Alberto Torres: Um intelectual

Jordy Portal Alves

Jordy Portal Alves, Graduando do curso de Bacharelado em História do Instituto de Ciências da Sociedade e  Desenvolvimento Regional da UFF/Campos dos Goytacazes.

E-mail: jordypa@idd.uff.br

 

Alberto Torres: Um intelectual

 

Jordy Portal Alves

 

Resumo:

A pesquisa sobre a ação social dos intelectuais ainda não está em alta nos meios acadêmicos, principalmente dos intelectuais brasileiros. Em vista do surgimento de novas formas de estudos sobre as influências do intelectual na sociedade, o objetivo do nosso trabalho é mostrar como é a ação dos intelectuais na organização de movimentos sociais. Nesse sentido apresentaremos Alberto Torres como um intelectual que influenciou intelectuais durante sua vida e principalmente após sua morte. Analisaremos a ação social dos intelectuais usando conceitos de dois autores: Sirinelli e Gramsci. Nesse sentido, no presente artigo trazemos algumas propostas para efetuar melhores análises da ação dos intelectuais numa sociedade.

 

Palavras-chave: Alberto Torres. A organização nacional. Intelectual. Sociabilidade. Bloco histórico   

 

Abstract

Research on the social action of intellectuals is still not on the rise in academic circles, especially among Brazilian intellectuals. In view of the emergence of new forms of studies on the influences of the intellectual in society, the objective of our work is to show how the action of intellectuals in the organization of social movements is. In this sense, we will present Alberto Torres as an intellectual who influenced intellectuals during his life and especially after his death. We will analyze the social action of intellectuals using concepts from two authors Sirineli and Gramsci. In this sense, in this article we bring some proposals to carry out better analyzes of the action of intellectuals in a society.

 

Keywords: Alberto Torres. The national organization. Intellectual. Sociability. historic block

Introdução

Não é possível analisar qualquer objeto fora de seu contexto. A análise do presente trabalho é a relação do personagem histórico Aberto Torres com seu tempo de vida e após sua morte. Faremos uma análise de como este autor influenciou o pensamento do início da república brasileira e, também, em gerações nacionalistas posteriores a sua morte. Para isso focaremos em sua obra A organização Nacional escrita como uma insatisfação com a constituição de 1891. Assim, começaremos nossa análise efetuando uma breve apresentação da biografia de Alberto Torres.

 

Biografia:

Alberto Seixas Martins Torres nasceu em 26 de novembro de 1865, em Porto de Caixas, município de São João de Itaboraí, Rio de Janeiro. De família da burguesia agrária, seu pai, Manuel Martins Torres, era um influente magistrado e juiz de direito, tendo militado na política fluminense.

Ele estudou em colégios cariocas e ingressou com menos de 15 anos na Faculdade de Medicina, e aos 17 anos matriculou-se, em 1882, na Faculdade de Direito de São Paulo. Na faculdade em São Paulo encontrou um ambiente muito influenciado por ideais abolicionistas e republicanos, que rapidamente o contagiou sua forma de perceber o mundo. Em 1885, após problemas durante a faculdade em São Paulo com o professor de Direito Criminal, transfere-se para a Faculdade de Direito do Recife, juntamente com outros estudantes.

Após a conclusão do curso em Recife, Alberto Torres retorna ao Rio de Janeiro onde se dedica principalmente ao jornalismo e à política, exercendo a advocacia eventualmente. No Rio de Janeiro, Alberto Torres ficou cada vez mais envolvido com a propaganda republicana e abolicionista, e se aproximou muito em 1888, ao grupo de Silva Jardim, que ele auxiliou a organizar o Partido Republicano Fluminense.

Assim, após a mudança no regime, Alberto Torres inicia sua carreira política, exercendo os cargos de constituinte e deputado estadual no Rio de Janeiro (1892 – 1893) e em seguida deputado federal (1894 – 1896), posto a qual renuncia após sua nomeação como Ministro da Justiça e Negócios Interiores, pelo presidente Prudente de Moraes. É eleito então Presidente do Estado do Rio de Janeiro (1897 – 1900).

A organização nacional:

Alberto Torres escreveu A organização nacional devido a desilusões com a constituição de 1891. Como observamos na dissertação de mestrado de Silvia Oliveira Campos de Pinho sobre o Alberto Torres, o texto A organização nacional foi um texto escrito devido a discordâncias com a constituição de 1891. O autor faz críticas à constituição principalmente na questão do regime vigente no Brasil ser importado de nações estrangeiras sem ter influência em questões concretas nacionais brasileiras. A partir dessa análise Alberto Torres conclui que a constituição seria impraticável devido a esse problema.

