura, 1990