Diálogos possíveis entre Ensino de Gênero e História da Ciência

Reconhece-se que a escola não é o único espaço de aprendizagem, a educação pode ocorrer também em situações não formal de ensino, como uma atividade complementar e ampliada aos parâmetros curriculares nacional de ensino (PCNs), como previsto em relatório da Unesco

Diálogos possíveis entre Ensino de Gênero e História da Ciência

Andréia Moreira da Silva – discente do Programa de Pós Graduação em Ensino das Ciências/UFABC

Ana Maria Dietrich – Docente da UFABC

 

Reconhece-se que a escola não é o único espaço de aprendizagem, a educação pode ocorrer também em situações não formal de ensino, como uma atividade complementar e ampliada aos parâmetros curriculares nacional de ensino (PCNs), como previsto em relatório da Unesco:

“A educação não formal, apesar das impressões contrárias, não constitui um sistema distinto e separado de educação, paralelo ao sistema formal de educação. É qualquer atividade educacional organizada, sistemática, desenvolvida fora do âmbito do sistema formal, que visa a oferecer tipos selecionados de aprendizagem a subgrupos específicos da população, tanto adultos como crianças. Assim definida, a educação não formal inclui, por exemplo, extensão rural e programas de treinamento de agricultores, programas de alfabetização de adultos, ensino profissionalizante oferecido fora do sistema formal, clubes de jovens com finalidade substancialmente educacional, e vários programas comunitários de capacitação em saúde, nutrição, planejamento familiar, cooperativas etc.” (UNESCO, 2010).

Dentro desse escopo nosso viés de ensino é a capacitação em saúde, com oficinas direcionadas para alunos do 9° do ensino fundamental, tendo como temática prevenção dos ricos que envolvem o adolescente e as questões de gênero. Essas oficinas têm o anseio de que o adolescente seja provocado a pensar sobre a própria identidade de gênero, aproximando as informações científicas de seu meio cultural e de seu cotidiano.

Essa atividade contempla o que está previsto nos PCNs sobre o tema orientação sexual;

“O tema Orientação Sexual deve se organizar para que os alunos, ao fim do ensino Fundamental, sejam capazes de: respeitar a diversidade de valores, crenças e comportamentos existentes e relativos à sexualidade, desde que seja garantida a dignidade do ser humano; compreender a busca de prazer como uma dimensão saudável da sexualidade humana; conhecer seu corpo, valorizar e cuidar de sua saúde como condição necessária para usufruir de prazer sexual; reconhecer como determinações culturais as características socialmente atribuídas ao masculino e ao feminino, posicionando-se contra discriminações a eles associadas; identificar e expressar seus sentimentos e desejos, respeitando os sentimentos e desejos do outro; proteger-se de relacionamentos sexuais coercitivos ou exploradores; reconhecer o consentimento mútuo como necessário para usufruir de prazer numa relação a dois; desenvolver consciência crítica e tomar decisões responsáveis a respeito de sua sexualidade.” (PCNs, 1997, vol.10).

Diálogos possíveis entre Ensino de Gênero e História da Ciência Esse trabalho vem sendo desenvolvido desde 2014 pela secretaria de saúde da prefeitura de Santo André, em escolas nos períodos fora da aula regulamentar nos pátios e áreas livres dessas escolas. Sempre a pedido da coordenação e corpo docente das escolas, por não alcançarem a abordagem do tema de forma satisfatória. Essa trajetória gerou muitos questionamentos quanto à sua prática e eficácia, resultando em um projeto de pesquisa, causando o seguinte questionamento que norteou a pesquisa: O quanto a educação não formal contribui para o ensino de gênero?

A partir desse cenário pretende-se analisar os diálogos possíveis entre da História da Ciência e o Ensino de Gênero através da Educação não Formal.

Para entender essa interlocução entre ensino-gênero-história da ciência é necessário que se apreenda os objetivos da pesquisa: estudo de caso das oficinas de gênero da prefeitura de Santo André, visando avaliar a eficiência e as estratégias de ensino-aprendizagem de gênero na educação não formal, levando-se em conta a temática específica de gênero e o público restrito composto por adolescentes do 9° do ensino fundamental.

