ESTADOS UNIDOS E CHILE: A DEPOSIÇÃO DE SALVADOR ALLENDE E A INFLUÊNCIA ESTADUNIDENSE NA
IMPLANTAÇÃO DO REGIME DITATORIAL EM 1973
EDUARDA MONTEIRO
Eduarda Monteiro é uma acadêmica de Licenciatura em História pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Campus de Campos dos Goytacazes – Instituto de Ciências da Sociedade e Desenvolvimento Regional (ESR). O principal interesse de pesquisa da graduanda é voltado enfaticamente para História dos Estados Unidos, História das Relações Internacionais, História Econômica e História Política Contemporânea. Atua como bolsista no Programa Institucional de Residência Pedagógica (CAPES), na área de Educação, e opera como monitora voluntária na disciplina História do Brasil República (PUCG/UFF). Faz parte do corpo editorial da Revista Convergência Crítica sob a coordenação do editor-chefe Leonardo Soares dos Santos (COC/ESR/PUCG/UFF). Atualmente integra o Laboratório de Estudos das Direitas e do Autoritarismo (LEDA) e participa do Grupo de Estudos em Teoria Social (GETS). Possui também qualificação para realizar leituras e transcrições paleográficas de manuscritos brasileiros e participa do projeto de extensão “As escrituras da Cabeça Política do Estado do Brasil: construção de um banco de dados dos Livros de Notas de Salvador da Bahia (1664- 1807)”, vinculado a UFRJ.
ESTADOS UNIDOS E CHILE: A DEPOSIÇÃO DE SALVADOR ALLENDE E A INFLUÊNCIA ESTADUNIDENSE NA IMPLANTAÇÃO DO REGIME DITATORIAL EM 1973
A figura pública de Salvador Allende, que participou da fundação do Partido Socialista do Chile no ano de 1933, obteve grande participação na política chilena desde muito cedo. Após sua longa trajetória de lutas por igualdade social, Allende assumiu democraticamente a presidência do país 1970, vinculado ao Partido Unidade Popular (UP) e baseando seu governo principalmente nas reformas de base de cunho socialista. O líder da nação sul-americana provocou grandes transformações no Chile no início da década de 1970, sendo o principal objetivo dessas a articulação de mecanismos que transferissem o poder econômico do país do capital monopolista estrangeiro e nacional para o Estado.
Para atingir seus objetivos, Salvador Allende tomou duas decisões essenciais para a implementação desse processo. O primeiro passo dado pelo presidente foi a nacionalização das minas de cobre (que antes eram de propriedade estadunidense) e recursos de minério em geral. Nesse sentido, é importante salientar que essa foi uma mudança extremamente conhecida e aceita entre a população chilena, fazendo com que, dessa maneira, sua popularidade aumentasse. A ação seguinte de Allende foi articular uma maioria no Congresso governamental do Chile para promover a estatização dos bancos privados. Todavia, como essa era uma realidade improvável que abalaria um dos pilares do setor privado do país, Allende precisou refazer suas estratégias contra o capital financeiro. Assim, através de articulações com a Corporación de Fomento de la Producción (CORFO), uma corporação criada para o auxílio da industrialização, o governo chileno passou a usar o mecanismo de compra e venda de ações dos bancos, promovendo assim, uma rápida e constante ascensão do controle diante dessas instituições. Nesse sentido, pode-se afirmar que as medidas funcionaram, pois “um ano após a posse de Allende, ele podia afirmar que seu governo controlava 90% do setor bancário do país” (WINN, 2004). Esse dado econômico nos mostra que o avanço dos movimentos da Unidade Popular e suas investidas para modificar os rumos econômicos do Chile avançavam com voracidade.
Apesar disso, não muito antes desses acontecimentos, o anúncio de uma reforma agrária havia sido feito no país. Com o principal intuito de romper o sistema latitudinal que predominava as posses da área rural do Chile, o processo de implantação dessa dimensão estrutural já se encontrava em estado avançado. Todavia, o presidente Allende planejava uma nova reforma com a utilização da lei de 1967, reformulando-a e passando a esta um caráter atrelado a um viés mais socialista.
