Por que Tu permites?

Sobre uma dúvida intermitente acerca da existência de um Poder Maior, e a inspiração que algumas pessoas nos dá no sentido de não desistir da construção de um mundo melhor, mesmo em meio a tanta atrocidade e acontecimentos dolorosos contra o ser humano.

O mundo tem coisas tão ruins e tristes que às vezes a gente fica meio em dúvida se existe mesmo um sentido, um Poder Maior que conhece os motivos e direciona as coisas da vida. Tanta criança passando fome, velho abandonado, drogados em situação precária, guerras, atritos e conflitos de todos os gêneros, dentro até das próprias famílias… meu Deus! por que Tu permites?, me pego pensando mesmo sem querer – uma quebra de fé, um lampejo de como ela é fraca, como não tem quase força nenhuma? ou um início de sanidade em perceber que, em meio a toda essa dor, carência de necessidades básicas e desavenças incomensuráveis, há evidências, não apenas indícios, de que estamos mesmo sozinhos neste mundo e esta problemática nossa, que a gente inventou, ninguém, absolutamente ninguém além de nós mesmos, é capaz de ajudar a resolver? e que essa crença no Divino é a esperança, último fio a que nos prendemos pra não desistir de uma vez por todas de uma “essência” superior que nos dê sentido?

Não sei, é um momento de confabulação quando, ao olhar as coisas terríveis deste mundo, me deparo com a ausência total de motivos e uma sensação de dor que não é minha, mas dos outros, dos milhares de outros que hoje, neste dia frio, não tem um chuveiro quente, uma cama macia, uma xícara de chá, um teto que seja, por exemplo. Os milhares de outros que estão nos leitos dos hospitais, não tem água encanada, nem saneamento básico, passam fome, são feridos de guerra, perderam suas famílias, presos em condições monstruosas em hospícios, viuvários, orfanatos e, sim, também em cadeias desumanas, cárceres não da liberdade, mas de prática de tortura. E por quê? Por que é assim?

Sinto-me impotente frente às dores do mundo. Pouco podemos fazer a respeito da dor do outro. Há coisas que cada um tem que fazer por si próprio, não podem ser transferidas, é como ir ao banheiro ou dormir, ninguém pode fazer isso por você ou por mim, é tarefa intransferível. E a gente se sente de mãos atadas, porque as coisas que podemos fazer são insuficientes para resolver a situação e, por isso, grande parte desanima e acaba desistindo dessa construção.

Mas tem gente que não desiste. Tem gente que, mesmo frente às desilusões do mundo,  persiste no trabalho e continua acreditando que pode chegar lá, apesar das dificuldades e das milhões de vozes bradando que é infrutífero, que não vale a pena.

São pessoas especiais, com um sentimento de humanidade e dom pra pescar talentos e formar um “time”, seduzindo plateias para a realização do bem comum, que não, não é possível sem congregar pessoas.

Nestes momentos de dúvida, são pessoas assim que me inspiram e me fazem acreditar que sozinha é quase impossível, e talvez o bem que eu queira não alcance as pessoas que eu gostaria a tempo de uma transformação, mas podem alcançar muitas outras pessoas necessitadas de uma mão estendida, um pedaço de pão, um abraço, uma conversa ou mesmo uma companhia no silêncio, algum dia. Tem coisas que não dá pra gente fazer pelo outro, mas pelas coisas que a gente pode fazer, muitas pessoas lutam desavergonhadamente e dispostas. É o exemplo dessas pessoas que não me deixa perder a fé de que um mundo diferente pode surgir e, mesmo que não surja, é valioso e poderoso trabalhar no sentido de que ele venha. Talvez esteja aí um pouco daquele sentido que buscamos.

à Ana Diet:

PÉROLAS NO LIXO
(por lAri Germano)

Existem pessoas que são como flores
Semeadas no deserto.
Pessoas que têm doçuras
Não se sabe, vindas de onde
Ou por que.
Pessoas que são flashes
De luz na escuridão.
Pérolas tão branquinhas
Escondidas na oclusão.
Pessoas assim são dádivas,
São presentes divinos.
São pedaços de sol
A iluminar o caminho.
Sementes pequeninas
Espargidas entre gravetos
De terra infértil e hostil.
São nuvens carinhosas e fofas
Num céu cinzento e repleto
De agruras e arrependimentos.
Com sua claridade e textura
E melíflua melodia,
Neutralizam o mal sentimento,
As caras feias, os gritos,
A amargura de quem é sombrio.
Povoado de trevas
Ou vazio.

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Lári Germano é autora dos livros "Cinzas e Cheiros" e "En plein air - ao ar livre". Conheça e adquira os trabalhos no site www.larigermano.com. Lári escreve também na página pessoal do Facebook e nos Instagrams @lari poeta e @lariprosaetrova . É compositora intuitiva e tem perfil no Sound Cloud, Twitter e Youtube. A foto do logo é assinada pelo fotógrafo Fernando Pilatos www.fernandopilatos.com.br.

2 Comments

  1. Ana Dietrich disse:

    Emocionada, agradeço a belíssisma homenagem de Larissa Germano!!! A vida fica muito mais encantadora com companheiros de lutas e sonhos e fico feliz dela ter me trazido você, Larissa. São ações assim como seu texto que me fazem renovar a força para continuar. Agradeço por ter acreditado em mim e no projeto EDH e Contemporartes, juntos somos melhores, mais fortes, mais corajosos! Muito obrigada pela parceria e também com seu parceiro Renê Pattaro que vc. trouxe a minha vida!

  2. Tamu junto! cheios de convicção e esperança! obrigada pela oportunidade! eu e Renê.

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