“1968 foi o ano que o jornalista Zuenir Ventura imortalizou como aquele que ‘não terminou’ e que fez o filósofo francês Jean Paul Sartre confessar, tempos depois, que ainda pensava com perplexidade, no que havia acontecido: Nunca pude entender o que exatamente aqueles jovens queriam” (Sander, 2018).
O estopim da agitação na França foi o fechamento da Universidade de Nanterre, em 2 de maio daquele ano. Em pouco tempo, ganharam o apoio dos estudantes da Universidade de Sorbonne, que tomaram as ruas do Quartier Latin, em Paris. Além das barricadas e enfrentamentos violentos com a polícia, os manifestantes utilizavam as palavras como arma, com cartazes e pichações que continham frases irônicas.
“A imaginação no poder”, “Abaixo o realismo socialista, “Viva o Surrealismo”, “Sejam realistas, exijam o impossível”, “Ceder um pouco é capitular muito”, “Consuma mais, viva menos” , “É proibido proibir”, entre outras, eram as palavras de ordem. A partir dessas manifestações, sucessivos movimentos de protestos irromperam em diversas universidades de países da Europa e das Américas, que ganharam uma dimensão ainda maior com a ampliação das revoltas para a classe trabalhadora.
Foto: Philippe Gras
Segundo o jornalista e escritor Roberto Sander, “este foi um ano-chave para a história mundial e brasileira, repleto de episódios emblemáticos, além do Maio Francês e a Primavera de Praga, na Europa, a Passeata dos Cem Mil e a imposição do temido AI-5, num Brasil subjugado pelo regime militar. O que aconteceu, a meu ver, foi uma reação da juventude que se sentia encurralada pelas pressões de mais de duas décadas de Guerra Fria. Resistia-se aos processos de manipulação das grandes mídias que funcionavam como difusores da ideologia capitalista.
Ao mesmo tempo, havia também rejeição ao socialismo opressivo imposto pela União Soviética aos países do leste Europeu. Os rebeldes parisienses diziam que ‘a humanidade só seria feliz quando o último capitalista fosse enforcado nas tripas do último burocrata stalinista’. Isso resumia o espírito contestatório da época.”, conclui Sander.
Foto: Philippe Gras
Para marcar os 50 anos dos eventos de maio de 1968 na França, a exposição Au Coeur de Mai 68 traz as imagens de Philippe Gras (1942-2007) realizadas naquele momento. Elas nos dão um testemunho dessa época que é tanto feita de História quanto de mito. Durante os famosos eventos parisienses, os fotógrafos eram numerosos no palco dessas ações.
E Philippe Gras é um daqueles fotógrafos que souberam capturar não apenas o momento e o gesto, mas também o signo e o significado desse período de revolução e inovação. O relato fotográfico de Gras difere de toda a documentação já conhecida, pela qualidade artística de suas imagens e pelo olhar ao mesmo tempo empático e distanciado.
Foto: Philippe Gras
A exposição Au Coeur de Mai 68 é realizada pela Aliança Francesa de Curitiba e pelo Ministério da Cultura (MinC) por meio da Lei de Incentivo à Cultura (Rouanet), e está em cartaz no Café Babette.
Sobre o Autor:
Philippe Gras
- 1942 – Nasceu em Paris, em 16 de abril, no 15º distrito;
- Anos 1960 – Cursa a École Supérieure des Arts Graphiques, trabalha com fotografia de moda; primeiras reportagens sobre shows de jazz;
- 1967 a 1982 – Atua como fotógrafo free lance especializado em criação contemporânea (música,
dança, teatro), colabora para as revistas Actuel, L’Art Vivant, Jazz Hot, etc.;
- Anos 1960 a 1990 – Participa de vários festivais de teatro e música modernos (Amougies, Ilha de Wight, Saint-Paul de Vence, Noites da Fundação Maeght, Festival pan-africano de Argel), colaboração regular com o Festival das Artes Contemporâneas de La Rochelle e o Festival de Outono de Paris; maquetes et ilustrações de capas de discos e CDs;
- 1970 a 1983 – Assistente e fotógrafo de cinema com os cineastas Alain Corneau, Lê Lam, Jean-Noël Delamarre; coautor de duas média-metragens sobre o músico Don Cherry e sobre o escultor Raymond Delamarre;
- 1988 – Livro de fotografias sobre os templos de Angkor com textos de Michel Butor e Nouth Narang;
- 1982 a 2007 – Colabora com a Agência pelo desenvolvimento regional do cinema; artigos et livros sobre iconografia popular e sobre salas de cinema; séries fotográficas sobre o metrô parisiense, Maio de 68, o London East End, os cartazes de cinema, a tatuagem. Viagens e reportagens no Butão, no Irã, na Coreia do Sul, no Camboja, no Vietnã, e na Hungria;
- 2007 – Morte súbita no seu domicílio parisiense em 22 de fevereiro no 13º distrito; homenagens no jornal Le Monde e na rádio France Culture.
Na opinião de seus comentadores, Philippe Gras foi não apenas um fotógrafo independente, mas também um espírito independente, que se recusou a fazer concessões. Durante toda a sua vida, ele tentou focalizar sua câmera apenas em obras, temas, artistas em que acreditava, com quem manteve em alguns casos uma longa amizade e em fenômenos sociais que lhe pareciam importantes.
Referências:
SANDER, Roberto, 1968 – Quando a Terra tremeu, Editora Vestígio, S.Paulo: 2018
Café Babette – Foto: Izabel Liviski
SERVIÇO:
Exposição: Au Couer de Mai 68
Data: 01 a 31.06.18
Horário: 9h às 21h
Local: Café Babette – R. Prudente de Moraes, 1101 – Centro – Curitiba/Pr.