O cenário do Chile havia melhorado consideravelmente no ano de 1971, no qual foram registrados uma política de crescimento econômico favorável ao partido UP, assim como uma menor taxa de desemprego. Além disso, a melhoria dos números chilenos também significou aumentar a renda salarial da população, o que foi fundamental para que os trabalhadores também se tornassem consumidores. Isso fez com que o país mantivesse seu mercado interno aquecido e ampliasse os níveis de produção e consumo que “produziram uma mudança importante na opinião pública” (WINN, 2004). Entretanto, existe um outro fator fundamental a ser citado, pois, embora o presidente obtivesse o apoio popular, enfrentava também uma grande pressão da oposição direitista, esta, que por sua vez, controlava o Parlamento chileno. Esses opositores acabaram por se unir, resultando numa queda dos investimentos no país, a inversão do cenário que favoreceu Allende e ocasionando uma intensa instabilidade política naquela sociedade.
A partir desse cenário de fragilidade no quadro político, Salvador Allende passou a enfrentar outras problemáticas em sua governabilidade. Sem a maioria no Congresso, a UP enfrentou grandes dificuldades dentro da aliança entre dois outros partidos chilenos: a Democracia Cristã e o Partido Nacional. Dessa forma, com o aumento das tensões da extrema direita, houveram tentativas para derrubar o governo do presidente eleito que contaram com o financiamento e aprovação dos Estados Unidos – devido principalmente a sua necessidade de expandir suas áreas de influência. Esses atos golpistas passaram a favorecer um ideal de legitimação e justificativa do golpe perante a fração das Forças Armadas que atuavam dentro do discurso anticomunista. Finalmente, em agosto de 1973, o chefe do poder executivo, Salvador Allende, foi deposto de seu cargo através de um golpe de Estado articulado pelas Forças Armadas chilenas. Após o golpe quem assumiu o poder total do país foi o general Augusto Pinochet, apoiado pelos norte-americanos.
Para além disso, é necessário atentar que entre as décadas de 1960 a 1980, diversas ditaduras civis-militares se consolidaram na América do Sul. Assim, ainda diante de um cenário bipolar de Guerra Fria, uma das políticas que auxiliaram a implantação desse sistema repressivo foi a constante reafirmação de um discurso anticomunista. Devido a este fato, foram toleradas violências, torturas, perseguições e matanças em prol de sustentar um patrulhamento ideológico sobre a população que se opunha à nova concepção da Ditadura. Países como Chile, Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai foram lugares onde essa realidade se estabeleceu a partir da influência estadunidense perante o cenário de disputas ideológicas. Dessa maneira, foi desenvolvido uma política de Terror de Estado, que consistia em um mecanismo utilizado para implementar a Doutrina de Segurança Nacional, buscando “defender os interesses dos setores dominantes locais e do capital estrangeiro” (PADRÓS, 2005, pág. 43), exterminando assim, qualquer tipo de manifestação ou resistência popular.
Ademais, a destruição de qualquer tipo de organização revolucionária não podia ser tolerada, o que significava, em outras palavras, a despolitização dos cidadãos e de pluralismos políticos. Tendo em vista esse projeto de intervenção civil-militar, é interessante refletir sobre os representantes do Estado que foram responsáveis pela repressão. Foi concedido às Forças Armadas uma
“Legitimidade política para desempenharem o papel de ordenadores do sistema social, diante da falência das instituições da democracia representativa […], se apresentaram como garantia suprema da unidade nacional ameaçada pelos efeitos desagregadores do “perigo comunista” (PADRÓS, 2005, pág. 46).
Assim, a partir dessa percepção, a narrativa de proteção nacional contra um inimigo interno foi somente uma forma de esconder a verdadeira face antidemocrática desses governos. Por fim, é preciso reforçar que quando a democracia foi restabelecida nesses países, inúmeras documentações, que continham provas das violências contra as vítimas do regime, foram destruídas ou retiradas do acesso público. Isto sem contar a anistia que imunizou militares e agentes estatais contra seus crimes. Esses atos cometidos (ainda que seja importante considerar as singularidades de cada país) provocaram na população grandes revoltas, principalmente na parcela que lutou contra os aparelhos repressivos ditatoriais. Os relatos de desaparecimento definitivo de cidadãos latinos e testemunhas que sobreviveram às perseguições foram dois fatores essenciais para tornar esse assunto um objeto de pesquisa, principalmente para a criação das instituições de memória.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
PADRÓS, Enrique Serra. América Latina: Ditaduras, Segurança Nacional e Terror de Estado. Revista História & Luta de Classes, 2005 / pp. 43-49.
WINN, Peter. A Revolução Chilena. São Paulo: Editora Unesp, 2004.