E como escolha da metodologia foi a Nova concepção de tempo (longa duração), para se entender as questões de gênero faz-se necessário considerar a pluralidade do tempo, as relações com os papéis sociais ocupados pelos homens e mulheres foram se consolidando dentro de uma temporalidade histórica. As categorias de gênero não foram estabelecidas na configuração em que estão atualmente num curto tempo, elas correspondem ao tempo histórico de longa duração, que relacionam estruturas consideradas não fixas por muitas e muitas gerações e que por esse motivo não podem ser consideradas estáticas e lineares.

Dialogando com a escolha metodológica referencio Bloch: “O presente e o passado se interpenetram. A tal ponto que seus elos, quanto à prática do ofício de historiador, são de sentido duplo. Se, para quem quer compreender mesmo o presente, a ignorância do passado deve ser funesta, a recíproca — embora não nitidamente alertado — não é menos verdadeira.” (Bloch, p.58-1993,199)

Tal escolha se orienta pelo pensamento da escola de Annales, principalmente por considerar a ciência como não cumulativa e romper com referenciais construtivistas, e por não considerar a ciência pronta, com apelo de saber inabalável e inquestionável. Pensar no ensino das questões de gênero e romper com a ciência elitista, feita por homens (neste caso do sexo masculino e não no sentido antropológico) brancos detentores de um saber científico que prioriza a sua classe social, se faz possível com essa concepção de ciência.

Este projeto sustenta-se no estudo de caso e na pesquisa teórica, que se auxilia dos benefícios dessa interface entre o ensino e a História da Ciência para a compreensão dos saberes, considerando autores que defendem a História da Ciência como prática emancipatória da ciência: Diálogos possíveis entre Ensino de Gênero e História da Ciência

“A História da Ciência possibilita a construção e uma compreensão dinâmica da nossa vivência, da convivência harmônica com o mundo da informação, do entendimento histórico da vida científica, social, produtiva da civilização, ou seja, é um aprendizado com aspectos práticos e críticos de uma participação no romance da cultura científica, ingrediente primordial da saga da humanidade. É fundamental para ressaltar o papel da Ciência como parte da cultura humana acumulada ao longo dos séculos, cultura essa que deve sempre preocupar a educação científica emancipadora”. (Trindade, p.6, 2008).

Embora tenhamos diretrizes nos PCNs que correspondam a esse fazer científico citado pelo autor, o modelo atual do ensino corresponde em muito aos moldes construtivistas.

A ciência não se aproxima do cotidiano do aluno não viabiliza a construção científica dos saberes, por eles e para eles, a sexualidade é vista por um viés biologizante não levando em consideração as questões sociais, como as identidades de gênero. Para o ensino de gênero ou orientação sexual como prevista nos PCNs, aos professores ainda cabe modelos engessados de ensino e quanto à formação não existem subsídios metodológicos para que correspondam as orientações PCNs.

“O destaque dado a História da Ciência nas recentes pedagogias da educação científica está no sentido de buscar conexões úteis para mudanças conceituais que o ensino visa promover”. (Trindade, p.4, 2008)

Uma educação científica útil deve levar em consideração a promoção de mudanças, como o empoderamento feminino, o respeito as diversidades sexuais, a não violência contra a mulher (nas mais diversas formas) os novos conceitos de ciência feminista entre tantas outras possibilidades. Pensando em todos esses entraves a educação não formal pode ser uma possibilidade de ensino que contemple a construção e compreensão da cultura humana, com o foco na temática gênero?

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MOREL, Regina de M. Lucia. Ciência e Estado: a Política Científica no Brasil.
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Sites consultados

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TRINDADE, Diamantino Fernandes (2007):O olhar de hórus: uma perspectiva
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É editora-chefe da Contemporâneos - Revista de Artes e Humanidades e coordenadora do ContemporARTES. Coordena o grupo de pesquisa do CNPQ Educação em Direitos Humanos/ certificado pela UFABC em parceria com a UFV, UFJF, UFF, UFPA, USS e UFBA. É professora adjunta da UFABC. Pós-doutora em Sociologia pela UNICAMP, doutora em História pela USP com doutorado sanduíche pelo Centro de Estudos de Anti-Semitismo (Universidade Técnica de Berlim). Integrante Permanente da Pós Graduação de Ensino, História e Filosofia da Ciências e da Matemática (UFABC) Autora de Nazismo Tropical (Todas as Musas, 2012), Caça às Suásticas - O partido Nazista em São Paulo (Imprensa Oficial / Humanitas 2007) e outros.

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