Livia Lemos é licenciada em História pela Universidade Federal Fluminense pelo Instituto de Ciências da Sociedade e Desenvolvimento Regional. É mediadora escolar e professora da educação básica na rede pública e privada. Desenvolveu pesquisas nas áreas de Ensino de história, História de gênero e História das mulheres. Atualmente cursa pós- graduação em Docência no século XXI, no Instituto Federal Fluminense, desenvolvendo projetos sobre a utilização da tecnologia como recurso didático na sala de aula.
EDUCAÇÃO E ATUAÇÃO FEMININA NO INTEGRALISMO
Resumo
O presente trabalho busca refletir sobre a imagem idealizada da mulher membro da Ação Integralista Brasileira. Para isto, foi feita pesquisa bibliográfica sobre o tema, utilizando trabalhos de historiadores, além de documentos produzidos pelo Movimento Integralista. Considerando, principalmente, o momento histórico analisado, a década de 1930, percebemos o quanto pertencer ao movimento integralista representava para as lutas sociais e, em especial, para as lutas das mulheres por igualdade na sociedade, num movimento conservador. A mulher no movimento integralista tinha seu papel social definido: ser reprodutora e educadora. Este breve artigo pretende fazer alguns apontamentos acerca do tema.
1. Os anos 1930 no Brasil
Antes de refletirmos a participação feminina na AIB é necessário a contextualização deste movimento no Brasil. O integralismo surgiu no Brasil como um movimento conservador e que defendia a família tradicional brasileira, como a composta de marido, esposa e filhos, na qual o homem assume o papel de Chefe e mantenedor econômico do lar e a mulher representa a mãe educadora dos filhos, submissa e obediente ao esposo. Ao casal está incumbida a formação moral dos filhos, quanto à religião cristã e ao civismo, que a família dividiria com a formação escolar. A família era compreendida como base da nação, conforme o lema: “Deus, Pátria e Família”. O Integralismo se configura como um movimento de defesa dos preceitos cristãos e nacionalistas, no sentido fortalecer o sentimento nacional e exaltar os heróis nacionais.
Em 1930, o Brasil encontrava-se numa atmosfera de confrontação política. A década se iniciara marcada pelo levante civil-militar de 1930, a chamada “Revolução de 30”, que derrubou a Primeira República, ou República Velha, deslocando a oligarquia cafeeira paulista do centro do poder de Estado e pondo fim à política do “café com leite”. A articulação político-eleitoral entre as oligarquias paulista e mineira que vinha concentrando nas mãos dessas duas frações da classe dominante – a oligarquia agrária – o controle do Estado nacional e, por meio dele, o controle do comércio exterior brasileiro. A luta entre partidários do comunismo e do fascismo manifestou-se, se não exclusivamente, de forma mais explícita, nos embates entre o Partido Comunista do Brasil e a Ação Integralista Brasileira.
Márcia Carneiro (2011) aponta mudanças ocorridas na década de 30 no Brasil. :
“As mudanças que se sucederam a partir de 1930 não foram suficientes para aplacar as questões internas que afetavam mais especificamente a classe média que surgia com uma ainda incipiente industrialização. Entre os interesses em disputa, radicais antagonismos que afloraram diante das expectativas frustradas [de um projeto de ordem republicana]. Entre comunistas, republicanos, setores conservadores, em comum, a tendência autoritária. “(CARNEIRO, 2011, 3).
Nesse cenário político, em 1931, as mulheres já reivindicavam o direito ao voto no Segundo Congresso Feminino. Em 1932, o presidente Getúlio Vargas através do Código Eleitoral, estabelece o voto secreto e o direto de voto às mulheres. (FERREIRA, 2016). É neste cenário em que a mulher ganha voz nas atividades políticas que, contraditoriamente, são reforçados também os estereótipos de gênero, um reforço de diferenças biológicas e vocacionais entre os sexos. Assim Fagundes (2012), salienta sobre os integralistas:
“Adotando o modelo das organizações fascistas, sobretudo da Itália, os integralistas seguiam uma série de rituais e normas. Como exemplo, os militantes do partido deveriam estar sempre vestidos de camisas verdes com gravatas pretas: daí serem chamados de “camisas-verdes”. (FAGUNDES, 2012, 20).
É importante ressaltar o contexto em que se insere a atuação das mulheres integralistas. Com dito, na década de 30, o Brasil passava por fortes transformações. Dentre elas, a luta dos movimentos de esquerda e do movimento feminista que reivindicava uma série de direitos, o principal deles, o direito ao sufrágio feminino.
