AFONSO GUERRA BAIÃO E A PROCURA DA POESIA

“Amadureceu em mim esta palavra e pronta para o voo”  
(Bento Prado Jr.)

Neste mês de setembro, a coluna INcontros tem o prazer e a alegria de divulgar o mais novo livro de Afonso Guerra Baião, “Sonetos de bem-dizer/ de maldizer”, e nada melhor do que o próprio autor para falar de sua obra:

No prefácio do meu livro, SONETOS DE BEM-DIZER / DE MALDIZER, o Professor Antônio Sérgio Bueno afirma que “a ficção vem até nós, a poesia nós temos que buscá-la”. A ficção, a história inventada vem até nós. Nos dias atuais, a realidade parece copiar a ficção.

Essa ficção não vem até nós através dos romances, dos contos, das novelas ou das séries. Não. Ela vem até nós através do noticiário, dos meios de comunicação de massa ou das redes sociais. E as narrativas da vida real que as mídias nos aportam são tão absurdas que fazem parecer histórias infantis as obras de um Franz Kafka, de um George Orwell ou de um Gabriel Garcia Marquez.

Pois bem. Em momentos assim, mais do nunca, a poesia se faz necessária. E poesia não vem até nós: nós temos que buscá-la. Onde buscar a poesia? Ainda muito jovem, eu fui buscá-la no ensinamento que um grande mestre, Carlos Drummond de Andrade, me oferecia em seu poema PROCURA DA POESIA.

Como todo jovem, eu tinha a sensibilidade â flor da pele e transpirava emoção por todos os poros. Qual não foi, então, o meu espanto, a minha perplexidade, diante da seguinte afirmação do poeta: “O que pensas e sentes, isso ainda não é poesia”. Com o tempo eu viria a entender que a poesia não é a realidade imediata, mas é a realidade transfigurada, mediada pela linguagem em dimensão estética.

Como buscar a poesia?

Em PROCURA DA POESIA, o poeta ensina: “Penetra surdamente no reino das palavras”. Surdamente: sem dar ouvido aos clichês, aos estereótipos das falas repetidas que nos assediam, fechando os ouvidos aos lugares comuns e aos preconceitos que nos bombardeiam cotidianamente. Mais ou menos como os místicos que esvaziam a mente para meditar. Só assim podemos experimentar o que Gabriela Llansol chamou de “o encontro inesperado do diverso”. É como se você estivesse andando por um campo e topasse com pedras há muito esquecidas nas trilhas ou no meio da vegetação.

Você levanta uma pedra e descobre debaixo dela a efervescência de um bioma, a vida que anima um insuspeito microcosmo. Da mesma forma, as palavras nos surpreendem quando, ao penetrarmos no jogo da linguagem, descobrimos uma nuvem inteira de sentido condensada numa gotinha de gramática, para lembrar o dizer de Wittgenstein.

O todo condensado em cada parte, a parte que já contém o todo – este é o graal, objeto de desejo de quem procura a poesia, que só existe quando o construímos, e sempre precisa ser reinventado. Nessa busca, depois de muito caminhar, cheguei aos poemas que formam o livro SONETOS DE BEM-DIZER / DE MALDIZER. Esta é a forma com que, nesse momento, eu levanto uma pedra no quintal de LOGOS, a linguagem que é a casa do ser.

A casa do ser se constrói com a palavra radical, aquela que está mais próxima da raiz; a casa do ser se fundamenta na palavra original, aquela que está mais próxima da origem. A procura da poesia é a busca dessa raiz, dessa origem, desse logos essencial. A escolha do soneto para compor meu primeiro livro individual talvez seja uma forma inconsciente de me aproximar de minhas origens.

Um dos meus primeiros contatos com a poesia, depois das poesias infantis das cartilhas escolares, foram os sonetos de D. Oscar de Oliveira, no “O Arquidiocesano”, jornal da Arquidiocese de Mariana, a primaz de Minas. Estes e os sonetos de José Pinto Coelho, na imprensa pontenovense, deixaram em minha retina a imagem do texto poético como a forma plástica, simétrica e sintética dos dois quartetos e dois tercetos.

E se o soneto me propicia a realização de uma miragem arquetípica do poema, ele também me conduz ao reencontro de lugares e pessoas que se tornaram marcantes em minha trajetória nessa busca da poesia.

Assim é que em SONETOS DE BEM-DIZER / DE MALDIZER, homenageio Ponte Nova, a cidade onde vivi parte da infância, a adolescência e a juventude, através de poemas dedicados a dois mestres que muito contribuíram em minha formação humana e em minhas concepções estéticas: Laene Teixeira Mucci e Ruy Guilherme Merheb.

Além destes, homenageio também o poeta Gabriel Bicalho, companheiro de juventude, cujo poema “PEDRA-MAR”, escrito na época e que depois comporia seu primeiro livro, CRIÂNSIA, foi para mim uma pedra-de-toque que me alertou para novas possibilidades na construção da linguagem poética, no que diz respeito a rupturas sintáticas e semânticas que, no entanto, não resvalavam para o caos nem para o nonsense, mas, sim, apontavam para o redimensionamento das formas e dos sentidos, no jogo da linguagem.

Uma “palhinha” da obra:

VÊNUS NA CASA DE GÊMEOS
assim crescentes seios sob a loa
à lua que entoam lábeis lábios
tão ávidos de lírios e papoulas
e pomos dos pomares de teus átrios; (pág. 19)
(…)

A UM DEMAGOGO
Você é demagogo: tem gogó
de demo ou mago pra fazer agá,
garganta grande pra enganar bocó,
boca de lobo pra engolir gagá, (pág. 63)
(…)

Afonso Guerra Baião (Foto: Arquivo Pessoal) Intagram: @afonsobaiao

SONETOS DE BEM-DIZER / DE MALDIZER, pode ser adquirido na Amazon , na Estante Virtual ou direto com o autor em suas páginas no Face e no Instagram.

Pela Amazon publiquei ainda duas pequenas obras de ficção em formato digital: O INIMIGO DO POVO e A NOITE DO MEU BEM. No álbum “Bandalhismo”, de João Bosco, assinei a letra da canção “Anjo Torto”. Também compus letras para canções de Sebastião Sérgio Gomes. No mais, declaro que sou, além de mineiro, Atleticano, gosto de frango com quiabo e angu e um licor de pequi.