Abordar sobre subjetividade do trabalhador é bastante delicado, uma vez que esta é construída perante as experiências vividas por cada sujeito em seu percurso de trabalho e por sua visão pessoal que foi constituída desde a infância, a partir das relações que foram estabelecidas pelo seu processo de desenvolvimento.
As novas possibilidades de atuação no mercado de trabalho que dominam o século XXI vieram para desconstruir toda a questão de uma heterogestão onde o gestor simplesmente determina os processos de produção sem que haja a possibilidade do colaborador questionar e consequentemente, somar no crescimento das empresas. (ALBUQUERQUE, 2003)
Albuquerque (2003) expõe o conceito de autogestão, que, a primeira vista pode nos dar a ideia de uma gestão autossuficiente, todavia, seu conceito está justamente na contramão dessa possível primeira impressão. Trata-se de uma administração que busca propiciar a participação da equipe nas decisões, logo, este mesmo pessoal precisa estar a par de todo o contexto institucional para que alcance a autonomia e dessa forma encararem juntos novas deliberações para novos desafios que o mercado de trabalho nos oferece.
Convido os (as) senhores (as) leitores (as) a fazerem uma breve reflexão sobre as possíveis implicações dessa autogestão. Para tal, algumas perguntas serão expostas com o intuito de auxiliar esse pensamento: os empresários estão dispostos a abrirem mão desse sistema já conhecido e reproduzido de hierarquias? Estamos em um momento equilibrado na nossa economia para oportunizar novas descobertas de atuação frente aos riscos que isso pode implicar no mercado? Temos uma receptividade de diversidade de ideias dentro das entidades – e por que não considerar a sociedade como um todo? A equipe possui recursos, liberdade de se expressarem e oportunidade de reconhecimento quando lhe cabe?
São perguntas que podem levar a várias outras, mas quero terminar essas considerações ao lembrá-los que em todas as histórias de crise em que o mundo já vivenciou, contextos de sucesso advindos desses períodos acabam por se tornar exemplos de atuação, até que surjam novas necessidades.
Em relatos de muitos trabalhadores, como psicólogo, costumo ouvir queixas semelhantes mesmo quando estes possuem trabalhos completamente diferentes. Aparentemente há uma cultura ainda muito difundida nas organizações de que “manda quem pode, obedece quem tem juízo” e é no mínimo curioso porque esse posicionamento está no lado oposto do crescimento e no final, todas as metas estipuladas pelos chefes aos funcionários possuem o intuito de ampliação de resultados. A frase atribuída ao Gandhi é demasiadamente cara nesse contexto: “Temos que nos tornar a mudança que queremos ver.”
E por falar em mudanças, esse novo processo gerencial já abordado, traz também outra implicação importante a ser discutida: novos mecanismos de subjetivação. Assim como é necessária uma abertura da gerência para a contemporaneidade, é preciso que os trabalhadores tenham potencialidades desenvolvidas que garantem uma boa colaboração entre as equipes e, por consequência, a capacidade de confrontação de desafios. (VERONESE, 2009)
Uma pessoa saudável irá se comportar com distintas reações para diversas situações sem que haja uma rigidez que dificulte o desdobramento e resolução daquele fenômeno que lhe é demonstrado. Muitas vezes, as pessoas usam recursos padronizados que já foram satisfatórios em outros momentos e dessa forma, tendem a reagir de maneira repetitiva para fenômenos nunca antes experimentados. (JOYCE, SILLS, 2016)
Segundo Joyce e Sillss (2016) para que os sujeitos permaneçam mantendo relações funcionais e dessa forma, terem uma saúde psicológica adequada, é imprescindível que os relacionamentos tenham possibilidades de criatividade, flexibilidade e cooperação para crescimento. Sendo assim, para que haja essa liberdade é necessário ter a consciência de que esse processo só acontece se houver colaboração das partes envolvidas.
Portanto, saliento que todas essas mudanças sistemáticas devem contar com atuações qualificadas de pessoas que entendem das análises institucionais que deverão ser feitas para cada realidade e assim, resultar na melhoria da cultura organizacional e claro, desfrutar dos inúmeros benefícios.
REFERÊNCIAS
ALBUQUERQUE, Paulo Peixotto. Autogestão. In: CATTANI, Antonio David (Org.). A outra economia. Porto Alegre: Veraz Editores, 2003.
JOYCE, Phil; SILLS, Charlotte. Técnicas em Gestalt: Aconselhamento e psicoterapia. São Paulo: Vozes, 2016.
VERONESE, Marília Veríssimo. Subjetividade, trabalho e economia solidária. Revista Crítica de Ciências Sociais, n. 84, p. 153-167, 2009.