1.2 Educação das mulheres integralistas
Também necessário salientar, a existência de uma distinção de gênero dentro do movimento integralista. Segundo Helisangela Ferreira(2016) havia um departamento feminino dentro da própria ação integralista, neste espaço, as mulheres poderiam se posicionar e ter voz. Entretanto, é preciso pontuar em como se dava a representação da mulher dentro da AIB. Assim Ferreira(2016) elucida:
“(…) essa fala era permeada em torno do discurso integralista que pautava para a mulher o lugar de mãe, esposa e dona de casa. Elas desenvolviam trabalhos de educação de crianças e analfabetos, orientação familiar e sexual a outras mulheres e desfilavam nas passeatas do movimento.” (FERREIRA, 2016,33).
A autora salienta ainda que, além dessas funções, a mulher-integralista era responsável por trabalhos voluntários, como assistencialismo às pessoas pobres e estimulavam às demais mulheres a dedicar-se ao lar e à sua família.
Em época de natal, por exemplo, o partido promovia o chamado “Natal dos pobres” um evento que fazia parte do calendário planejado dos integralistas. Nessa atividade social, eram as “senhoras e senhoritas” integralistas que distribuíam brindes à população pobre.
Plínio Salgado, principal líder do Integralismo, assim afirmava sobre como deveria ser a participação das mulheres no partido:
“A sua ação social deve ser eminentemente educadora, tomando contacto com as massas populares, auscultando os anseios dos desafortunados e dos injustiçados, de modo a não permitir que as forças do mal se aproveitem das aflições dos infelizes como uma alavanca do materialismo que pretende destruir tudo o que seja dignidade humana. Influir maternalmente na solução das graves questões de assistência, como médica, enfermeira, educadora, sanitária, ser amparo e justiça em prol dos trabalhadores não somente recompondo equilíbrios econômicos, porém sobretudo recompondo equilíbrios morais; dedicar uma parte de seu tempo ao apostolado cristão e ao levantamento das energias da Pátria pelo culto das virtudes antigas e das preclaras tradições da honra nacional” (SALGADO, 1949, 112-113).
Os estereótipos de gêneros e os papeis socialmente definidos dentro do partido, eram também, reflexo da sociedade, que ditava como as mulheres deveriam se portar, se vestir, e qual era a sua função social. Segundo Cavalari (1999), as diferenças sociais entre
os homens e as mulheres (camisas verdes e blusas verdes) era definido pela própria ação integralista. Às mulheres cabia educar e cuidar dos filhos. Assim, educar as crianças e os jovens, bem como participar de programas de assistência, eram dentro da ação integralista, função da mulher.
Considerações finais
Um tema como o integralismo suscita diversos debates e pontos de vista: uns o entendem o movimento integralista como um movimento racista, outros já não o enxergam desta forma, por exemplo. A educação das mulheres do partido também não poderia dar-se sem que fosse contraditória. Nas primeiras décadas do século XX, em especial nos anos 1930 as mulheres lutavam por diretos políticos e direito ao voto. Gradativamente, poucas se inserem em profissões que até então eram ocupadas por homens, um exemplo disso, são mulheres que conseguem escrever para jornais, alcançando grande público. Essas mulheres acompanham a onda feminista da época e ganham espaço no Brasil. Como, então, as mulheres integralistas, fincadas em estereótipos de gênero (como educar, zelar, atuar em instituições caridosas) encontram seu lugar na ação integralista? A inserção das mulheres na AIB parece um movimento contrário a emancipação feminina da época. No entanto, é preciso compreender que o integralismo com a bandeira da moral cristã e os papeis socialmente designado às mulheres eram reflexo também daquela sociedade. Uma sociedade marcada pela divisão de tarefas, em que à mulher cabia o papel de mãe, submissa. Ideia muito reforçada pela mídia na época, reflitamos a este respeito tendo em vista as próprias revistas femininas que circulavam no país. Estas revistas ensinavam como a mulher deveria portar-se, vestir-se, o que fazer para agradar seu marido. As aparentes contradições desta época revelam as condições possíveis e justificáveis para que as mulheres integrassem o partido, revelam-nos, também, que o conservadorismo e a moral cristã são o reflexo da sociedade dentro do próprio partido.
BIBLIOGRAFIA
FAGUNDES. Pedro Ernesto. Caderno Espaço Feminino – Uberlândia-MG – v. 25, n. 1 – Jan./Jun. 2012 – ISSN online 1981-3082.
CAVALARI, Rosa Maria Feiteiro. Integralismo: ideologia e organização de um partido de massa no Brasil. Bauru, SP: EDUSC, 1999.
SALGADO, Plínio.A mulher no século XX. São Paulo: Guanamby, 1949. p. 112-113.
FERREIRA, H.M. A. As Plinianas de Pernambuco: O cotidiano das mulheres na AIB (1932-1938), dissertação, Recife, 2016.
CARNEIRO, M. R. S. R.; SILVA, S. F. Integralismo, nacionalismos e conservadorismo no Rio de Janeiro. Disponível em: http://www.uff.br/ivspesr/images/Artigos/ST08/ST08.2%20Marcia%20Regina%20da %20Silva%20Ramos%20Carn