Sua crítica é principalmente baseada na tese de que não há uma harmonia da realidade brasileira com o texto da constituição. Como observamos no texto A organização nacional, as críticas vão desde o federalismo à educação. Vemos as seguintes conclusões durante o texto: o regime federativo não poderia deixar de existir, porém, a união deve ser soberana e os estados devem ser autônomos; os interesses nacionais devem prevalecer acima dos interesses locais; o país tem o dever de promover a educação aos brasileiros para que eles sejam racionais e críticos para criar uma república harmônica com a sociedade. Assim, o texto A organização nacional foi escrito em um momento histórico de desilusão com a recente república brasileira.

Alberto Torres escreve esse livro em um ambiente onde existia muita decepção com a república brasileira, ele não seria o único intelectual da época que elaborava críticas à constituição e mesmo aos governos republicanos da época. Assim, podemos concluir que todas as ideias do autor são filhas do seu tempo, da mesma forma que o próprio autor.

Alberto Torres, um intelectual:

Como tratar Alberto Torres como intelectual? Essa é a principal questão do presente trabalho. Como observamos na breve biografia e no breve resumo de uma das obras do autor, podemos então analisar suas ideias e sua história sem tirar o autor de seu contexto, ou como diria Gramsci sem tirá-lo do bloco histórico. Dessa forma o objetivo do trabalho é mostrar como Alberto Torres é um intelectual que influenciou muitos em vida e após sua morte através de suas ideias para modificar a sociedade que vive.

Para analisar Alberto Torres seguindo principalmente as ideias de Gramsci e Sirinelli, vamos primeiro definir os conceitos de Gramsci de bloco histórico, intelectual orgânico, hegemonia e sociedade civil, além disso, definiremos os conceitos de  itinerário, sociabilidade e gerações de Sirinelli.

Com os conceitos de Gramsci e Sirinelli é possível explicar as relações que Alberto Torres tinha com seu momento histórico e como ele influenciou intelectuais posteriores com suas ideias descritas em uma das suas obras “A organização nacional”. Antes de falar especificamente de Alberto Torres definiremos os conceitos de Gramsci e Sirinelli.

Para começar a falar dos conceitos de Gramsci é preciso definir o principal conceito que utilizaremos aqui, o intelectual orgânico, porém, é preciso realizar uma breve definição dos outros conceitos mencionados acima. O intelectual orgânico é aquele agente que surge na mudança de bloco histórico em busca de hegemonia na sociedade civil e na sociedade política. O bloco histórico em Gramsci é entendido como momento histórico em que aquele intelectual está, já o conceito de sociedade civil são as instituições criadas para divulgar as ideias da classe dominante, já a sociedade política são as instituições coercitivas.

Para Sirinelli o estudo dos intelectuais deve principalmente analisar sua ação por meio de três conceitos: o itinerário, a sociabilidade e as gerações. O conceito itinerário é para identificar as influências ideológicas do intelectual estudado. O segundo ponto que se deve ter a atenção é o conceito de sociabilidade que serve para mapear em qual grupo o intelectual está engajado, seguindo o exemplo do autor, em qual revista ele escreve a favor e qual ele escreve contra. O conceito de geração é para analisar como essas ideias são transmitidas às gerações do grupo que ele pertence e outros grupos, seja para romper ou continuar.

A partir disso podemos analisar a biografia e a obra de Alberto Torres, através dos conceitos de Gramsci e Sirinelli. Para começar precisamos retornar a biografia para dizer que Alberto Torres é de família burguesa agrária, militou pelo republicanismo e pela abolição. Isso já dá um início para entender de onde ele vem, outra questão inicial é saber suas influências ideológicas, como observamos na dissertação de Silvia Pinho, Alberto Torres foi influenciado pela geração de 1870 como podemos ver nesse trecho:

“Acreditamos que Alberto Torres foi bastante influenciado pela geração de 1870. O ideário da geração de Silvio Romero apresenta grandes semelhanças com aquele esposado por Torres, como em seu cientificismo, laicismo, evolucionismo, a presença de Haeckel, o seu engajamento político, sua busca de pensar a nação e sua ênfase na necessidade de ação.” (Pinho, 2007, pp 82)

Todo o pensamento de Alberto Torres foi influenciado por essa geração republicana que contribui para o crescente sentimento de mudança. Esse sentimento foi crescente no final da monarquia e começo da república, isso possibilitou o surgimento de diversos intelectuais apoiando a mudança de regime, como o próprio Alberto Torres. Como observamos, o conceito de Gramsci de intelectual orgânico é aquele agente de mudança que serve de apoio para a classe hegemônica. Apesar de não ocorrer a mudança de classe hegemônica no contexto da queda do império para início da república, Alberto Torres propõe mudanças importantes para seu contexto.

