No presente momento, um ex-presidente da República, vários políticos importantes, muitos empresários destacados, estão cumprindo penas em prisão fechada ou domiciliar. Sem entrar na questão complexa e controversa da justiça ou da injustiça de suas condenações, o fato suscita reflexão sobre a validade mesma da privação de liberdade para pessoas que não oferecem risco de violência física à sociedade. Evidente que o desvio de verbas públicas, o uso abusivo do poder, todo o imenso repertório dos “crimes sem vítimas”, têm um custo material muitíssimo maior do que aquele que um ladrão comum pode produzir.
A população carcerária brasileira é a terceira do mundo com quase 750 mil presos, “perdemos” apenas para EUA e China. Segundo o Departamento Penitenciário Nacional – Depen, do Ministério da Justiça, mais da metade deste contingente tem entre 18 e 30 anos, e mais de 60% são negros. Cerca de 75% não chegaram ao ensino médio e menos de 1% tem formação superior. Há quase 46 mil mulheres presas, 5% do total, a maioria por crimes relacionados ao tráfico de drogas, entre os presos homens um quarto responde por esse tipo de crime.
O sistema prisional brasileiro consegue ofertar apenas a metade das vagas que seriam necessárias para abrigar toda a população apenada em condições minimamente dignas, o que explica a superlotação na maioria dos estabelecimentos com a péssima salubridade física e mental imposta aos reclusos. O governo federal tem procurado tratar desta questão através da oferta de penas alternativas e uso de tornozeleiras eletrônicas, e também pela construção de novas unidades, mas o crescimento das condenações supera o benefício obtido por essas medidas, criando o proverbial “enxugamento de gelo”.
Além das afrontas a direitos humanos universais e despesas cada vez maiores, os resultados positivos obtidos pelo nosso sistema penal são pífios. A ideia de privação de liberdade surgiu como alternativa, até humanitária, aos castigos selvagens que eram impostos aos criminosos, geralmente tortura seguida de morte, algo muito mais próximo da vingança do que da justiça. A prisão cumpriria quatro objetivos: isolar elementos perigosos impedindo-os de tornar a cometer crime; dar uma satisfação às vítimas pela punição aplicada; servir de exemplo para os demais; recuperar o condenado para a sociedade pela reflexão e pelos bons conselhos que receberia enquanto preso.
Infelizmente, praticamente nada disto acontece através de nossos presídios. Pelo contrário, parte dos apenados em primeira condenação termina por se unir a alguma facção das que controlam as penitenciárias, por questão de sobrevivência visto que o Estado não consegue garantir sua segurança. Adicionalmente, a maior parte que adentra estas instituições não consegue um programa de ensino que efetivamente a requalifique para o mercado de trabalho e a vida em sociedade, melhorando sua convivência social e potencialidade de sobrevivência.
O auxílio para sair deste ciclo vicioso tem sido muito pequeno, apesar da ampliação do atendimento escolar nas prisões paranaenses, que tem ofertado EJA – Educação de Jovens e Adultos – desde a alfabetização ao ensino médio, instalado por convênio entre Secretarias de Educação e de Justiça, Tribunal de Justiça e Ministério Público. No entanto, este programa atinge pouco mais de três mil pessoas, número muito aquém da necessidade, além da limitação de ofertas de outros tipos de atividades: profissionalizantes para capacitação ao próprio sustento, ou culturais para melhor compreensão do mundo e patrimônio humano.
Assim, a reincidência tem sido a norma, e precisaremos construir mais e mais unidades de detenção, em lugar de mais escolas. A violência aumenta, e o problema da segurança se torna cada vez mais urgente em nossas comunidades.
Crédito da Imagem: (https://www.ceert.org.br/noticias/direitos-humanos/15615/como-um-pai-de-familia-assalariado-foi-parar-em-uma-cela-do-pcc)