A palavra filantropia tem entre seus significados o de profundo amor pela humanidade; e desde a Idade Média a igreja praticava a caridade como forma de “pacificar” os menos favorecidos, seguida no século XVIII por algumas ações caridosas realizadas pelos burgueses e pelo Estado, pois as consequências da extrema pobreza mostravam-se perigosas para a manutenção da lei e da ordem, e apontavam a necessidade de providências.
De certa forma, constituiam formas de governar a miséria, minorando a situação de poucos através de atividades pontuais e personais, mais que tentativa concreta de resolução de problemas sociais; não correspondendo exatamente a uma devoção pelos demais seres humanos, e sim a um certo senso prático.
Um fato ocorrido nos Estados Unidos logo no início do século XX ilustra significativamente este fato, e foi protagonizado por Henry Ford, industrial que se tornou o emblema e até nomeou um certo capitalismo selvagem, o fordismo, e que realmente carecia de alguns atributos que hoje enaltecemos como caracteristicos das pessoas mais solidárias e de elevados valores morais.
No entanto, foi dele a primeira iniciativa registrada de que um presidente – e acionista majoritário – de empresa, não distribuisse entre os sócios uma parte dos dividendos mas os revertesse para a realização de objetivos sociais, como aumento de salários e aplicação em um fundo de reserva, destinado a suprir possíveis carencias quando os preços dos carros fossem reduzidos.
Sua ideia clara era de diminuir o preço dos veículos para que até seus funcionários pudessem comprá-los, o que aumentaria a qualidade de vida dos trabalhadores, seu poder de compra e, um pouco depois, o lucro da organização. No entanto, com isso Ford contrariava o interesse imediatista de um grupo de acionistas, como Horace Dodge, que entrou na justiça contra ele, justificando que a corporação existe para o benefício dos acionistas, não tendo diretores corporativos livre arbítrio quanto aos meios de utilizar lucros para outras finalidades; e a Suprema Corte de Michigan também entendeu desta maneira, dando ganho de causa a Dodge.
Assim, durante muito tempo a prática de ações sociais foi desestimulada no meio empresarial, sendo desenvolvidos apenas assistencialismo, caridade ou doações para a criação de fundações, como a da própria Ford em 1936, a Rockfeller e a Guggenheim.
Após a Grande Depressão, como é conhecida a crise de 1929, e que terminou apenas com o Segunda Guerra Mundial, considerada o pior – e um dos mais longos – período de recessão econômica, a noção de que uma corporação existe apenas para benefício de seus acionistas foi abalada, e a questão da responsabilidade empresarial se impôs na agenda política.
Pensadores como o economista britânico John Maynard Keynes passaram a apresentar novas ideias e conceitos, mudando as políticas economicas instituídas pelos governos e gerando condições para investimentos em tecnologia, acumulo de capital e consolidação do modelo de produção em massa, provocando mudanças nos valores sociais.
Os horrores da guerra, somados ao medo da ascenção de regimes socialistas pela via eleitoral, trouxeram também nova consciencia do papel e da responsabilidade das empresas e dos empresários no bem-estar da sociedade, com medidas efetivas visando a melhoria de relações com trabalhadores e com a comunidade.
Embora necessárias e meritórias, estas iniciativas padecem em muitos casos da ausencia de real compromisso com a responsabilidade social, estando mais voltadas a cumprimento de legislação, ações de marketing ou obtenção de vantagens tributárias; e mesmo assim, sua ocorrencia é positiva. Quando escolas tentam colocar a questão em seus currículos, tais contradições se manifestam amplamente.
Muito boa perspectiva da autora. Realmente as ações “humanitárias” do capitalismo sempre visam sua própria proteção.