Nesse sentido, Alberto Torres é um intelectual orgânico na perspectiva de um agente de mudança que representa uma classe que busca ser hegemônica, porém como observamos na biografia do intelectual ele faz parte da mesma classe que possui hegemonia no final do império e início da república. Esse segundo ponto abre muitas questões sobre se ele realmente é um intelectual orgânico ou não. Como vemos em Gramsci ele não atribui o ser intelectual às grandes mudanças na superestrutura, ele tenta evidenciar como a sociedade civil serve como suporte para a hegemonia de uma classe dirigente. Nesse sentido, Alberto Torres é um intelectual orgânico que militou pelo republicanismo e abolicionismo durante a monarquia, e durante a república elaborou críticas ao governo republicano e à constituição de 1891, como vimos em sua obra “A organização nacional”.

O outro ponto importante aqui é o grupo intelectual que ele participava, a sociabilidade de Sirinelli. Como observamos na dissertação de Silvia Pinho, Alberto Torres se envolveu com o republicanismo e o movimento abolicionista, além disso, juntou-se ao grupo de Silva Jardim em 1888, ajudando a fundar o Partido Republicano Fluminense. Após a mudança de regime ele exerceu diversos cargos públicos, como deputado constituinte, deputado federal e deputado estadual.

A influência de Alberto Torres foi sentida principalmente após sua morte. Enquanto ele era vivo era importante, contudo após sua morte ele foi importantíssimo para as gerações de 1920 e 1930, principalmente por sua preocupação com a unidade nacional e nacionalismo. Tivemos admiradores de Alberto Torres representados nessas gerações como, Plínio Salgado, Oliveira Viana, Cândido Motta Filho, porém tivemos representantes contrários a Alberto Torres como Alceu Amoroso Lima.

Assim, podemos afirmar que Alberto Torres foi um intelectual orgânico que visou modificar sua realidade tanto escrevendo, na militância, quanto na ação direta nas instituições estabelecidas. Como vimos neste trabalho ele fazia parte da classe dirigente do final do império e início da república, porém, mesmo fazendo parte ele propôs mudanças importantes que iria contra os interesses de alguns da mesma classe que ele, isso fica claro na sua obra A organização nacional.

 

Considerações Finais

 

A partir de tudo que foi exposto aqui podemos dizer que Alberto Torres foi um intelectual que atuou em diversas frentes para divulgar suas ideias com a intenção de mudar a realidade. Através dos conceitos de Sirinelli e Gramsci vimos como foi sua relação com seu tempo e com outros atores enquanto estava vivo, e também, depois da sua morte. Nesse sentido podemos dizer que Alberto Torres foi criado por todo o meio que estava inserido, além disso, foi ativo contribuindo para algumas mudanças em vida e também contribuiu para mudanças depois de sua morte.

Referências

TORRES, Alberto. A organização nacional. Companhia Editora Nacional, 1982.

DE PINHO, Silvia Oliveira Campos. Alberto Torres: uma obra, várias leituras. 2007.

SIRINELLI, Jean-François. Os intelectuais. Por uma história política, v. 2, p. 231-269, 2003.

PEDREIRA FILHO, Waldemar S. Os intelectuais e a organização da cultura. 1977.

CARNEIRO. Márcia Regina da Silva Ramos. “Do sigma ao sigma – entre a anta, a águia, o leão e o galo –        a construção de memórias integralistas”. Tese apresentada ao Curso de Pós-Graduação em História da Universidade Federal Fluminense,Niterói: UFF, 2007.

GVCULT. Antonio Gramsci e o bloco histórico… – Veja mais em https://gvcult.blogosfera.uol.com.br/2020/08/18/antonio-gramsci. Disponível em: https://gvcult.blogosfera.uol.com.br/2020/08/18/antonio-gramsci. Acesso em: 30 jun. 2023

 

Professora Doutora do Departamento de História do Instituto de Ciências da Sociedade e Desenvolvimento Regional da Universidade Federal Fluminense. Coordenadora do Laboratório de Estudos da Imanência e da Transcendência (LEIT) e do Laboratório de Estudos das Direitas e do Autoritarismo (LEDA). Membro do Grupo de Estudos do Integralismo (GEINT).

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